Metade dos utilizadores da Net compra online, mas entregas de Natal voltam a chegar tarde
Ainda abaixo da média europeia, as compras online em Portugal deram um salto. A facturação ultrapassou os 5000 milhões. Falhas nas entregas continuam no Natal.
O número de portugueses que fazem compras online voltou a dar um salto significativo em 2018. Passou para 3,9 milhões de compradores, um crescimento de 12% face a 2017, registando por isso um marco relevante: metade da população portuguesa que usa a Internet (7,9 milhões de pessoas, segundo o INE) faz agora compras pela Internet, sendo que a maioria (79%) usa a Internet no telemóvel.
Também o volume de compras feito através da Internet registou um avanço significativo nos últimos 12 meses. Cresceu 10% face a 2017, atingindo 5100 milhões de euros – isto só no segmento B2C, ou seja, clientes privados, sem contar portanto com as compras entre empresas.
Os números são da consultora IDC, responsável pelos relatórios anuais sobre a Economia Digital em Portugal, feitos para a Associação Economia Digital (Acepi). Ainda que Portugal continue abaixo da média europeia, tanto em matéria de número de internautas como compradores, os dados revelados no fim da semana ao PÚBLICO reflectem uma crescente digitalização do sector do retalho, que se nota tanto nos produtos de grande consumo doméstico como noutras categorias de produtos.
O período natalício é um dos impulsionadores deste recurso cada vez maior das compras online. E ao contrário do que sucedia há cinco anos, este período não se resume agora a Dezembro. A aposta que muitos retalhistas têm feito na promoção da chamada Black Friday, que ocorre no fim de Novembro, alargou em cerca de dez dias a duração do frenesim das compras online, o que se reflecte também num incremento gigante no número de encomendas processadas.
Lacticínios lideram compras alimentares
Para o site Kuanto Kusta, por exemplo, a semana que antecede o Natal fechou com um recorde de vendas de oito milhões de euros, com cada consumidor a gastar em média 142 euros. A maioria dos compradores neste retalhista online é masculina (58%), com a faixa etária predominante a situar-se entre os 25 e os 44 anos. Lisboa (35%), Porto (28%), Braga e Setúbal (6%) e Aveiro (5%) foram as cidades com maior procura. Tecnologia de consumo foi a categoria mais procurada, com consolas de jogos e telemóveis nas preferências. Na gastronomia, lideraram os vinhos tintos, do Porto e espumantes.
De acordo com dados da consultora Kantar Worldpanel, que analisa as compras online de produtos de grande consumo como os produtos alimentares, a lista de produtos mais procurados, nos últimos três anos, pelos portugueses que fazem compras online é liderada pelos lacticínios, com os queijos no primeiro lugar, seguido dos iogurtes e do leite pasteurizado. O Natal representa uma altura em que a compra destes produtos aumenta significativamente: em 2016, a compra de queijos na Internet aumentou 29% face ao ano precedente e em 2017 subiu 74,4% face a 2016.
Entregas: tecnologia colmata falta de pessoal experiente
Para uma empresa como a Rangel, que representa em Portugal um dos principais operadores mundiais de logística, a FedEx, esta época representa um período de muito trabalho acrescido. "No período temporal que medeia entre a Black Friday e o Natal verifica-se um crescimento muito significativo do volume de entregas", refere o mesmo responsável da Rangel. Segundo números fornecidos ao PÚBLICO por um responsável operacional da Rangel Logistics Solutions, neste Natal de 2018 "verifica-se um crescimento de aproximadamente de 30% face a 2017".
Sem revelar o número de encomendas processadas em 2017 e 2018, a mesma fonte adianta ainda que o retalho electrónico é responsável por uma em cada quatro encomendas processadas, o que mostra que as compras online ainda não são a opção principal dos compradores portugueses, apesar da notória aceleração dos últimos anos. "Este forte crescimento obriga as empresas a reforçar os meios afectos à distribuição, durante um período temporal reduzido, colocando desafios do ponto de vista da captação de recursos humanos e da sua formação", salienta.
Neste contexto, a tecnologia ganha cada vez mais importância nesta época, "dado que a menor experiência dos recursos humanos recrutados pode ser colmatada com o recurso a georreferenciação dos locais de entrega e algoritmos de optimização de rotas", salienta o mesmo responsável da Rangel. Preparar significa neste sentido fazer "uma previsão dos volumes a distribuir" para "definir um plano de reforço de meios". Mesmo assim, quem estiver atento às redes sociais verá como as queixas de clientes continuam a avolumar-se, ainda que em 2018 as coisas pareçam estar menos problemáticas do que em 2017.
Tomando em conta as reclamações encaminhadas pelo Portal da Queixa (uma rede social de consumidores criada em Portugal), desde a Black Friday, a 23 de Novembro, até 21 de Dezembro, o número de queixas sobre transportadoras baixou em média 9% face a 2017. Os CTT continuam a ser a empresa mais visada pelos consumidores, com 392 queixas até ao final da semana passada. Ainda assim, regista uma descida de 20% face às 491 queixas reportadas no período homólogo de 2017. Pelo contrário, o serviço CTT Expresso quase triplica o número de reclamações: de 65 em 2017 passou para 193 em 2018, mais 197%.
O número de queixas enviadas aos visados é um pouco mais baixo, porque nem todas as reclamações registadas pelo Portal da Queixa são aprovadas, sendo excluídas aquelas que não respeitem os termos e condições definidos por esta rede social. Os dados fornecidos ao PÚBLICO indicam que entre 23 de Novembro e 21 de Dezembro foram apresentadas 859 reclamações contra CTT, CTT Expresso, Chronopost, Seur e DHL. Desse universo, 695 queixas foram encaminhadas para os visados.
Queixas avolumam-se nas redes sociais
Pode parecer um número pequeno, dado o ritmo de crescimento do número de compradores online, mas é preciso ter em conta que o Portal da Queixa é apenas um recurso. E que estes números dizem respeito apenas a um mês, em que se comparam dados com a época de Natal de 2017, que ficou fortemente marcada por falhas de operadores logísticos.
Parte da responsabilidade do que sucedeu há um ano foi da Amazon, que usou a abertura do segundo centro logístico em Espanha (Barcelona, depois de Madrid) para promover junto dos espanhóis o serviço Amazon Prime (que promete entregas mais rápidas, entre outras regalias) e para fazer entregas gratuitas aos portugueses que comprassem na Amazon Espanha. O PÚBLICO contactou um dos responsáveis ibéricos da Amazon, mas este remeteu-se ao silêncio depois de ter recebido um conjunto de perguntas. Também a Seur, transportadora usada pela Amazon Espanha, se mostrou disponível para responder a questões, mas depois deixou de responder. A avaliar pelas contas Twitter do apoio a cliente da Seur e da Amazon, as queixas continuam.
Observando o que tem sucedido através da conta Twitter que a empresa de Jeff Bezos – o homem mais rico da história moderna, segundo a Forbes – usa para prestar apoio aos clientes, as queixas continuam a avolumar-se. Na conta Amazon Help, há respostas a clientes em inglês, em francês, em português, em italiano, em espanhol, em alemão, em japonês. Ainda que nem todas digam respeito a reclamações com entregas, a maioria tem a ver com estas falhas e começam invariavelmente assim: "I am sorry about the delay..."; "I understand your disappointment..."; "Hola, lamentamos el sucedido..."; "Bonjour, désolé d'apprendre cela"... São três, quatro, cinco mensagens por minuto nesta conta, boa parte das quais a sugerir que uma das maiores retalhistas mundiais sofre, pelo menos em termos de imagem, com as numerosas falhas e com os atrasos na entrega de encomendas.