Avião que aterrou de emergência em Beja esteve mais de um mês em manutenção profunda
Aeronave fez uma inspecção de tipo C, a mais profunda de todas, que implica uma verificação total do aparelho e a desmontagem de várias das suas partes.
O avião da companhia aérea cazaque Air Astana que aterrou este domingo de emergência no aeroporto de Beja com a ajuda de dois caças F16 da Força Aérea Portuguesa (FAP) tinha estado mais de um mês em manutenção nas oficinas da OGMA – Indústria Aeronáutica de Portugal, em Alverca, de onde levantara voo. Estivera a fazer uma inspecção de tipo C, a mais profunda de todas, que implica uma verificação total do aparelho e a desmontagem de várias das suas partes.
O descontrolo da aeronave, segundo o PÚBLICO apurou, poderá estar ligado a um problema nos comandos que controlam a inclinação lateral do aparelho – os chamados “ailerons” – existentes nas asas da aeronave. “Os pilotos viravam o avião para um lado e o aparelho voltava-se para o outro”, descreveu uma fonte do sector aeronáutico.
A tese é corroborada pelas declarações da Air Astana, que adiantou que as informações iniciais de que dispunha apontavam para que problemas nos eixos do controlo tenham estado na origem da aterragem de emergência do avião em Beja. A “aeronave apresentava desvios de estabilidade do eixo longitudinal [roll-axis, no original]”, disse fonte oficial da companhia do Cazaquistão, em resposta à agência Lusa.
Esta segunda-feira, num incidente de uma gravidade bastante inferior, os caças das Forças Armadas Portuguesas voltaram a actuar, para ajudar um avião da companhia holandesa Transavia que registou um problema após descolar do Funchal com mais de 140 pessoas a bordo.
Em comunicado, a Força Aérea revelou que activou nesta segunda-feira “a parelha de F16M, em alerta permanente na Base Aérea N.º5 (Monte Real), para assistir uma aeronave da companhia aérea holandesa Transavia, que declarou emergência após descolar do Funchal”.
“Problemas de pressurização”
O Boeing 737 da Transavia, que transportaria 149 passageiros, “comunicou problemas de pressurização quando fazia a ligação com Amesterdão, tendo divergido e aterrado em segurança no Aeroporto de Faro pelas 12h51”.
Numa nota escrita, a Transavia apresenta uma versão diferente. Sem nunca mencionar a palavra “emergência”, ao contrário da Força Aérea, diz que o envolvimento dos F16 “foi parte de um treino/exercício” dos militares. De acordo com a companhia aérea, o avião levava 144 pessoas a bordo e teve de divergir para Faro para ser alvo de uma “inspecção técnica” após um “toque de cauda” no momento da descolagem no Funchal.
“Devido a este incidente a aeronave precisou de uma inspecção (algo que é um procedimento natural) por precaução, no aeroporto mais perto, que era o de Faro”, explica a empresa. Depois da inspecção, o avião seguiu o seu percurso, “com um atraso de cerca de duas horas e meia”, aterrando no aeroporto de Schiphol (Amsterdão) às 17h15 locais.
A Força Aérea insistiu que a descolagem de dois F16 para assistir a aeronave foi exclusivamente para prestar assistência, recusando tratar-se de um exercício militar como alega a companhia holandesa.
Uma situação bem diferente do que aconteceu com o Embraer ERJ-190, em que foram reportados problemas de controlo de voo que levaram a tripulação da Air Astana a ponderar uma arriscadíssima aterragem no mar ou no rio Tejo. O aparelho continua parado no aeroporto de Beja e só poderá voar com autorização do Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários (GPIAAF), que já está a investigar o incidente.
Os pilotos que seguiam no aparelho já foram ouvidos pelos investigadores, que recolheram igualmente os dados existentes na caixa negra do aparelho, onde se registam os dados do voo e as comunicações da tripulação.
A análise desses dados deverá demorar pelo menos cerca de duas semanas, havendo depois um longo caminho de investigação a percorrer, que envolverá tanto a Embraer como a OGMA. Esta empresa, detida maioritariamente pelo fabricante de aviões Embraer em parceria com o Estado português, é um centro de manutenção autorizado daquele construtor, que fabricou a aeronave da Air Astana, um cliente habitual da OGMA.
Avião sem registo de incidentes graves
Apesar da gravidade do problema que por pouco não se tornou trágico, o P4-KCJ com cinco anos, registado em Aruba – que apesar de ficar na América faz parte dos Países Baixos e portanto está sob supervisão da autoridade aeronáutica holandesa –, não possui registo de qualquer incidente grave, tendo vindo a Portugal a realizar uma habitual acção de manutenção programada. Todos os procedimentos desta operação serão analisados ao pormenor para perceber se alguma coisa falhou e, se sim, porque tal aconteceu.
Sobre o segundo incidente o GPIAAF ainda “está a recolher a informação necessária para avaliar sobre a eventual abertura de uma investigação de segurança”.
Fonte da ANA – Aeroportos de Portugal disse entretanto à agência Lusa que a aterragem do Boeing 737 em Faro “correu normalmente” e é uma “situação que acontece em todos os aeroportos”.
Na sua conta oficial no Twitter, o ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, deu conta de mais esta missão. “É muito raro ter duas emergências em dois dias, mas a FAP estava preparada”, escreveu. “Esta é a segunda vez que a Força Aérea activa a parelha de F16 para escoltar uma aeronave civil em dificuldades em menos de 24 horas”, salientou também o comunicado da FAP. Com Ana Maia e Luís Villalobos