Governo faz pequenos ajustes no IRS sem mexer nos escalões
Entrega das declarações vai durar três meses. Horas extra com retenção na fonte autónoma, como subsídios de férias e Natal. Bailarinos passam a ter dedução que já se aplica a outras profissões de desgaste rápido.
Depois das mexidas nos escalões do IRS este ano, o Orçamento do Estado (OE) para 2019 que o Governo entrega hoje no Parlamento deverá deixar de fora alterações de monta no imposto. Uma versão preliminar do diploma levado à reunião do Conselho de Ministros de sábado, a que o PÚBLICO teve acesso, inclui pequenos ajustes nalgumas regras, mas não prevê qualquer mudança nas taxas, nem no número dos escalões.
A ausência cola com aquilo que foram as últimas semanas de negociação do OE, em que nenhum partido criou a expectativa de uma descida generalizada do IRS — tanto o BE como o PCP e Os Verdes capitalizaram o anúncio de outras medidas não fiscais com impacto no bolso das famílias.
Os ajustes nas regras do IRS são cirúrgicos. Alguns já tinham sido anunciados, como a redução do imposto para os emigrantes que regressem ao país, ou a nova forma de aplicar as retenções na fonte para as horas extraordinárias. Mas também há surpresas.
Uma das novidades tem a ver com as datas de entrega do imposto. A versão preliminar do OE prevê que os contribuintes passem a ter três meses, em vez de dois, para submeterem a declaração. A entrega começará a 1 de Abril e terminará a 30 de Junho de cada ano, “independentemente de este dia ser útil ou não útil”.
A apresentação já acontece ao mesmo tempo para todas a categorias de rendimento (seja uma pessoa pensionista, trabalhador por conta de outrem, a recibos verdes ou apresente outros rendimentos). Isso mantém-se, como se mantém a entrega online (a apresentação em papel acabou este ano).
Imposto e retenções
Apesar de não haver mexidas nas taxas em 2019, espera-se que no próximo ano haja reembolsos maiores do que os pagos este ano — porque, como a consultora PwC já simulou em Janeiro para o PÚBLICO, as tabelas de retenção de 2018 não estão a reflectir por completo a descida do IRS. Essa opção, não desmentida pelo Governo, arrasta uma parte do alívio do imposto (de 2018) para o momento do acerto anual (em 2019).
Será preciso esperar pela divulgação das tabelas de retenção (o desconto mensal feito todos os meses no salário) para saber se as taxas vão já reflectir toda essa descida. Mas quanto às taxas gerais, as que contam para apurar o imposto, nada está incluído na versão preliminar do OE.
Para os trabalhadores a recibos verdes de rendimentos mais baixos, 2019 é o ano em que alguns vão ver na prática o efeito de uma regra que vem do OE de 2018, o mínimo de existência (a medida que permite ficar isento de IRS, total ou parcialmente, de forma a que os cidadãos não fiquem com um rendimento anual inferior a 9006,9 euros líquidos). Em 2019 este patamar também deverá subir em função da actualização do Indexante de Apoios Sociais (IAS).
No caso dos trabalhadores que recebam horas extraordinárias, o Governo cria uma regra para que haja uma retenção na fonte autónoma, como já acontece com os subsídios de férias e Natal. Será aplicada a taxa igual “aos restantes rendimentos do trabalho” auferidos nesse mês. Por hipótese, se um enfermeiro receber horas extra, essa parte do salário não vai ser somada ao vencimento base para calcular o IRS a reter (o objectivo é evitar que se aplique uma retenção mais alta, porque à medida que o rendimento mensal cresce sobe a percentagem a reter).
O Governo desenhou outras pequenas alterações. Uma tem a ver com o universo das profissões de desgaste rápido que podem deduzir ao rendimento (até cinco vezes o valor do Indexante dos Apoios Sociais, IAS) valores gastos com seguros de doença, de acidentes pessoais e de seguros de vida.
Actualmente, já o podem fazer os desportistas, os mineiros e os pescadores. Agora, passam também a ser abrangidos os bailarinos de clássico ou contemporâneo, quer tenham um contrato a termo certo, quer quem está a recibos verdes. Actualmente, cinco vezes o IAS são 2144,5 euros.
IRS especial
Uma das propostas já previstas desde o Verão é o regime especial de IRS para os emigrantes que regressem ao país em 2019 e 2020. A medida vai permitir a estes cidadãos pagar IRS durante cinco anos apenas sobre metade do que ganham (o que é diferente de pagar apenas 50% do IRS, como o PÚBLICO escreveu incorrectamente numa primeira versão).
Segundo a versão preliminar do diploma, a norma abrange quem passe a ser residente fiscal em Portugal “entre 1 de Janeiro de 2019 e 31 de Dezembro 2020”, bastando cumprir duas condições: não ter sido residente “em território português em qualquer dos três anos anteriores” (2016, 2017 e 2018; ou 2017, 2018, 2019); e ter sido “residentes em território português” antes desse período. Isto é: quem emigrou até 2015 ou ainda em 2016.
A forma como o Governo redigiu a norma nesta versão preliminar prevê que as pessoas que emigraram em 2015 ou 2016, para beneficiarem deste IRS especial, já não tenham sido residentes fiscais em Portugal no ano de partida para o estrangeiro (caso regressem em 2019 ou 2020, respectivamente).
A descida dura cinco anos, segundo a proposta final do OE. A medida vai correr em paralelo com o regime dos residentes não-habituais — contestado pelo BE, que o quer revogar — e, por isso, quem já tenha pedido esse estatuto fica de fora desta medida.