Poluição do Tejo, furo de Aljezur e derrocada de Borba. O ano revisto pelas associações ambientalistas
As associações Zero e Quercus fazem o balanço do Ambiente de Portugal em 2018. Um ano que começou com uma manta de poluição no Tejo e termina com um ambicioso roteiro para descarbonizar a economia.
Em matéria de ambiente, 2018 foi um ano de propostas ambiciosas, que mostrou também “as muitas fragilidades que ainda persistem na protecção do ambiente e da qualidade de vida das populações”, diz a associação ambientalista Zero. No balanço do ano, a Zero e a Quercus colocam a tónica nas lições a tirar da derrocada em Borba e voltam a aplaudir a desistência do furo de Aljezur. No próximo ano o desafio será concretizar eficazmente as medidas já lançadas para a transição para uma economia circular e uma maior neutralidade carbónica. Sobre o ano que agora termina, estas são as principais datas que marcaram os ambientalistas.
24 de Janeiro: Tejo corre coberto de espuma
Um manto de espuma densa cobriu uma zona do rio Tejo junto ao açude insuflável de Abrantes, no “culminar de mais de dois anos de poluição recorrente ao longo de todo o Alto e Médio Tejo”, recorda a Zero. O Ministério Público está a investigar o envolvimento de papeleiras de Vila Velha de Ródão. O Ministério do Ambiente decidiu rever licenças de descarga de efluentes, empreendeu uma mega-operação de limpeza do fundo do rio e anunciou o regresso de vigilantes da natureza – guarda-rios – ao Tejo.
Março: um mês de energia exclusivamente renovável
Março deste ano foi o único mês em que, em Portugal, se consumiu apenas electricidade produzida através de fontes renováveis. Foi a primeira vez que a produção eléctrica com origem renovável ultrapassou o consumo de Portugal Continental (4812 para 4647 GWh nesse mês). O anterior máximo tinha sido registado em Fevereiro de 2014 com 99,2% do consumo a ter origem renovável, segundo a Associação Portuguesa de Energias Renováveis.
16 de Junho: esgotados recursos para todo o ano
Portugal esgotou a 16 de Junho os recursos naturais renováveis de 2018, um mês e meio antes da média mundial. O que quer dizer que a partir desse dia o país, deficitário a este nível há vários anos, deixou de ter capacidade de repor os recursos que consume.
30 de Julho: dia com melhor qualidade do ar
Segundo os dados provisórios de partículas inaláveis, dióxido de azoto e ozono, citados pela Zero, 30 de Julho foi o dia do ano com melhor qualidade do ar. As condições meteorológicas, diz a associação, facilitaram uma forte dispersão dos poluentes e a maioria das zonas onde esta medição foi feita apresentava um índice “muito bom”.
3 a 10 de Agosto: 27 mil hectares ardidos em Monchique
O maior incêndio do ano, em Monchique, queimou uma área de cerca de 27 mil hectares, colocando em evidência “o desordenamento do território e a fragilidade do mundo rural”, observa a Zero. Na sequência do fogo, registou-se na manhã de dia 7 de Agosto, na estação de Portimão, o valor limite horário mais elevado de concentração de partículas em Portugal Continental, um indicador de má qualidade do ar.
4 de Agosto: dia mais quente em 18 anos
Desde a viragem de século, nenhum dia tinha sido tão quente como 4 de Agosto de 2018, em plena onda de calor: a temperatura média chegou aos 32,4ºC (com 41,6ºC de máxima e 23,2ºC de mínima), aponta a Zero. Dia 4 foi também aquele em que se registou o maior número de ultrapassagens (14) ao limiar de alerta ozono em 18 anos. No dia seguinte, um número recorde de estações de monitorização da qualidade do ar (38 em 45) excedeu o valor limite diário de partículas. Este mês de Agosto foi o segundo mais quente dos últimos 15 anos.
Outubro: abate de montado de azinho no Alentejo
O abate de centenas de azinheiras de grande porte no Alto Alentejo, sem autorização do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, foi, para a Quercus, um “crime ambiental de extrema gravidade”, dada a destruição de um “ecossistema único”, o montado de azinho.
18 de Outubro: fim dos plásticos no sector público
Num ano marcado por várias medidas para redução dos plásticos, o Governo aprovou a proibição do uso de garrafas, sacos e louça de plástico na administração pública. Dias depois o Parlamento deu luz verde ao sistema de tara retornável nas embalagens.
29 de Outubro: petrolíferas desistem de furo em Aljezur
O dia 13 de Agosto já tinha sido uma vitória para os ambientalistas: o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé aceitara a providência cautelar interposta pela Plataforma Algarve Livre de Petróleo para travar o furo de prospecção de petróleo na bacia do Alentejo, ao largo de Aljezur. O Governo recorreu, mas o consórcio Galp/ Eni anunciou em Outubro a desistência do projecto. A Quercus também assinala como positiva a suspensão das licenças concedidas em 2015 para exploração de gás na região Centro até que o seu impacto ambiental seja avaliado.
19 de Novembro: estrada de Borba
A derrocada de uma estrada para o interior de uma pedreira em Borba, Évora, matou cinco pessoas. Para a Quercus, a queda do talude da pedreira é, não só “um exemplo da falta de uma política de prevenção”, como uma consequência da “exploração exaustiva dos recursos naturais”. Revelou, diz a Zero, “um imenso passivo ambiental” deixado pelas pedreiras, “com buracos abertos no solo e muitas explorações abandonadas”. No Alentejo, de acordo com dados de 2016 da Direcção-Geral de Energia e Geologia, das 347 pedreiras licenciadas, 251 estavam parcial ou totalmente desactivadas. Destas, 143 estavam em situação de abandono e só 47 tinham autorização de suspensão.
Neste mesmo dia Portugal reconheceu que está aquém das metas europeias dos resíduos urbanos para 2020 e pediu à União Europeia mais dois anos para as cumprir. Isto “traduz-se numa sobrecarga de perto de 10 milhões de euros/ano adicionais” e “num acréscimo de emissões de CO2”, nota a Quercus. Para a Zero, este resultado era “há muito evidente” dado o “imobilismo” da tutela e a sua “inqualificável defesa de mais incineração”.
4 de Dezembro: manual para descarbonizar a economia
Com “metas mais ambiciosas” do que as da Comissão Europeia, assinala a Zero, o Governo apresentou o Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050, que deve orientar as políticas com vista a atingir, entre outras metas, 100% de electricidade de fontes renováveis e a total descarbonização dos transportes.