Muitas leis, muitas críticas, e a questão de violência no desporto por resolver
As claques, ou “grupos organizados de adeptos”, na letra da lei, continuam a viver numa zona cinzenta em termos legais.
“Lei contra a violência no desporto não é cumprida”; “Violência no desporto: legislação há, é preciso é aplicá-la”: 11 anos – e três leis (a caminho da quarta) – separam estes dois títulos do PÚBLICO, um período durante o qual pouco ou nada mudou no combate à violência no desporto em Portugal. As claques, ou “grupos organizados de adeptos”, na letra da lei, continuam a viver numa zona cinzenta em termos legais, os incidentes nos estádios e recintos desportivos continuam a ser castigados de forma simbólica, e as críticas continuam a fazer-se ouvir.
Está em apreciação no Parlamento pela Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto a proposta de Lei 153/XIII, apresentada no início de Outubro pelo Governo, e que visa “alterar o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espectáculos desportivos”. Este diploma irá alterar a Lei n.º 52/2013, que actualizou a Lei n.º 39/2009, que revogou a Lei n.º 16/2004 – mas, em termos práticos, as mudanças introduzidas pelo novo texto não são significativas. O regime sancionatório continuará a ser mais ou menos semelhante ao anterior, que merecia críticas tanto dos clubes, como do secretário de Estado da Juventude e do Desporto: João Paulo Rebelo admitia em Abril que a lei em vigor é “completamente ineficaz” no combate à violência no desporto.
Segundo os dados fornecidos pela Polícia de Segurança Pública ao PÚBLICO em Maio, na época 2017-18 havia apenas 19 pessoas proibidas de entrar em estádios por terem provocado distúrbios durante jogos ou nas imediações destes recintos. Em 2016-17 havia 38 interdições em vigor.
Paralelamente à apresentação da proposta de lei foi publicado o decreto regulamentar que cria a Autoridade para a Prevenção e o Combate à Violência no Desporto (APCVD). Este organismo irá assumir “as atribuições que até agora eram cometidas ao Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ)” na “fiscalização” do cumprimento da lei.
Um dos pontos de discórdia que a nova lei não virá alterar é a obrigatoriedade do registo pelos clubes dos “grupos organizados de adeptos”, com indicação para cada filiado do nome, número do cartão de cidadão, data de nascimento, fotografia, filiação caso seja menor de idade, morada, e contacto telefónico e de correio electrónico. Esse registo começou por ser feito junto do extinto Conselho Nacional contra a Violência no Desporto, depois passou para o IPDJ, e agora ficará com a APCVD. Segundo informações do IPDJ ao Expresso, em 2017 eram 23 as claques legalizadas, entre as quais duas do FC Porto (Super Dragões e Colectivo Ultras 95) e quatro do Sporting (Juventude Leonina, Torcida Verde, Directivo Ultras XXI e Brigada Ultras Sporting).
O Benfica sempre foi crítico da lei e nunca teve claques registadas. “Nunca soube que o Benfica tinha claques”, chegou a afirmar o presidente Luís Filipe Vieira, quando o clube foi castigado pelo IPDJ com um jogo à porta fechada por apoio a claques ilegais – decisão que os “encarnados” impugnaram e da qual apresentaram recurso. “Não posso obrigar alguém a identificar-se. Posso dizer que todos os que estão na chamada claque são sócios e têm as quotas e Red Pass (bilhete de época) pagos, têm as mesmas regalias e direitos que eu. São um grupo organizado de sócios e tenho de respeitá-los porque são sócios do Benfica”, reforçou Vieira, em entrevista dada há duas semanas à TVI.