Quanto custam as alterações climáticas? Uma pergunta que valeu um Nobel
Prémio Nobel deste ano é entregue a dois economistas que se dedicaram a encontrar a forma de analisar e resolver alguns dos principais problemas de longo prazo que a humanidade enfrenta.
Invariavelmente, ano após ano, tanto Paul Romer como William Nordhaus surgiam bem colocados nas listas não oficiais de candidatos a conquistarem o Prémio Nobel da Economia. Este ano isso acontecia outra vez, mas nunca se colocava a hipótese de vencerem os dois no mesmo ano. Paul Romer aparecia sempre associado a nomes como Robert Barro ou Philippe Aghion e Nordhaus surgia em conjunto com Martin Weitzman.
Esta segunda-feira, a Academia Real das Ciências da Suécia decidiu ser previsível na escolha para prémio Nobel de dois dos mais conceituados economistas mundiais, mas surpreendeu ao premiá-los em conjunto. A explicação: o que os une é a ideia de que é possível, com políticas públicas inteligentes, resolver alguns dos principais problemas de longo prazo que a humanidade enfrenta. “Eles pensaram em problemas globais e de longo prazo”, explicou um dos membros do painel que escolheu Paul Romer e William Nordhaus como os vencedores de 2018 do prémio que, oficialmente, se denomina Prémio do Banco da Suécia para as Ciências Económicas em Memória de Alfred Nobel.
O problema a que William Nordhaus, professor na Universidade de Yale, se dedicou desde muito cedo foi o das alterações climáticas. O economista norte-americano de 77 anos pegou no tema em 1972, quando este ainda estava longe de ser conhecido do grande público, e não deixa de ser simbólico que acabe agora por receber a maior distinção possível pelo seu trabalho precisamente um dia depois da publicação do relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas que subiu o tom de urgência sobre esta matéria e que apela a que os governos consigam limitar o aumento da temperatura global a 1,5 graus Celsius em relação aos valores pré-industriais.
William Nordhaus – que para muitos é também conhecido como co-autor (a partir de 1985) do manual “Economia” com o também Nobel Paul Samuelson – criou os primeiros modelos que permitiram aos economistas analisar os custos associados às alterações climáticas. E, com base nesses modelos, foi dos primeiros a defender a ideia de que a melhor forma de regular as emissões de carbono era calcular o custo dessas emissões e depois fazer os poluidores (empresas ou Estados) pagar impostos relativos a esse valor.
O problema, afirmou recentemente o economista, é que actualmente aquilo que os poluidores pagam é “virtualmente zero”. “Se o preço fosse mais alto, as pessoas teriam outras escolhas, como as energias renováveis”, disse.
Para Paul Romer, professor na Stern Business School da Universidade de Nova Iorque, a questão de longo prazo a que se dedicou foi a de perceber de que forma é que é possível estimular um crescimento económico sustentável através da criação de novas tecnologias. A inovação sempre foi vista por todos os economistas como uma coisa positiva para o crescimento, mas Romer esteve entre aqueles que se recusaram a ver a inovação como um factor exógeno, completamente impossível de controlar.
E ao tentar compreender como é que a economia acelerou tanto a partir da Revolução Industrial, destacou-se como defensor da ideia de que os Estados podem estimular a inovação, seja através do financiamento directo de investigação científica, que depois é usada por todos, seja através da aplicação de regras para as patentes que encontram o equilíbrio certo entre o estímulo à inovação e a partilha de conhecimento.
Sérgio Rebelo, economista português radicado nos Estados Unidos, teve Paul Romer como um dos supervisores do seu doutoramento e classifica o agora prémio Nobel como “uma pessoa fora do vulgar que sempre pensou de forma diferente”. “Dedicou-se ao estudo do crescimento económico e do progresso tecnológico numa altura em que o tema parecia esgotado e escreveu um número muito pequeno de artigos que tiveram uma grande influência”, afirma em declarações ao PÚBLICO.
Sérgio Rebelo destaca ainda a vontade de Paul Romer de passar à prática as suas ideias, abandonando temporariamente a sua carreira académica, fosse para “tentar mudar o ensino através do uso de software”, fosse para “criar ‘charter cities’ que permitissem experimentar novas formas de organização promotoras do desenvolvimento económico”.
Recentemente, Paul Romer teve o seu principal desafio na passagem à prática da teoria, quando ocupou o cargo de economista-chefe do Banco Mundial. No entanto, a experiência não foi positiva, tendo abandonado a organização em Janeiro deste ano, ao fim de apenas 15 meses no cargo em que os conflitos com os técnicos do Banco Mundial foram permanentes. Romer não gostava de alguns dos métodos usados e a gota de água que forçou a saída foi quando decidiu defender publicamente que a descida do Chile nos rankings “Doing Business” do Banco Mundial durante os governos de esquerda liderados por Michelle Bachelet se deveu essencialmente a um enviesamento político da organização.
O economista norte-americano não parece contudo perdido o seu optimismo em relação à possibilidade de passar à prática as políticas recomendadas pela ciência económica. Nas suas primeiras declarações a seguir a receber o Nobel, ao falar das alterações climáticas, o tema preferido de William Nordhaus, mostrou confiança de uma viragem é possível: “Os humanos são capazes de feitos espantosos, se dedicarmos as nossas mentes a isso”.