Tanka Sapkota, o nepalês que nos leva às cozinhas de Itália pela televisão

O chef do restaurante Come Prima, em Lisboa, é o protagonista de um documentário de descoberta da gastronomia italiana, da origem dos produtos às cozinhas dos chefs mas, sobretudo, das nonnas.

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Tanka Sapkota no Come Prima, mostrando o certificado de Cavaleiro da Trufa Branca Rui Gaudêncio
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Durante as filmagens do documentário Taste of Italy dr

Quando Tanka Sapkota telefona podemos sempre esperar uma surpresa. Da última vez era para anunciar que tinha acabado de comprar uma trufa branca de Alba de um tamanho nunca visto em Portugal: 1,153 quilos. E, generoso, encheu o seu restaurante Come Prima, em Lisboa, de convidados aos quais serviu a trufa, da forma mais simples, como uma trufa deve ser servida, em delicadas lascas sobre um ovo a baixa temperatura, uma pasta fresca e uns escalopes finos.

A compra da trufa – toda uma aventura, com uma primeira mensagem logo ao acordar, Tanka, alvoroçado, a perguntar a opinião à mulher, ela a concordar, ele a avançar com a compra, os vendedores a aceitar e depois a recuar, ele a meter uma advogada na história, e a conseguir finalmente ter a trufa em Lisboa – foi uma emoção enorme para aquele que é habitualmente apresentado como o nepalês mais italiano de Portugal.

Há muito que Tanka tem uma paixão pela gastronomia italiana, que vai partilhando com os clientes nos seus restaurantes lisboetas – para além do Come Prima, tem também o Il Mercato e o Forno d’Oro. Mas, agora, o chef tem outra história para nos contar. Vai ser o protagonista de um documentário televisivo intitulado Taste of Italy (o realizador é Tiago Carvalho, e o objectivo é que tenha difusão internacional), no qual irá viajar por (pelo menos) quatro regiões de Itália (Piemonte, Nápoles, Veneza, Apúlia) e mergulhar a fundo nas histórias, sabores e tradições da cozinha italiana, das casas das nonnas (as avós italianas) aos restaurantes de chefs com estrelas Michelin.

A ideia, explica o produtor Duarte Neves, é ir a fundo na pesquisa sobre os produtos e receitas destas regiões, não é ficar pelo óbvio (que também lá estará), mas perceber “o território e a cultura, a essência da gastronomia italiana”. E Tanka é a figura perfeita para nos guiar nesta viagem porque tem uma curiosidade insaciável e quase infantil por tudo – e a alegria de cada uma das suas descobertas (tal como a alegria com que apresentou a jornalistas e amigos a trufa com mais de um quilo) é contagiante.

No primeiro episódio, o único que foi filmado até agora e que se passa no Piemonte, vemo-lo num leilão de trufas, mas também num bosque, acompanhando um caçador de trufas e o seu cão, e depois cozinhando uma massa em casa da nonna Lucianna, uma senhora de 80 anos, guardiã desse saber fazer, com simplicidade, a melhor pasta. Descobrimo-lo depois numa cerimónia formal, que inclui danças com bandeiras e espadas, a ser armado Cavaleiro da Trufa Branca, um reconhecimento pelo trabalho que tem feito em Portugal na divulgação deste produto daquela região italiana.

Acompanhamo-lo em seguida até à cozinha do chef Enrico Crippa, com três estrelas Michelin, para percebermos como é que essa tradição profundamente enraizada na gastronomia italiana tem também sabido evoluir e expressar-se na linguagem da alta cozinha. E daí para as vinhas de Roberta Cerretto, onde a arte contemporânea se mistura com o vinho e uma história de família que começa quando o avô recebe do patrão umas terras. “Este é também um retrato de família da cozinha em Itália”, sublinha Duarte Neves.

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Tanka durante as filmagens do documentário, com Oscar Farinetti, fundador do Eataly dr

O Piemonte não é apenas trufa, há muitos outros produtos a descobrir, e um deles tornou-se célebre internacionalmente através da produção industrial, a Nutella, mas nasceu (e continua a existir) como produto artesanal. A famosa pasta de avelãs com cacau, a gianduja, nasceu no início do século XIX devido ao embargo imposto por Napoleão aos bens vindos de Inglaterra.

Para contornar a falta de cacau, um chocolateiro de Turim, Michele Prochet, inventou a pasta de barrar que tem uma percentagem das deliciosas avelãs do Piemonte, fazendo assim render o pouco cacau disponível. É esta história que leva o chef nepalês a visitar Guido Gobino, artesão de chocolates gourmet, no episódio que termina com o encontro com Oscar Farinetti, fundador da cadeia Eataly – um modelo de promoção dos produtos e da gastronomia italiana que Tanka acredita que poderia ser replicado para os produtos artesanais e de qualidade portugueses.

Tanka Sapkota começou por aprender cozinha italiana na Alemanha, depois veio para Portugal, onde abriu um restaurante. Mas sentia que ainda não sabia o suficiente e que só em Itália poderia aprender. Em 2008 e 2009 estudou na escola Gambero Rosso, em Roma, e Alma, em Parma. “Agora chego à conclusão que a escola também não é suficiente e que preciso de aprender com as nonnas”, confessa.

E aprender significa ir até ao fundo de cada coisa, “chegar bem à origem”. Quando começou a servir trufa branca no Come Prima, em 2007, passou duas semanas em Itália para conhecer bem o produto que ia apresentar à mesa do seu restaurante.

Fez o mesmo mais tarde quando foi estudar a melhor forma de fazer massa de pizza (e o Come Prima recebeu o reconhecimento da Associazione Verace Pizza Napoletana) e ainda quando foi à procura da melhor burrata. “Não é fazer por fazer”, diz, “é chegar ao fundo; aí falhamos poucas vezes porque sabemos realmente tudo sobre aquele produto”. É esse fascínio que quer partilhar agora nesta série de documentários que deverá estar pronta no início do próximo Verão.

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