Primeiro-ministro anuncia programa a dez anos para comprar arte portuguesa

António Costa anunciou medida, inscrita no próximo Orçamento do Estado, ao receber artistas que escreveram carta de protesto sobre o estado das artes plásticas no país. Para 2019 prometeu 300 mil euros, um valor que deverá vir a aumentar gradualmente. Para os artistas "é um princípio", falta ainda muita coisa.

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Manuel Vieira, José de Guimarães, António Costa e Luís Filipe Castro Mendes Miguel Manso
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António Costa com os artistas hoje em São Bento: da esquerda para a direita estão Teresa Lacerda, Rui Vasconcelos, Alexandre Conefrey, Pedro Proença, Miguel Rondon, José de Guimarães, António Costa, Manuel Vieira, Luís Filipe Castro Mendes, Pedro Portugal, Isabel Garcia, Francisco Pinheiro e Cristina Ataíde Miguel Manso
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A carta, emoldurada, entregue ao primeiro-ministro na residência do primeiro-ministro Miguel Manso
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O primeiro-ministro anunciou esta quarta-feira a criação de um programa de aquisição de arte contemporânea portuguesa. Esta iniciativa, que permitirá ao Estado comprar todos os anos peças a artistas nacionais, contará em 2019 com 300 mil euros.

O anúncio foi feito ao final da tarde em São Bento, quando António Costa recebeu na sua residência oficial um grupo de artistas plásticos, entre os quais Manuel João Vieira e José de Guimarães, e a carta que lhe era endereçada e em que protestavam contra a política estatal (ou a ausência dela) para a arte contemporânea nacional. Fê-lo na presença do ministro da Cultura e dos artistas, que saudaram a medida como “um princípio”, sem deixar de referir algumas das outras reivindicações.

Esta delegação de 20 artistas representou os mais de 200 nomes que já subscrevem a carta de protesto que foi divulgada terça-feira à imprensa e que foi entregue ao chefe de Governo emoldurada, com as páginas simbolicamente dispostas em forma de cruz sobre um fundo negro.

Esta carta entrou na sala pela mão de dois dos artistas, que usavam fatos protectores e óculos escuros e que permaneceram em silêncio e a suster em braços a versão emoldurada de 150x150cm durante os cerca de 25 minutos de comunicações do primeiro-ministro e dos representantes dos signatários. “Falta uma base de apoio para a arte”, brincou o artista Pedro Proença depois de, num intróito bem-humorado, o primeiro-ministro ter cumprimentado Manuel João Vieira com um “presidente Vieira, tudo bem?”, aludindo às candidaturas do músico e artista à Presidência da República em 2011 e 2016.

Depois dessas saudações, e na presença do ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, que não fez quaisquer declarações, os artistas voltaram a frisar a importância de uma política de aquisições, do regresso de benefícios fiscais como os que permitiam que só fossem tributados 50% dos seus rendimentos e a existência de uma colecção e museu para a arte contemporânea portuguesa. “No tempo da Renascença os príncipes e os mecenas visitavam os ateliers dos artistas e agora invertem-se as situações e são os artistas que visitam os palácios dos governantes”, resumiu José de Guimarães antes de Miguel Rondon mostrar o extracto da sua conta bancária para mostrar que teve de pedir dinheiro emprestado para pagar a renda.

Em resposta, António Costa considerou o timing da carta “oportuno”, em vésperas da entrega da proposta para o próximo Orçamento do Estado, e explicou que o ministro da Cultura, “no âmbito do reforço progressivo” do “orçamento limitado” para o sector, vai “criar um novo programa para os próximos dez anos de aquisição anual por parte do Estado de arte contemporânea” portuguesa, esperando que o valor inicial (300 mil euros em 2019) possa vir a aumentar gradualmente. E pediu a colaboração dos artistas plásticos para encontrar “uma forma clara, transparente” de constituir júris e comissões responsáveis por essas aquisições. É essencial “não somar aos protestos do cinema e das companhias de teatro os dos artistas plásticos”, disse, referindo-se a duas das áreas de maior contestação no sector da cultura durante esta legislatura e nas quais foi chamado a intervir.

Os artistas responderam à medida com mais perguntas sobre as suas reivindicações, das alterações à Lei do Mecenato à reorientação da Direcção-Geral das Artes (DGArtes), que consideram estar esmagadoramente dedicada às artes performativas.

O anúncio não foi aberto a perguntas dos jornalistas e, por isso, não ficou claro se este anúncio foi uma resposta rápida à carta de protesto do sector ou se a medida estava já prevista. Manuel João Vieira diria depois ao PÚBLICO: “Se foi uma reacção à nossa carta já é um bom resultado que foi conseguido. Estamos a tentar que esse fundo seja distribuído pelos diversos organismos do Estado, para não sobrecarregar apenas o Ministério da Cultura que já tem uma DGArtes com encargo das artes colectivas.”

A carta aberta, subscrita por alguns dos mais importantes nomes das artes plásticas em actividade em Portugal, diagnostica que a crise dos últimos anos “destruiu” o mercado da arte e causou a perda de “uma geração de artistas”, apontando o dedo ao Estado – “alheou-se das suas responsabilidades” – e reivindicando precisamente a criação de um fundo estatal para aquisições e de uma agência para a arte contemporânea independente da DGArtes. O novo programa deu “alguma esperança” aos artistas como Pedro Proença, que sublinha, porém, que ficaram sem resposta alguns dos problemas estruturais que a carta enumera.

Na residência oficial do primeiro-ministro estiveram alguns dos seus signatários, como Cristina Ataíde, Sofia Pidwell, Alexandre Conefrey, Rui Vasconcelos , Sara&André, Pedro Portugal , Vítor Pomar, Francisco Pinheiro ou Luís Silveirinha. Entre os que assinam esta carta estão autores de algumas das obras que agora estão expostas na residência oficial de António Costa, vindas da Colecção António Cachola e do desejo do primeiro-ministro em ter arte contemporânea portuguesa onde trabalha, fala ao país ou recebe convidados. António Costa referiu precisamente o programa Arte em São Bento, bem como as decisões do Governo de não alienar a Colecção Miró e de manter a colecção BES Arte com o Estado numa introdução em que quis mostrar que “a reconstrução do país é um trabalho exigente” depois de dez anos “muito devastadores em várias áreas”.

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