Feministas apelam à adesão dos sindicatos à greve de 8 de Março

Grupos feministas apelam a uma greve, no Dia Internacional da Mulher, ao trabalho assalariado, à prestação de cuidados, ao trabalho doméstico e ao consumo.

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manifesta;\ao da CGTP no 1.' de Maio de 2018, no Porto Nelson Garrido

Cerca de 50 mulheres estiveram reunidas neste sábado no Porto para apresentar o manifesto para uma greve feminista a 8 de Março, juntando-se ao apelo a uma paralisação que é lançado a nível internacional pela terceira vez. Com uma visão transversal sobre as formas de discriminação contra as mulheres - desde a dupla jornada de trabalho (entre o assalariado e o doméstico) à violência de género -, o apelo à paralisação não é apenas às trabalhadoras e respectivos sindicatos, mas também a estudantes, e ainda uma greve à prestação de cuidados, às tarefas domésticas e mesmo ao consumo. O objectivo: tornar visível a importância das mulheres para "sustentar as sociedades".

“As mulheres estão indignadas, estão com os punhos cerrados”, afirmava uma activista de Coimbra. Contudo, acrescentava, ainda mantêm “as mãos dentro dos bolsos”. No auditório da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, mulheres (e alguns homens) feministas de vários pontos do país - núcleos do Porto, Lisboa, Coimbra, Viseu, Braga, Vila Real, Cova da Beira, Amarante - encontraram-se de manhã para falar sobre a construção desta greve feminista, que já agrega 35 associações, colectivos e partidos e sindicatos, promovida pela Rede 8 de Março.

À tarde, para a apresentação pública do manifesto da greve, a organização reuniu mulheres de diferentes sectores, como uma funcionária de call center, uma formadora do IEFP, e uma intérprete de língua gestual em escolas para falarem das suas experiências. A ama Camila Gouveia, prestes a completar 66 anos, relatou à plateia as condições precárias em que presta serviços à Segurança Social há 28 anos: contratos de prestação de serviços, longas horas de trabalho, fiscalizações e regras sem contrapartidas. Faz parte da Associação dos Profissionais no Regime de Amas (APRA) e admite aderir à greve mesmo que o sindicato a que também está vinculada não emita um pré-aviso. “Se quiser, comunico que naquele dia não trabalho e faço greve”, diz, sublinhando a importância de a reivindicação ser colectiva.

No painel participou também Haizea Miguel, do Movimento Feminista de Madrid. Esteve na organização da Huelga Feminista em Espanha, um movimento que a 8 de Março deste ano levou milhões de pessoas para as ruas. As duas principais centrais sindicais espanholas não se juntaram à greve de 24 horas, mas lançaram uma convocatória para uma paralisação de duas horas na jornada de trabalho, e a estimativa dos sindicatos é que mais de cinco milhões de trabalhadores tenham aderido à paralisação. Em conversa com o PÚBLICO, Haizea Miguel lamenta a desvalorização do trabalho doméstico: "As donas de casa trabalham o dia todo, e contudo nas estatísticas são consideradas 'população inactiva'". É preciso valorizar esse trabalho, torná-lo visível de algum modo, defende. “Este ano paramos, para o próximo podemos escolher outra forma de dar visibilidade ao trabalho das mulheres”. 

Haizea Miguel recorda que o factor de sucesso da greve em Espanha foi o seu carácter popular, o facto de reflectir as necessidades de mulheres de várias origens sociais. “Em Espanha, as mulheres foram a cara da pobreza”, recorda. Além das condições laborais - os empregos ocupados maioritariamente por mulheres são os mais precários, de salários mais baixos, e muitas vezes invisível -, fala também da “violência machista” e da “justiça patriarcal”, que tem levado as espanholas às ruas em grandes protestos.

Os sindicatos, apesar de ausentes do encontro - à excepção do das trabalhadoras de call centers -, são vistos como essenciais para dar força às reivindicações. Um apelo que tem que ser feito “com urgência e seriedade”, pediu uma activista de Lisboa, para que a greve tenha “efeitos reais” para as mulheres trabalhadoras.

Contactada pelo PÚBLICO, Lucinda Dâmaso, presidente da UGT, afirma não ter ainda conhecimento da greve em Portugal, mas admite que o tema poderá ser debatido internamente. Salienta, contudo, que a desigualdade de género já tem estado na agenda da UGT, em particular através da Comissão de Mulheres que desenvolve projectos para promover a igualdade não apenas no trabalho mas nas próprias estruturas sindicais.

A CGTP, por seu lado, tem organizado greves em sectores com maioria de mulheres trabalhadoras, no contexto das Semanas da Igualdade. Em 2018, houve quatro greves na semana do Dia da Mulher: de educadoras de Infância (Fenprof) e das trabalhadoras com vínculo precário nas Lojas da EDP (SIESI), a 5 de Março, e das trabalhadoras das Misericórdias (Cesp) e das trabalhadoras da Nobre – Alimentação (Sintab), a 8 de Março. 

A realização de uma greve feminista não é inédita, sendo o exemplo histórico mais conhecido a paralisação de mulheres na Islândia, em 1975, para dar visibilidade ao trabalho feito pelas mulheres, em particular as tarefas domésticas. Contudo, nos últimos anos, estas greves têm-se tornado mais comuns, espoletadas pelo movimento “Ni Una Menos”, na América Latina. Na Argentina, em 2015, as mulheres pararam em indignação contra o homicídio de uma adolescente. No ano seguinte, voltaram a fazer o mesmo depois de outro femicídio, sob o mote “Vivas nos queremos”. Também em Outubro de 2016, as mulheres polacas fizeram uma “segunda-feira negra” para protestar contra a ameaça de retrocesso nas leis do aborto no país. No início de 2017, um grupo de académicas feministas lançou o apelo a uma paralisação internacional, que se tem repetido todos os anos.

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