Alemanha: portal da extrema-direita para denúncia de professores alvo de piratas informáticos
Partido radical AfD quer que alunos façam denúncias de professores que não mantenham “neutralidade política”.
Foi mais um golpe do partido de direita radical alemão Alternativa para a Alemanha (AfD): criar uma plataforma online em que alunos possam denunciar professores, do ensino preparatório ou universitário, que não mantenham “neutralidade política”.
A proposta provocou uma tempestade imediata de críticas dos outros partidos e de associações de professores por fomentar uma cultura de denúncia e não de discussão, e lembrar práticas de serviços como a Gestapo do regime nazi ou a Stasi da ex-RDA (República Democrática Alemã), onde as denúncias de opositores eram encorajadas e recompensadas.
A ministra da Justiça, Katarina Barley, do Partido Social-Democrata (SPD), foi uma de muitas vozes a fazer esta comparação: “Organizar denúncias é uma ferramenta de ditaduras”, disse a responsável ao Frankfurter Allgemeine Zeitung. “Quem usar esta ferramenta enquanto partido, ‘expuser’ professores indesejáveis e os envergonhar publicamente revela o seu conceito de democracia.”
A plataforma inicial foi posta a funcionar na cidade-estado de Hamburgo, que, sob o tema “neutralidade nas escolas”, apela aos alunos para discutir com professores quando acharem que a neutralidade não é respeitada e, caso isso funcione, enviem denúncias ao partido.
Esta página pretendia ser um projecto-piloto de um projecto a expandir aos restantes 15 estados federados. O seguinte foi o de Baden-Württemberg, onde o partido pôs a funcionar duas plataformas: uma para queixas em relação a professores do ensino básico e secundário e outra para denúncias de professores do ensino superior, ligadas a um deputado no parlamento estadual de Baden-Württemberg. O deputado do parlamento do estado Stefan Räpple queixou-se de professores que vão dar aulas com Tshirts dizendo "Fuck AfD".
Mas estas duas páginas, online desde quinta-feira, foram rapidamente alvo de um ataque informático e estavam esta sexta-feira indisponíveis.
Estas páginas pareciam ser diferentes da principal de Hamburgo já que possibilitariam a divulgação pública do nome dos professores – algo que esbarraria quase certamente na forte lei da privacidade do país.
Os sindicatos dos professores dizem que estes estão obrigados à neutralidade política por uma lei de 1976, mas é muito raro que haja acusações: as duas principais organizações conhecem um ou dois casos de professores acusados nas últimas décadas, segundo o jornal Frankfurter Rundschau.
A AfD é um partido anti-imigração, anti-refugiados, e anti-islão, com episódica relativização dos crimes da Alemanha nazi. É populista, afirmando-se representante da “vontade do povo” contra a “elite”, fomentando um clima de “nós contra eles”.
A ideia de que há uma onda de reacção da “elite” contra o partido parece ser uma nova linha de acção do partido, que entrou no Bundestag (Parlamento) pela primeira vez nas eleições de 2017 com 13%: depois de queixas sobre representações negativas nos meios de comunicação social da parte de responsáveis do partido, surgem agora as queixas de que o partido é alvo de uma campanha contra si por parte de professores.