Chefe dos instrutores dos Comandos soube de situação “emergente mas não urgente” de Hugo Abreu
Hugo Abreu foi um dos dois recrutas que morreram depois da Prova Zero, no dia 4 de Setembro de 2016.
O capitão Rui Passos Monteiro, visado no processo sobre as circunstâncias da morte de dois recrutas no curso 127 dos Comandos, disse esta quarta-feira em tribunal que havia muitos “pontos que era importante esclarecer”. Referia-se à acusação que o coloca como um dos principais arguidos, enquanto responsável dos instrutores, por abuso de autoridade e por ofensa à integridade física. O oficial também está entre os sete que incorrem numa pena de prisão efectiva, se as acusações se confirmarem.
Ao longo de mais de três horas, o capitão mostrou firmeza no discurso e na postura, mantendo na mão fechada a boina vermelha de comando.
Relatou os factos desse dia 4 de Setembro de 2016, hora a hora. Já depois das 20h no primeiro dia da Prova Zero, contou, foi informado pelo capitão-médico de que um instruendo tinha de ser transferido para o hospital. Às 20h45, esse instruendo entrava em paragem cardiorrespiratória.
“Havia essa necessidade. A situação era emergente mas não urgente”, disse, citando o médico, antes de explicar, perante a insistência da juíza, que os militares eram muitas vezes criticados por aparecerem no Hospital das Forças Armadas com as fardas sujas. “Emergente”, neste sentido, quereria dizer que seriam transferidos depois de trocarem a farda, explicou mais tarde, questionado pelo procurador José Nisa, e sem causar perturbação aparente entre advogados, réus e assistência.
Solicitado pela juíza-presidente do colectivo a esclarecer a diferença, o oficial dos Comandos disse: “Tinha que acontecer, mas não naquele exacto momento.” O instruendo em situação “emergente” era Hugo Abreu. Um dos instruendos que melhor desempenho tinha demonstrado na fase de estágio, do grupo de graduados, entrou em paragem cardiorrespiratória às 20h45, vindo a morrer uma hora depois.
Já não chegou a ser transferido para o Hospital das Forças Armadas como aconteceu nessa noite com Dylan da Silva, o soldado que veio a falecer seis dias depois no Hospital Curry Cabral, quando aguardava um transplante de fígado. Os dois jovens de 20 anos morreram por falência dos órgãos provocada por desidratação extrema.
No relato que tinha preparado e nas perguntas colocadas pelos magistrados, o capitão confirmou que os instrutores tinham sido autorizados a dar mais dos três litros previstos de água a cada instruendo por dia. Disse que a água se distribuiria ao longo do dia para garantir que teriam um litro antes de cada refeição, e reconheceu que uma das suas funções era garantir que os instruendos eram devidamente hidratados e alimentados durante a instrução.
Apesar disso, disse não ter tido conhecimento de que os instruendos do grupo de graduados, onde estava Hugo Abreu, fora impedido de beber água ao pequeno-almoço.