Ano novo, partidos novos?
Num ano em que os portugueses vão às urnas, já há grupos de pessoas a meter mãos à obra para trazer ideias novas à política portuguesa: alguns ainda estão a fazer caminho, outros já são partidos. Quais as ideias que defendem e as metas que pretendem traçar? Aqui ficam alguns dos projectos que estão a nascer.
Em 2019 há eleições europeias, para a Assembleia Regional da Madeira, e legislativas. Com o calendário fixado, falta perceber que caminho irão trilhar os novos projectos. Para já, só duas novidades fazem parte da lista de partidos que receberam luz verde do Tribunal Constitucional: a Aliança e a Iniciativa Liberal.
Aliança: O partido de Santana que é de todos
Depois de ter perdido a disputa pela liderança do PSD, em Janeiro de 2018, Pedro Santana Lopes saiu em Agosto do partido em que militava há 40 anos e criou um novo projecto político, a Aliança. Algumas propostas? Menos Estado, menos carga fiscal e ver o "país a crescer a 3% e acima da média europeia".
Santana Lopes, em declarações ao PÚBLICO, faz um ponto da situação: “Temos congresso em Fevereiro, a 9 e 10, e estamos a trabalhar para aprofundar e fundamentar as nossas posições, para adequá-las ao caminho que queremos e contribuir para resolver problemas da sociedade portuguesa, nomeadamente na saúde, na questão fiscal e na coesão territorial. Estamos a trabalhar aturadamente, todos os dias praticamente.” E acrescenta: “O conselho político estratégico está a acabar o programa. Temos um gabinete de estudos que está a desenvolver políticas sectoriais. Temos muitos quadros que estão a trabalhar, quase todos os dias, no aprofundamento do que vamos propor aos portugueses.”
Apesar de saber o papel que teve na criação do partido, Santana Lopes insiste que o projecto é hoje obra de muitos: “A Aliança teve origem, no seu primeiro segundo, num acto individual, mas depois transformou-se numa obra colectiva. Hoje faço tudo para que seja um partido de muita gente. Não quis ser eu o cabeça-de-lista às europeias [é Paulo Sande] e fiz tudo para que o partido escolhesse outro candidato”, diz, adiantando que no congresso de Fevereiro será apresentada a lista completa às europeias. Sobre o futuro, deixa uma garantia: “Aqui está um partido para durar décadas. Podemos falar em metas de cinco a 10%, mas se não forem conseguidas não porão em causa a existência do partido. Estes processos, se forem sérios, exigem tempo. A Aliança não é um partido populista, não faz propostas para ter votos facilmente. Quer apresentar soluções boas, inovadoras.”
Iniciativa Liberal: Mais liberdade e "espírito colaborativo" na política
Já é um partido e já tem disponível, no site, uma plataforma para recolher contributos para os programas das eleições legislativas, europeias e regionais da Madeira (onde já têm um núcleo). Rodrigo Saraiva, um dos fundadores, conta que este grupo de pessoas quis “sempre” que “tudo aquilo” que fizesse expressasse “uma forma diferente de estar na política” – um maior envolvimento de todos.
Rodrigo Saraiva exemplifica: quando lançaram o Manifesto Portugal Mais Liberal – que acabou por ser a declaração de princípios – fizeram-no com “espírito colaborativo”, com muitos “contributos”. Mais tarde, aprovaram o programa político da mesma “forma colaborativa”, com debates e recorrendo à plataforma digital, que continua aberta a contributos. Depois de o presidente anterior se ter demitido, devido a uma polémica sobre a origem da página do Facebook, o partido escolheu um novo líder, Carlos Guimarães Pinto, e até Março conta divulgar os candidatos às europeias.
Para este partido – que, como se pode ler no site, defende mais liberdade, política, social e económica –, “os portugueses vivem sob o jugo de um Estado paternalista. Um Estado que cresce sem limite, sufoca a nossa liberdade e impõe custos para os quais não corresponde com serviços”. Mais: “O grande Patrão, o grande Capital, o Dono Disto Tudo é este Estado-papá, que entra no nosso quarto com a mesma facilidade com que entra na nossa carteira. Estamos fartos disto tudo.” Defendem “um Estado mais pequeno e mais eficaz, um Estado cada vez mais fora do bolso e do quarto dos portugueses”: “Precisamos de descomplicar Portugal e torná-lo mais transparente, mais simples e mais sustentável.” Apesar desta mensagem, Rodrigo Saraiva clarifica: “Não há nenhum liberal que queira destruir o Estado.” Neste fim-de-semana aparecerão já alguns outdoors em Lisboa, com duas mensagens: uma a apelar a menos carga fiscal e outra com o slogan "Ano novo, partido novo".
Movimento 51: "Respiramos independência!"
No cabeçalho do site do Movimento 51, está a expressão que o então presidente dos Estados Unidos, Abraham Lincoln, proferiu num discurso em 1863: “Do povo, pelo povo, para o povo”. É o lema deste “grupo de cidadãos livres e independentes” que decidiu, como se lê na página do Facebook, pôr em prática “o exercício dos princípios democráticos de uma cidadania activa” e avançar com um projecto.
O "51" no nome é uma alusão ao artigo 51.º da Constituição da República Portuguesa, cujo nº. 1 estabelece: "A liberdade de associação compreende o direito de constituir ou participar em associações ou partidos e de através deles concorrer democraticamente para a formação da vontade popular e a organização do poder político."
A data de nascimento oficial, como movimento, foi 29 de Setembro de 2013, seguiu-se, a 14 de Abril, a constituição como associação, e agora o salto é conseguir formalizar-se como partido: o partido Movimento 51 (M51). A intenção foi assinalada recentemente, a 1 de Dezembro de 2018, dia em que se celebra a restauração da independência, em duas cerimónias que decorreram no Porto e em Ponte de Lima, vila de onde é o grupo fundador. Uma das coordenadoras, Filipa Teixeira, explica ao PÚBLICO que o projecto não é “nem de esquerda, nem de direita, nem do centro”; que valoriza a “independência” e a participação e proximidade em relação à sociedade civil; e que pretende entregar, no TC, as assinaturas necessárias à constituição como partido neste mês. Se conseguir ser um partido, o projecto poderá avançar, desta vez, para as eleições europeias, mas a decisão ainda não está fechada. Os dinamizadores prometem fazer “política para os cidadãos e não para os partidos” e garantem: “Respiramos independência!”.
Chega: O partido que tem medo de não conseguir ser partido
Depois de ter saltado para os jornais devido a afirmações que foram interpretadas, por muitos, como racistas, André Ventura anunciou que iria deixar o lugar na autarquia de Loures, a militância no PSD e formar um novo partido. As duas primeiras decisões estão cumpridas, falta o objectivo de criar um partido.
Ao PÚBLICO, André Ventura garante que vai entregar no TC as assinaturas necessárias entre 7 e 15 de Janeiro, assim como a declaração de princípios e projecto de estatutos. Não esconde que está preocupado com a possibilidade de o TC não dar luz verde ao projecto e, por isso, diz estar a haver “algum cuidado” na redacção dos textos. Em causa, estão propostas polémicas: “Há várias das nossas propostas que não estão em consonância com Constituição. Por exemplo, propomos que haja 100 deputados, o que é contrário à actual moldura constitucional, que propõe um mínimo de 180. Também defendemos a prisão perpétua para homicídio qualificado, terrorismo, reincidência em caso de violação, o que também é contra o espírito da Constituição.
Queremos dar a mensagem ao TC de que, apesar de o partido ter ideias contra esta Constituição, é um partido de natureza democrática e que procurará implementar estas medidas através da forma própria que é a revisão constitucional. Não vamos contornar nada, vamos é explicar que ter medidas contrárias à Constituição não significa que seja um partido fascista”, diz André Ventura, acrescentando que não receber luz verde do TC seria “um dos maiores golpes” na democracia portuguesa. Se houver luz verde, pretendem aventurar-se nas eleições europeias.
Volt Portugal: "Dar uma nova energia à Europa"
Volt vem de voltagem, de energia, explica o presidente do Volt Portugal, Tiago Guilherme. “Queremos dar uma nova energia à Europa”, diz, acrescentando que o Volt nasceu como uma plataforma política europeia, contra fenómenos como o "Brexit" e o aparecimento de “populismos”. A partir daí, vários países juntaram-se, sempre com o objectivo de defender a Europa. “Queremos que o que a União Europeia conquistou até agora não seja posto em causa”, explica Tiago Guilherme, ressalvando que não são “de esquerda, nem de direita”, mas são “liberais nos costumes”. Para já, recolheram um terço das 7500 assinaturas necessárias para se formalizarem como partido. Tiago Guilherme não esconde que gostava que tal acontecesse a tempo de concorrerem às europeias: “Até por sermos um movimento europeísta e federalista”, diz.
Se não forem a tempo das europeias, esperam conseguir entrar na corrida das legislativas. Nas redes sociais, explicam ao que vêm: “Para reformar Portugal e a União Europeia criámos o Volt, um movimento progressista, reformista e pró-europeu”. Mais: “Queremos que os europeus acreditem novamente na política. Queremos que a Europa trabalhe unida. Queremos tornar-nos num verdadeiro partido paneuropeu para mudar para sempre a política europeia e nacional.” Para isso, definiram “5+1 desafios fundamentais que cada Estado europeu precisa abordar”, são eles: “Estado eficiente”; “renascimento económico”; “igualdade social”; “equilíbrio global”; “fortalecimento do cidadão”; e “reforma da União Europeia”.
Democracia 21: O sonho de "uma grande aliança de direita"
Sofia Afonso Ferreira, fundadora do Democracia 21 – projecto de direita, liberal na economia e nos costumes –, garante entregar nas necessárias assinaturas no TC até ao fim do mês. “Às legislativas, queremos concorrer de certeza”, diz, assegurando que pretendem “fazer muito barulho”. “Temos uma espécie de slogan que diz que preferimos ter voz a ter votos”, acrescenta.
Em 2019, Sofia Afonso Ferreira vê com bons olhos a criação de uma “geringonça” de direita, “uma grande aliança de direita”. Algumas ideias do Democracia 21? Emagrecimento do Estado, descida da carga fiscal, defesa de uma Europa a duas velocidades, para acautelar os países mais frágeis, e de forma a evitar a saída do euro.
No final de Dezembro, um comunicado enviado às redacções acrescentava ainda como bandeiras “a luta contra a corrupção e a requalificação social e económica do interior do país”. “A requalificação do interior será mesmo uma das grandes bandeiras”, frisa a fundadora deste movimento “constituído por uma equipa de pessoas proveniente de vários quadrantes políticos e áreas profissionais”. No mesmo comunicado, esclarecia-se ainda que, “ao longo deste ano, o movimento apresentou o seu manifesto e programa económico e realizou trinta eventos em várias zonas do país, de norte a sul, e um fora do país com a comunidade portuguesa em Macau, para apresentar o projecto político e recolher assinaturas” – dia 5, promove também um debate sobre a alteração à lei das armas.
Partido(s) Libertário(s): O eterno projecto adiado
Nasceram em 2012 como um só projecto e em 2016 separaram-se. Da cisão nasceu o Partido Libertário e o Partido Libertário Português. Nenhum é ainda um partido. “Para se conseguir levar qualquer projecto para a frente, precisamos de pessoas ou de dinheiro”, diz António Lourenço, um dos impulsionadores do Partido Libertário Português, admitindo que não vão concorrer aos actos eleitorais deste ano.
António Lourenço garante que “não têm qualquer ambição de poder, não querem ser Governo”, e que “o lugar máximo de poder” a que gostariam de chegar seria ao Parlamento, para realizarem as suas propostas ou “para inviabilizarem outras propostas limitadoras das liberdades individuais”. Algumas das ideias que apresentam passam por uma revisão da Constituição da República Portuguesa; pela saída de Portugal da União Europeia; ou pela criação de um rendimento universal, básico e incondicional.
Quanto ao Partido Libertário, defende, no site, “o direito à vida, à liberdade e à propriedade privada”. O presidente desta associação, Carlos Novais, explica que vai haver, no fim do mês, uma reunião, na qual se estabelecerá a data e a estratégia para a recolha de assinaturas. “E vamos decidir se concorremos ou não [às eleições], mas a nossa prioridade é fazer as coisas bem, e não o timing”, diz, sublinhando que a mensagem principal deste projecto é “uma redução de 50% da presença do Estado na economia” e que o movimento libertário “transcende a natureza partidária”.