Robotização põe em risco 1,1 milhões de empregos em Portugal na próxima década
Estudo da CIP alerta que indústria transformadora e comércio são os sectores com maior potencial de automação e, por isso, mais vulneráveis à perda de emprego. Reconversão da força de trabalho é essencial para evitar bolsa de desempregados.
Nos próximos dez anos, a economia portuguesa corre o risco de perder 1,1 milhões de postos de trabalho em consequência do processo robotização e de digitalização de alguns sectores, em particular a indústria transformadora e o comércio. Esta é uma das conclusões do estudo sobre “Automação e o Futuro do Trabalho em Portugal”, que é apresentado nesta quinta-feira em Lisboa, e que alerta para a necessidade de o país apostar na reconversão dos trabalhadores, evitando que se crie uma bolsa de desempregados que dificilmente encontrarão lugar num mercado laboral cada vez mais digital.
O estudo, encomendado pela Confederação Empresarial de Portugal (CIP) ao McKinsey Global Institute e à Nova School of Business and Economics, traça um cenário preocupante nos sectores mais marcados por tarefas repetitivas e com um elevado potencial de automação, mas também dá conta de oportunidades em áreas como a saúde ou a construção.
No resumo disponibilizado à imprensa, os autores do estudo notam que cerca de 50% do tempo usado actualmente para as actividades laborais poderia ser automatizado com recurso às tecnologias existentes, uma percentagem elevada quando comparada com a de outros países. E, em 2030, esse potencial chegará aos 67%.
Num cenário conservador (em que se assume que um quarto do potencial total pode ser automatizado), esse processo de robotização conduzirá “à perda equivalente a 1,1 milhões de postos de trabalho até 2030, com maior incidência nos sectores da indústria transformadora e do comércio”.
Esta evolução traz também oportunidades e o estudo estima que as novas tecnologias e o crescimento económico poderão gerar entre 600 mil e 1,1 milhões de postos de trabalho até 2030. A questão é que esses novos empregos vão surgir em áreas completamente diferentes, em particular na saúde, na assistência social, na ciência, nas profissões técnicas e na construção.
Num cenário optimista, os empregos perdidos seriam substituídos por outros e idealmente os trabalhadores deveriam acompanhar essa evolução, mas o processo depende de factores como o crescimento económico, a capacidade de investimento das empresas e, sobretudo, da reconversão da força de trabalho.
1,8 milhões de pessoas a precisar de formação
Nas contas feitas no estudo, na próxima década, 1,8 milhões de trabalhadores terão de melhorar as suas competências ou mudar de emprego. Perante estes dados, António Saraiva, presidente da CIP, não tem dúvidas de que a reconversão dos trabalhadores é o maior desafio que se coloca a Portugal e que tem de envolver empresários, sindicatos e governo. “É evidente que a perda [de postos de trabalho] pode ser compensada pela criação de outros, se houver uma efectiva reconversão em que todos participemos. Este é um desígnio nacional, temos de fazer uma efectiva formação de adultos e é aí que reside o clique para aproveitar estas oportunidades”, defendeu, em declarações ao PÚBLICO.
O líder da CIP alerta ainda que o potencial de automação identificado no estudo depende da capacidade de as empresas o aproveitarem. “Uma coisa é termos um potencial de automação desta ordem de grandeza, outra coisa é as empresas terem capacidade de investimento para o concretizarem - sendo que, se não o fizerem, correm sérios riscos de perder competitividade e, consequentemente, perder encomendas”, nota.
É preciso encontrar um ponto de equilíbrio, defende António Saraiva, entre “mandar pessoas para o desemprego por via dos encerramentos porque [as empresas] não investiram a prazo em novas soluções tecnológicas” ou “gastar algum dinheiro antecipando o problema e investindo na qualificação dos recursos humanos”. Para a CIP, os esforços devem concentrar-se num “eficaz plano de requalificação” que envolva o sector público, as empresas e as instituições de educação e formação.
A transição para uma economia digital obrigará também a olhar para novas formas de financiar a Segurança Social e o líder da CIP não vê com maus olhos que se discuta uma taxa sobre os robots. “Há que manter o espírito aberto para pensar novas soluções, de modo a que o modelo social não venha a soçobrar”.
Em declarações ao PÚBLICO/Renascença, Pedro Duarte, coordenador do conselho estratégico para o sector da economia digital da CIP, considera que é preciso olhar para o processo de digitalização como “uma oportunidade”: “Se nos anteciparmos aos outros países, se formos mais rápidos e eficazes, podemos gerar mais empregos do que aqueles que vamos destruir. Podemos dar melhores salários aos empregos que temos no nosso país”. Com Helena Pereira