Orçamento de Estado abre caminho para Empresa Municipal de Cultura do Porto
Lei publicada esta quarta-feira altera regime das empresas detidas por municípios, que, se dedicadas à área da cultura, deixam de ter de ser auto-sustentáveis.
A Câmara do Porto vai poder avançar, em 2019, com a criação de uma Empresa Municipal de Cultura. Aprovada já em 2017, no final do mandato anterior, pela Assembleia Municipal, esta entidade acabou por nunca ver a luz do dia por oposição do Tribunal de Contas, que a chumbou tendo em conta, entre outros argumentos entretanto ultrapassados, que ela não seria auto-sustentável do ponto de vista económico-financeiro, como exigia a lei 50/2012. Pois bem, numa alteração a essa lei, o Governo mantém essa exigência de equilíbrio nas contas, mas cria uma excepção quando o objecto destas empresas seja “a gestão de equipamentos e prestação de serviços na área da cultura”.
O presidente da Câmara do Porto apostou na criação desta empresa como uma forma de alargar a actuação do município nesta área, colocando sob gestão municipal o Teatro Municipal de Sá da Bandeira, que a Câmara está a comprar, e o Cinema Batalha, este por via do seu arrendamento e posterior reabilitação. A empresa tem sido também apontada como solução legal para permitir uma candidatura da reabilitação do Coliseu do Porto a fundos comunitários, e tendo em conta estes e outros propósitos, o autarca arriscou levar a proposta a uma assembleia municipal, em Setembro de 2017, na qual não tinha a maioria, conseguindo fazê-la passar graças ao voto favorável do socialista Francisco Assis, que contrariou a abstenção da bancada socialista.
Esse esforço da maioria independente, que voltou a ganhar as eleições, de novo sem maioria na assembleia, foi no entanto inglório. Durante o ano passado, o projecto foi travado pelo Tribunal de Contas, que identificou na proposta várias falhas passíveis de a tornar nula. A Câmara do Porto recorreu da primeira decisão mas, a meio do ano, a resposta não foi diferente, ao manter o impedimento, embora os pressupostos em que assentava fossem já diferentes. Nessa altura percebia-se que a questão da auto-sustentabilidade de uma empresa municipal era o principal entrave, e que o TC insistia numa interpretação restrita da Lei 50/2012, que, em pleno período da troika, levou ao encerramento de metade das entidades existentes aquando do pedido de resgate por parte do Estado Português, em 2011.
A Lei do Orçamento de Estado para 2019, que entrou em vigor esta quarta-feira, introduz várias alterações à Lei 50/2012, que estabelece o Regime Jurídico da Actividade Empresarial Local e das Participações Locais, a mais importante das quais, para os propósitos da Câmara do Porto, mexe com o artigo 20, que passa a ter a seguinte redacção: “As empresas locais têm como objecto exclusivo a exploração de actividades de interesse geral ou a promoção do desenvolvimento local e regional, (...) de forma tendencialmente auto-sustentável, sem prejuízo da constituição de empresas locais que exercem, a título principal, as actividades de gestão de equipamentos e prestação de serviços na área da cultura.
Outra alteração, esta ao artigo 63, importa também para este caso, já que deixa de aplicar “às empresas locais que exercem, a título principal, as actividades de gestão de equipamentos e prestação de serviços na área da cultura, da educação, da acção social, do desporto e da ciência, inovação e tecnologia”, a norma prevista no n.1 do mesmo artigo, que levou à vaga de encerramentos dos últimos anos, e que prevê as condições em que se dá a cessação de actividade.
“As empresas locais devem ser dissolvidas, no prazo de seis meses, sempre que: a) “as vendas e prestações de serviços realizados durante os últimos três anos não cobrem, pelo menos, 50% dos gastos totais dos respectivos exercícios; b) Quando se verificar que, nos últimos três anos, o peso contributivo dos subsídios à exploração atribuídos pela entidade pública participante é superior a 50% das suas receitas; c) Quando se verificar que, nos últimos três anos, o valor do resultado operacional subtraído ao mesmo o valor correspondente às amortizações e às depreciações é negativo; d) Quando se verificar que, nos últimos três anos, o resultado líquido é negativo”, lê-se na primeira cláusula deste artigo, que deixou de se aplicar a este caso concreto.
Contactado pelo PÚBLICO, o município assume, perante a publicação do OE2019, a intenção de voltar a pegar no dossier da empresa municipal de Cultura, até pelas várias decisões que estavam pendentes da criação da mesma. Uma delas é a do Coliseu do Porto. O edifício projectado por Cassiano Branco precisa de obras de reabilitação, já orçamentadas em seis milhões de euros, mas a associação que o gere, e que inclui, além da câmara, o Ministério da Cultura e a Área Metropolitana, na direcção, não pode candidatar-se ao mecanismo de financiamento para obras de reabilitação urbana, tendo aprovado, já no ano passado, entregar, por trespasse o imóvel à autarquia, para que esta avance com a candidatura. A questão é que o município teria sempre de assegurar os postos de trabalho do Coliseu, durante o seu encerramento para obras, algo que só poderá acontecer no âmbito de uma empresa municipal, tem sido explicado. Com Mariana Correia Pinto