As três grandes “guerras” entre Azeredo e os militares
As chefias militares nunca esconderam, ainda que em surdina, que o perfil de Azeredo Lopes para ministro da Defesa não era do seu agrado. E as relações entre as partes foram-se degradando, sobretudo devido a três casos em que ministro e militares “chocaram” de frente. Hoje, as relações entre os militares e quem os tutela estarão mais toldadas que nunca.
O caso Colégio Militar
No início de Abril de 2016, o então chefe do Estado-Maior do Exército (CEME), general Carlos Jerónimo, demite-se no cargo na sequência de desentendimentos com Azeredo Lopes. Em causa estão declarações do subdirector do Colégio Militar, tenente-coronel António José Ruivo Grilo, que revelam discriminação de alunos homossexuais naquele estabelecimento de ensino.
O ministro pede explicações ao CEME, que tutela o colégio, “bem como sobre as medidas que pretende adoptar, enquanto responsável pelas orientações superiores deste estabelecimento militar de ensino, para garantir o direito à não discriminação, nomeadamente em função da orientação sexual”.
Azeredo sugere a demissão da direcção do colégio e Jerónimo não concorda. No dia da demissão escreveu uma carta aos militares em que afirma: “Há momentos no percurso dos militares em que a defesa dos princípios da ética e da honra, bem como o cumprimento de deveres militares como os de tutela e de responsabilidade, impõem que se actue perante as circunstâncias.” Poucos dias depois o general Rovisco Duarte é nomeado CEME.
Mortes nos Comandos
A 4 de Setembro de 2016, dois militares morreram na sequência do treino do 127.º Curso de Comandos na região de Alcochete e vários outros receberam assistência hospitalar. O Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa abre uma investigação, o Ministério Público é coadjuvado pela Polícia Judiciária Militar (PJM).
Logo aqui, os militares discordam, pois entendem que a investigação deveria ser feita pela PJM. O ministro por diversas vezes saudou a investigação criminal. Em Julho deste ano, o CEME exonerou o coronel Pipa Amorim do cargo de comandante do Regimento de Comandos, cerca de uma semana após as cerimónias de 56.º aniversário daquelas forças especiais.
Nessa ocasião, Pipa Amorim afirmou que os 19 militares acusados da morte dos dois recrutas têm sido “vítimas constantes de atentados à sua dignidade, idoneidade e bom nome". “Não podemos aceitar que estas cabalas contra os nossos militares sejam utilizadas como arma de arremesso com o objectivo de desacreditar os Comandos e o Exército e o que estes símbolos representam", afirmou ainda Amorim. O ministro sempre recusou comentar a decisão de exonerar o comandante dos Comandos. Em surdina, os militares vão afirmando que a decisão do CEME tem mão de Azeredo Lopes.
Tancos, sempre Tancos
A 27 de Junho de 2017, o Exército descobriu que faltava material de guerra nos Paióis Nacionais de Tancos. Desde esse dia que as chefias militares e o ministro da Defesa têm dois pontos que os unem: andaram sempre meio perdidos na situação e desvalorizaram o sucedido em diversas ocasiões, apesar dos alertas do Presidente da República para a gravidade do acontecimento.
De resto, houve afirmações contraditórias das duas partes, uma guerra entre PJ e PJM – mais uma vez, os militares não gostaram que fosse a PJ a liderar a investigação – que Azeredo Lopes, que tutela a PJM, nunca conseguiu travar.
Até que, no final de Setembro, é conhecido o alegado conluio entre membros da PJM e da GNR de Loulé e o alegado assaltante de Tancos, que levou ao achamento do material de guerra, deixando o criminoso em liberdade. Isto sem passar qualquer informação à PJ. Vários militares foram detidos, mas apenas o ex-director da PJM, coronel Luís Vieira, e o suposto assaltante ficam presos. Os restantes ficam em detenção domiciliária. Os militares acabam por confessar a encenação.
Depois, ficou a saber-se que um dos homens da PJM, Vasco Brazão, tinha dito ao juiz de instrução que no Ministério da Defesa, Azeredo Lopes incluído, sabiam de tudo sobre a operação para aparecimento do equipamento militar roubado. E sabiam, porque Brazão e o ex-director da PJM tinham entregado, em Novembro, ao tenente-general António Martins Pereira, então chefe de gabinete do ministro e hoje assessor do chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, um memorando em que contavam tudo e que este tinha informado o ministro por telefone.
Azeredo desmente de imediato ter conhecimento de qualquer informação. Martins Pereira, admite ter recebido o memorando, mas nunca percebeu qualquer "indicação de encobrimento de eventuais culpados do furto de Tancos".
Nesta quarta-feira, ficou a saber-se que, após uma semana de procura, não havia rasto de qualquer memorando no Ministério da Defesa. Antes, tinha-se sabido que o major Vasco Brazão, era fiador de um apartamento do Estado arrendado pelo filho e subarrendado indevidamente a turistas. Hoje sabe-se também que a relação entre militares e quem os tutela, o ministro da defesa, está muito toldada.