Bebés prematuros ficam internados dois meses. Pais pedem licença alargada

Investigação do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, com inquéritos a 120 mães e 91 país avaliou a qualidade de vida dos progenitores. Trabalho aponta para a necessidade de apoio psicológico e social.

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Nelson Garrido

São bebés de muito pré-termo porque nascem antes das 32 semanas de gestação. Mais frágeis, ficam em média internados quase dois meses nas unidades de cuidados intensivos neonatais. Os pais pedem uma licença alargada, paga a 100%, que possam gozar durante o internamento e que não tire dias à licença normal de parentalidade.

“Em Portugal nascem cerca de 8% de bebés prematuros (menos de 37 semanas) e 1% destes são muito prematuros (menos de 32 semanas). São bebés que têm de estar muito tempo internados e o impacto familiar é muito elevado. Quisemos avaliar as necessidades, a qualidade de vida e as fontes de stress dos pais”, explica ao PÚBLICO Mariana Amorim, investigadora da Unidade de Investigação em Epidemiologia (EPIUnit) do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP).

É a autora da tese de doutoramento, concluída no início de Dezembro, que avaliou a qualidade de vida de mães e pais de crianças muito pré-termo e que já resultou em quatro artigos publicados em revistas internacionais. Para este trabalho, que vem no seguimento de um projecto anterior, foram avaliados 120 mães e 91 pais de crianças hospitalizadas nas sete unidades de cuidados intensivos neonatais do Norte do país. Os inquéritos e as entrevistas, que decorreram entre 2013 e 2014, aconteceram quando estes bebés estavam internados — “a nossa média de internamento foram 52 dias”— e ao final de quatro meses após o nascimento.

“Percebemos três coisas essências. A experiência global da hospitalização é muito stressante para os pais. Dizem-nos que sentem stress porque não conseguem exercer o seu papel como pais porque têm toda a maquinaria e incubadoras”, começa por explicar Mariana Amorim, destacando uma das necessidades que emergiu como sendo das mais importantes: “O suporte instrumental do Governo, nomeadamente através da extensão da licença de parentalidade.”

“Estes pais têm de usufruir da licença de parentalidade logo que o bebé nasce e quando a criança vai para casa, já só têm um mês ou meio mês de licença. Grande parte é gasta dentro da unidade de cuidados neonatais”, diz. “Os nossos pais relataram-nos que gostariam de ter, enquanto os filhos estão internados, uma licença paga a 100% que não contasse para a licença normal. E depois quando fossem para casa começaria a contar o tempo normal”, explica.

A lei prevê 120 dias ou 150 dias (se a licença for partilhada com o pai) pagos a 100%. A extensão a 150 dias ou a 180, respectivamente, é paga a 80%. A licença de assistência aos filhos também é paga a 80%, refere a investigadora, o que implica um constrangimento financeiro grande.

Mais conforto

Outra das necessidades reportadas durante o tempo de internamento está relacionada com “o suporte emocional regular de psicólogos e técnicos do serviço social dentro dos hospitais”. “Outro aspecto importante é a melhoria da privacidade dentro da neonatologia e a necessidade de haver algum conforto para os pais dentro da unidade e nas imediações.“

Se os cuidados prestados aos bebés não estão em causa, as condições que os pais têm no internamento diferem entre as unidades. “Há umas que têm uma casa onde a mãe pode dormir, outras onde existe um quarto e há locais onde não existe esta possibilidade. Como conseguimos ter dois pais ao pé do bebé quando só há um cadeirão?”, questiona a investigadora.

Quanto à qualidade de vida dos pais quatro meses depois do nascimento, é semelhante à da população geral, embora com níveis de stress um pouco superiores. “Percebemos que estes pais desenvolveram mecanismos de acomodação, estratégias que balanceiam as visões mais negativas e as mais positivas”, explica. “Tornam-se mais optimistas perante a vida, reorganizam os seus objectivos, comparam-se sempre com bebés que estejam em piores situações e fazem uma reformulação das expectativas.”

Recomendações

Deste trabalho resultaram várias recomendações a aplicar a três níveis: macro (sociedade), intermédio (nas unidades) e micro (nos pais). “A nível macro, achamos que uma das implicações práticas é a extensão da licença de parentalidade para ambos os pais durante o período de internamento; terem acesso a assistência financeira como, por exemplo, parque pago e um espaço onde pudessem pernoitar e o acesso ao banco público de leite humano”.

A nível intermédio, destaca-se o suporte social através de psicólogos, assistentes sociais e de pais de outros bebés internados. “Outra questão é providenciar estratégias sensíveis ao género — pais e mães têm necessidades e stresses diferentes — e também desenvolver programas de seguimento destes pais a longo prazo.”

Para o último nível tem cinco recomendação. “Reforço da privacidade, ter uma assistente da Segurança Social disponível para ajudar na burocracia, desenvolver estratégias focadas na melhoria da qualidade de vida envolvendo não-profissionais (por exemplo, associações de pais), incorporar os mecanismos de acomodação no aconselhamento psicossocial dos pais e o uso de instrumentos mais curtos para avaliar as necessidades parentais”, enumera Mariana Amorim.

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