Anemia: sensibilizar para combater
Comemora-se hoje o Dia da Anemia, uma data simbólica para o Anemia Working Group Portugal – Associação Portuguesa para o Estudo da Anemia, cujo trabalho passa por sensibilizar a população e a comunidade médica para a importância de estar atento aos sinais e de identificar as causas desta condição que afecta 20% dos portugueses.
Sabe-se que 50% das pessoas com anemia têm deficiência de ferro, o que faz com que esta seja a principal causa para o desenvolvimento desta condição. Estima-se que dois biliões de pessoas apresentem anemia em todo o mundo, e a sua definição, traduz-se “no compromisso de transportar oxigénio aos órgãos e tecidos, por diminuição do número de glóbulos vermelhos e de hemoglobina, considerados normais para a idade, o sexo e a etapa de crescimento, independentemente da causa”, identifica Robalo Nunes, presidente do Anemia Working Group Portugal (AWGP) – Associação Portuguesa para o Estudo da Anemia.
E se o diagnóstico da anemia é relativamente fácil pelas referências aritméticas definidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e detectadas através de análise sangue [nas mulheres, quando a hemoglobina está abaixo dos 12 g/dl, e nos homens, quando o valor é menor que 13 g/dl], a investigação da causa constitui um desafio para os profissionais de saúde. É para isso que o grupo científico AWGP tem vindo a alertar, desde a sua génese, em 2012, através de um trabalho multidisciplinar que envolve médicos de várias especialidades. “Os médicos de família são nossos parceiros e é através deles que um doente deve entrar no sistema. Perante o diagnóstico de uma anemia, há que questionar o motivo que conduziu à mesma”, defende o também director da Unidade de Imunohemoterapia do Hospital das Forças Armadas, em Lisboa.
Dependendo dos casos, valores de hemoglobina abaixo do normal podem levar à prescrição de outras análises de sangue com marcadores específicos ou exames imagiológicos. “É fundamental ir à raiz do problema”, defende Robalo Nunes. Caso contrário, podem estar a ser tratados doentes com suplementações ou fármacos que apenas “mascaram os sintomas. A anemia pode ser o sinal de uma doença subjacente grave e há que investigá-la”, sublinha.
20% da população portuguesa tem anemia
Mais do que o resultado das análises de sangue, é importante estar atento aos sinais, e o aviso não é apenas para os doentes mas também para os médicos. Ainda assim, identificar uma anemia não constitui um desafio fácil. É que esta condição pode afectar todos os sistemas e aparelhos. “Os sintomas são inespecíficos mas as pessoas devem ouvir o seu corpo e procurar ajuda junto do médico de família que tem como papel, tentar perceber a causa da anemia, tratá-la convenientemente ou encaminhar o doente para que seja feita uma investigação mais exaustiva e dirigida”, explica Robalo Nunes.
Segundo as estimativas da OMS, era previsível que, em Portugal, cerca de 15% dos adultos fossem anémicos. O AWGP veio, no entanto, demonstrar que os valores reais ultrapassam as expectativas. Através da realização do estudo epidemiológico nacional Empire, publicado em 2016, com a integração de cerca de 8000 analisados, descobriu-se que prevalência de anemia em Portugal é de 20%. “Tínhamos essa inquietação e viemos a comprovar que este problema de Saúde Pública era maior do que as previsões da OMS”, acrescenta Robalo Nunes. Por outro lado, percebeu-se com este estudo que “84% dos participantes desconheciam a sua condição e desvalorizavam sintomas”. Conclui-se ainda que havia um pico de anemia nos adultos entre os 18 e os 34 anos – o que originou a preocupação com as mulheres em idade fértil e as grávidas –, e nos idosos a partir dos 75 anos.
Estava então sinalizado o problema e daí para cá, o AWGP tem dinamizado outras iniciativas de forma regular. Em cinco anos, foram realizadas 130 acções de rastreio, em vários locais do país, que incluíram a medição da hemoglobina e da ferritina [marcador isolado que analisa as reservas de ferro no organismo] envolvendo mais de 11 mil pessoas rastreadas. “Os resultados vêm na mesma linha do que já havia sido concluído com o Empire. Percebemos que há uma relação directa entre os sintomas e a anemia, ainda que seja possível uma pessoa ser assintomática. Estas acções funcionam como sensibilização porque as pessoas que participam tornam-se quase ‘embaixadoras’ da causa”, explica Robalo Nunes.
Grupos e comportamentos de risco
A prevalência de anemia em todo o mundo “é bastante superior nas mulheres do que nos homens. A fertilidade paga-se pelas perdas regulares de sangue, nem sempre compensadas”, assinala o presidente da AWGP. As mulheres grávidas deveriam preparar a sua gravidez antecipadamente “mas isso nem sempre acontece”, sendo candidatas a desenvolver anemia nesta fase da vida. As pessoas em idade avançada também integram os grupos de risco mas existe ainda um segmento da população que preocupa a equipa do AWGP e sobre o qual ainda se sabe muito pouco: jovens a passar por etapas de crescimento.
Robalo Nunes chama ainda à atenção para alguns grupos que seguem regimes alimentares muito restritivos que podem comprometer a “produção de glóbulos vermelhos”, alertando para a importância de seguir uma dieta equilibrada e diversificada. “Esse é porventura o melhor cenário de compensação nutricional que as pessoas podem ter”, sublinha o médico. Como forma de prevenir a anemia, o médico sugere a combinação de consumo de proteína animal com proteína vegetal.