“Brexit” de May já está à venda. Quererão os deputados britânicos comprá-lo?
Primeira-ministra põe em marcha estratégia para persuadir Parlamento a aprovar o acordo de saída da UE no dia 11 de Dezembro. Plano inclui entrevistas, intervenções públicas, sessões de esclarecimento aos deputados e um possível debate televisivo com Corbyn.
Theresa May não perde tempo. Menos de 24 horas depois da aprovação histórica do acordo de saída do Reino Unido da União Europeia, em Bruxelas, a primeira-ministra britânica pôs em marcha o seu plano para convencer os deputados – e o país – de que qualquer dos cenários que não envolva a aprovação do documento na Câmara dos Comuns é um salto certo para o abismo. A votação está prevista para o dia 11 de Dezembro, de acordo com fontes de Downing Street.
Da agenda da líder do executivo e da sua equipa para as próximas duas semanas constam entrevistas, sessões de esclarecimento com deputados, encontros com empresários e representantes do sector industrial e um sem-número de actos de campanha por todo o país. No fim-de-semana o Governo já tinha publicado uma “carta à Nação”, onde se mostravam os benefícios do acordo.
Segundo o Daily Telegraph, em cima da mesa poderá estar também um debate televisivo entre May e o líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn. Uma possibilidade que o Labour vê com “muito agrado”, segundo um porta-voz do partido, e que, a realizar-se, atesta o compromisso da primeira-ministra na defesa do ‘seu’ “Brexit”. Nicola Sturgeon, primeira-ministra da Escócia, também mostrou abertura para debater com May.
Theresa May rejeitou debater com Corbyn durante a campanha para as eleições antecipadas de Junho de 2017, que lhe valeram a perda da maioria parlamentar.
Esta segunda-feira arrancou com um Conselho de Ministros extraordinário, convocado com o objectivo de se alinharem estratégias para a venda do acordo fechado com os 27 Estados-membros da UE – o próprio cabinet está dividido no apoio ao documento –, prosseguiu com a terceira sessão em 11 dias de perguntas e respostas na Câmara dos Comuns e irá encerrar com um encontro entre elementos do Governo tory e deputados trabalhistas.
“Durante as próximas semanas, o nosso dever enquanto Parlamento será o de estudar este acordo ao detalhe, debatê-lo com respeito, ouvir os nossos eleitores e decidir qual é o verdadeiro interesse nacional”, resumiu a primeira-ministra no Parlamento, argumentando que em caso de rejeição do documento, o país “voltará à estaca zero” e “abrirá a porta a mais divisão e mais incerteza”. “Não está disponível um acordo melhor do que este”, insistiu.
Entre tories descontentes, unionistas norte-irlandeses desiludidos e trabalhistas, nacionalistas escoceses ou liberais-democratas indignados, não faltam no Parlamento opositores ao acordo do “Brexit” e à declaração política sobre a relação futura entre o Reino Unido e a UE.
Nesta altura do campeonato já nem seriam precisas provas para constatar essa realidade, mas a enésima presença de May na câmara baixa de Westminster para defender o acordo do “Brexit” tratou de as reforçar: na primeira hora de perguntas à primeira-ministra, não se ouviu por ali nenhum deputado, conservador, unionista ou da oposição, a defender o acordo fechado no domingo com Bruxelas.
Quando a “cavalaria chegou”, como escreveu no Twitter a jornalista Pippa Crerar, do Guardian, já as bancadas da Câmara dos Comuns estavam despidas, evidenciado um Parlamento de costas voltadas para May.
Para além do Labour, do Partido Nacional Escocês ou dos Liberais Democratas, pelo menos 89 deputados conservadores já anunciaram publicamente que vão votar contra o documento. A grande maioria são hard-brexiteers do Partido Conservador – que ainda acreditam poder lançar uma moção de desconfiança a May antes da votação final do acordo –, mas o número de opositores também inclui remainers.
Os dez deputados do Partido Unionista Democrático da Irlanda do Norte, que apoiam o Governo no Parlamento, também se vão opor ao acordo que May trouxe para cima da mesa.
Face a tamanha e tão diversificada oposição, os 320 votos que May necessita para fazer aprovar o tratado de saída no dia 11 parecem cada vez mais uma miragem. Mas a primeira-ministra mantém o guião: vender o acordo até ao final do prazo e esperar que a dimensão da revolta refreie. O estado de almas no Parlamento, esse, foi sublinhado pelo deputado conservador Mark Francois: “A Câmara dos Comuns nunca se rendeu a ninguém e não será agora que se renderá.