Já lá vão três álbuns a solo: Clave Bantu, 2011, Movimento, 2013, Insular, 2015. Todos corresponderam ao período de dez anos em que Aline Frazão esteve ausente de Luanda. Há ano e meio regressou à sua cidade e isso povoa Dentro da Chuva. Pode dizer-se que as marcas identitárias da sua música, a forma como foi incorporando aromas do semba angolano, a fluidez da bossa brasileira ou a melancolia da morna cabo-verdiana, para além da sensibilidade jazzística, continuam presentes.
Mas depois da aventura Insular, o disco onde desarrumou o seu universo sonoro, volta outra, com uma gestão segura do tempo, dos silêncios e do espaço, expondo sensibilidade e convicção, sem deixar de ser ela própria. Como se o reencontro com Luanda tivesse representado uma recomposição de si própria ao nível da biografia (Areal de Cabo Ledo ou Manifesto), do seu papel enquanto mulher (Sumaúma), da viajante que se descobre inteira em Luanda (Um corpo sobre o mapa) e do seu papel enquanto cantora, compositora e letrista.
Nunca em nenhum dos anteriores discos a linguagem poética fora tão clara e precisa. E depois existe essa canção central, Kapiapia, palavras vigorosas de Ruy Duarte de Carvalho, e o som do violão, espartano e concreto, abrindo espaço para a voz firme, num todo elegante, misto de dignidade e intensidade. Tudo inspirado numa tradição cantautora, apenas palavras, voz e violão, mesmo se em algumas canções há outros elementos que povoam o espaço sonoro.
Daí alguns convidados brasileiros, como o violoncelista Jaques Morelenbaum, a cantora Luedji Luna e o músico Gabriel Muzak, que além de ter gravado o misturado o disco, co-produz duas canções e toca guitarra numa delas, para além do português João Pires, com quem partilha a autoria de uma canção. Mas o esqueleto é ela, a voz, o violão, o minimalismo estrutural e a libertação de uma poesia distendida, mergulhada num espaço e tempo muito próprios, capaz de nos embalar, mas ao mesmo tempo despertando-nos para o mundo em redor. Excelente.