Nasceu o primeiro bebé graças ao transplante de útero de uma dadora morta

Até agora, realizaram-se em todo o mundo 39 transplantes de útero de dadoras vivas, tendo nascido 11 bebés.

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Bebé nasceu a 15 de Dezembro de 2017 no Brasil Hospital das Clínicas da FMUSP/REUTERS

Uma mulher no Brasil que tinha recebido o útero de uma dadora morta deu à luz uma menina. É o primeiro caso com sucesso de um transplante deste género, sublinham os médicos que anunciaram agora o procedimento.

Relatado na revista médica britânica The Lancet, o caso envolveu a ligação das veias do útero da dadora às veias da receptora do transplante, bem como a ligação de artérias, ligamentos e da vagina, numa cirurgia que demorou 10,5 horas. Este sucesso surge depois de outros dez casos conhecidos de transplante de úteros oriundos de mulheres mortas – nos Estados Unidos, na República Checa e Turquia – e que não conseguiram resultar no nascimento de um bebé vivo.

Foi através de cesariana que nasceu a menina no Brasil, ao fim de 36 semanas de gestação. Pesava 2550 gramas, segundo refere um comunicado de imprensa da revista médica. Durante a cesariana, o útero transplantado foi também retirado, não apresentando quaisquer anomalias, segundo a equipa médica, e a mulher deixou de tomar medicamentos supressores do sistema imunitário necessários quando se faz um transplante para evitar a rejeição do novo órgão.

Dani Ejzenberg, médica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e que coordenou esta investigação, disse que o transplante – realizado em Setembro de 2016 quando a mulher que o recebeu tinha 32 anos – mostra que esta técnica é possível e que pode garantir às mulheres inférteis devido a problemas no útero acesso a um grande número de potenciais dadoras.

A prática actual para receber o transplante de um útero é que o órgão seja oriundo de um familiar vivo que queira doá-lo. “O número de pessoas que querem doar órgãos e estão empenhadas em fazê-lo após a morte é muito maior do que os dadores vivos, o que contribui para uma população muito maior de potenciais dadores”, disse Dani Ejzenberg citada no comunicado. “As dadoras mortas podem aumentar significativamente o acesso a este tratamento e os nossos resultados são uma prova de que há uma nova opção para mulheres com infertilidade uterina”, sublinhou a médica. Dani Ejzenberg acrescentou, no entanto, que os resultados e os efeitos do transplante de úteros de dadoras vivas e mortas ainda não foram comparados e que a técnica ainda pode ser aperfeiçoada e optimizada.

O primeiro bebé nascido a partir do transplante de útero de uma dadora viva ocorreu na Suécia em 2013. Até agora, os cientistas relataram um total de 39 procedimentos deste género, resultando no nascimento de 11 bebés vivos. Estima-se que a infertilidade afecte 10% a 15% dos casais em idade reprodutiva em todo o mundo. Nesse grupo, cerca de uma em cada 500 mulheres tem problemas no útero que impossibilitam uma gravidez.

Antes de os transplantes de útero se terem tornado possíveis, a única possibilidade de ter um filho era através da adopção ou de uma “barriga de aluguer”.

No caso do Brasil, a mulher que recebeu o útero transplantado nasceu sem útero devido a um defeito congénito chamado “síndrome de Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser”. A dadora do útero morreu aos 45 anos devido a um acidente vascular cerebral.

Cinco meses depois do transplante, escreveu a equipa de Dani Ejzenberg, o útero não mostrava sinais de rejeição, as ecografias estavam normais e a receptora do útero tinha uma menstruação regular. Os seus ovócitos tinham sido previamente fertilizados. Por fim, os embriões foram implantados no seu novo útero e, ao fim de sete meses e dez dias depois do transplante, a gravidez foi confirmada.

Ao fim de sete meses e 20 dias após o nascimento – quando o artigo foi submetido para publicação na revista The Lancet –, a bebé continuava a alimentar-se e já pesava 7,2 quilos.