"Não há dúvida que hoje os EUA estão a enriquecer como país"
Carlos Rodrigues não hesita em descrever de forma positiva o estado da economia norte-americana. E sublinha, a propósito do estilo de Donald Trump: "Respeito a eloquência de muitos políticos, mas respeito mais os que fazem".
Tem dupla cidadania portuguesa e americana. Foi votar?
Nas últimas eleições presidenciais não votei, nem votei nas intercalares [Novembro de 2018], mas penso votar nas próximas eleições.
Como é que olha para o contexto político e económico dos EUA?
A baixa de IRC foi muito bem aproveitada economicamente e inteligentemente interpretada por algumas companhias que aproveitaram para subir o salário mínimo nacional de 9,5 dólares à hora, para 15 dólares, como fez a Amazon. Hoje nos EUA há pleno emprego e há mais pessoas a criarem as suas empresas e a inovarem. Não há receio de falhar. E, portanto, diria que economicamente os EUA estão muito bem, independentemente de todas as declarações políticas de que tudo vai desabar.
Acha que, por cá, existe uma má percepção da realidade?
Uma coisa é o que se diz, outra o que está a acontecer nos EUA ao nível da economia, que beneficia de um período de investimento fortíssimo e de crescimento sustentado. Não há dúvida que hoje os EUA estão a enriquecer como país.
As eleições intercalares norte-americanas fortaleceram os democratas, acha que fica em causa a sustentabilidade do presidente na Casa Branca?
Deixou de haver confluência entre Presidente, Senado e Câmara dos Representantes, o que é bom. O confronto de ideias vai obrigar a uma moderação, o que, acredito, acaba a beneficiar os sectores mais desfavorecidos da sociedade americana.
Trump quer desregular o sector financeiro, desmontar a actual configuração geopolítica mundial, mudar o rumo da globalização. Isto, não o assusta?
Não sei se no caso do sector financeiro, quanto a desregular, Trump é assim tão radical como refere. O que foi feito foi uma aplicação mais intensiva do princípio da proporcionalidade dos requerimentos regulatórios a instituições de menor dimensão. Por um lado a fasquia para os bancos serem considerados de “risco sistémico” subiu de 50 mil milhões de dólares para 250 mil milhões de dólares (Economic Growth, Regulatory Relief and Consumer Protection Act, aprovada a 24 de Maio de 2018). Também as instituições com menos de 10 mil milhões de dólares deixaram de estar sujeitas à regulação designada Volker Rule, relacionada com o trading da carteira própria.
E quanto à luta contra o movimento de globalização?
Bom, penso que nem mesmo o Presidente Trump será capaz de mudar o rumo histórico da globalização das economias mundiais, que tem contribuído para um aumento considerável da riqueza global. E mais importante até foi ter colocado, na última década, acima do nível de subsistência centenas de milhões de cidadãos de todo o planeta. Portanto, e esquecendo tudo o que me faz sorrir ou até recear [do que Trump faz], pragmaticamente tenho que concluir que a economia norte-americana está melhor, não há mísseis a sair da Coreia do Norte, melhorou-se o tratado México-EUA-Canadá, três países que são a maior zona económica do mundo. Distingo entre o estilo e o que ele faz. Respeito a eloquência de muitos políticos, mas respeito mais os que fazem.
O tema migratório tornou-se um factor de conflito e não se antecipa que a pressão diminua, nomeadamente, entre países do sul. Compreende que os grandes blocos, os mais ricos, continuem a olhar para o que se passa, fazendo muito pouco?
Acho incompreensível a não-resposta do ocidente aos movimentos migratórios da Síria e de África. É incontornável que, nas próximas décadas, África sofra um grande desenvolvimento. Mas até lá, espero que as instituições criem uma política comum de resposta a estes fenómenos que resolvam o problema da pobreza na origem.
Como é que se chega a uma visão comum entre países e blocos para gerir os fluxos migratórios, se o que predomina são posições divergentes sobre o tema. A resposta dos EUA é erguer muros. Na UE, por exemplo, forjaram-se alianças entre países ricos, países de leste, países do sul, países mais populistas...
Há uns anos, quando os meus amigos americanos me diziam que a UE não era sustentável, ria-me. Hoje não me rio. E como o mundo não está parado, e se vai desenvolvendo, a UE tem que dar passos em frente. E temos hoje mais meios e melhores condições para o fazer, mas não nos entendemos.
O que exigia o espírito multilateralista de Wilson, agora em recuo.
O mundo dito rico, a UE e os EUA, vive em paz há quase sete décadas, é onde as populações têm a melhor qualidade de vida, acesso a cuidados de saúde, mais prosperidade. E não ficavam mais pobres se afectassem riqueza às regiões mais desfavorecidas. Mas não temos sido capazes de resolver o tema da migração de forma concertada e não existem hoje políticas que possam terminar com a necessidade da migração em massa para garantir a sobrevivência de muitos. Ninguém emigra por gosto, mas por necessidade que é, em muitos casos, extrema.