Soon-Yi fala por fim para defender inocência de Woody Allen
“O que aconteceu ao Woody é tão perturbador, tão injusto. Mia Farrow aproveitou-se do movimento #MeToo e exibiu Dylan como vítima”, diz a mulher do realizador, filha adoptiva de Mia Farrow, à New York Magazine.
Era uma das personagens principais e, também, a voz que continuava por ouvir. É alguém que conhece intimamente todos os envolvidos, os acusadores e os acusados. Alguém que se mantinha na sombra, silenciosa, misteriosa. Até agora. Soon-Yi Previn, casada há 20 anos com Woody Allen, filha adoptiva de Mia Farrow, ex-companheira de Allen, e do compositor André Previn, falou finalmente. Falou sobre a sua vida, sobre a sua relação com Mia Farrow, sobre a história do relacionamento com o marido. Falou, claro, sobre as alegações de abuso sexual a Dylan Farrow que sobre ele pendem há duas décadas e que ganharam novos ecos com o movimento #MeToo. Num extenso perfil publicado este domingo pela New York Magazine, Soon-Yi Previn, de 47 anos, explica por que decidiu falar agora: “O que aconteceu ao Woody é tão perturbador, tão injusto. [Mia] aproveitou-se do movimento #MeToo e exibiu Dylan como vítima.” Soon-Yi acredita que a acusação feita ao marido é resultado da manipulação exercida por Mia Farrow sobre Dylan.
Assinada por Daphne Merkin, amiga do realizador há quatro décadas, a reportagem não oferece novos factos sobre o que terá ocorrido a 4 de Agosto de 1992, o dia em que Dylan, então com sete anos, terá alegadamente sido molestada pelo pai adoptivo na casa de Mia Farrow. Nessa altura, toda a família vivia a tempestade desencadeada pela descoberta, por parte de Mia, meses antes, da relação que Woody e Soon-Yi mantinham em segredo. O relacionamento entre o realizador quinquagenário e a filha de 21 anos da sua companheira provocou consternação geral – pelo parentesco que se assumia ligar os dois e pela diferença de idades –, que cresceu quando se tornou conhecida a acusação de abuso sexual. Soon-Yi recorda que Woody Allen e Mia Farrow viveram em casas separadas durante todo o tempo em que foram um casal e defende que nunca viu nele uma figura paternal. Pai já tinha, reafirma. “Era André Previn. Além disso, a Mia nunca casou com o Woody, e nunca viveram juntos. Ele era, muito simplesmente, o namorado da minha mãe. Era como que uma entidade à parte.”
O que sobressai no perfil agora publicado, ecoando o testemunho do irmão Moses Farrow, que quebrou o silêncio em Maio, defendendo Woody Allen e acusando Mia Farrow, de quem se afastou na idade adulta (tem hoje 40 anos), de ser uma mãe autoritária, manipuladora e abusiva, é o retrato que Soon-Yi faz também da mãe adoptiva. “Ela distingue-se em tudo aquilo em que mostra interesse. É uma fotógrafa extraordinária e boa a pintar e tricotar. Era muito, muito criativa”, descreve. “É uma pena. Há coisas para admirar nela.” É uma pena, entenda-se, porque Soon-Yi afirma que, “por mais difícil que seja de imaginar”, não retém qualquer memória agradável dos seus anos com Mia Farrow, que acusa, por exemplo, de a ter humilhado pelas suas dificuldades de aprendizagem nos primeiros anos de escola, e de a ter disciplinado com bofetadas e agressões com escovas de cabelo. Conta que detestou Woody Allen quando este lhe foi apresentado, tinha ela dez anos, como namorado da mãe. “Odiava-o porque ele estava com a minha mãe, e eu não compreendia como é que alguém podia estar com uma pessoa tão má. Pensei que ele seria parecido [com ela]”, conta à New York Magazine.
"A Mia nunca foi afável comigo, nunca foi cortês"
Reconhecendo que a revelação da relação com Woody Allen, descoberta através de uma série de fotografias de Soon-Yi nua em casa do realizador, representou para Mia Farrow uma “gigantesca traição” e “um choque terrível”, reflecte: “A Mia nunca foi afável comigo, nunca foi cortês. E aqui estava alguém a manifestar afecto por mim e a ser simpático para mim, portanto, claro que fiquei radiante. Seria uma pateta e uma idiota, uma deficiente mental, se ficasse com a Mia”, diz, deixando para o fim, propositadamente, uma expressão que, diz, a mãe utilizava de forma recorrente para a rebaixar.
A publicação da reportagem, resultado de vários encontros na casa do casal em Nova Iorque, provocou uma reacção imediata. Dylan Farrow emitiu um comunicado algumas horas depois. “Graças à minha mãe, cresci num lar maravilhoso”, escreve, acrescentando: “Tenho uma mensagem para os media e os aliados de Wood Allen: ninguém está a ‘exibir-me como uma vítima’ – continuo a ser uma mulher adulta a fazer uma acusação credível e inalterada há duas décadas, baseada em provas”. Num comunicado conjunto, vários dos seus irmãos – Matthew Previn, Sascha Previn, Fletcher Previn, Daisy Previn, Ronan Farrow, Isaiah Farrow e Quincy Farrow – escrevem: “Rejeitamos qualquer tentativa de desviar as atenções da alegação da Dylan através da difamação da nossa mãe.”
De um lado, o relato de Soon-Yi Previn e de Moses Previn e as histórias que relatam de abusos sofridos às mãos de Mia Farrow. Do outro, os irmãos que asseguram nunca terem testemunhado em casa “nada mais do que tratamento compassivo”. De um lado, Mia e Dylan Farrow e a denúncia dos abusos sexuais alegadamente praticados por Woody Allen. Do outro, Soon-Yi e Moses defendendo que tal é resultado do carácter manipulador de Mia Farrow. No centro de tudo, Woody Allen. “Sou um pária”, diz na reportagem agora publicada. “As pessoas pensam que sou o pai da Soon-Yi, que violei e casei com a minha filha menor e deficiente mental.”