Governo visita Guiné-Bissau para conhecer acção contra mutilação genital feminina

Com a missão à Guiné-Bissau, secretária de Estado da Igualdade espera compreender dificuldades e estratégias “mais adequadas na manutenção desta intervenção” no terreno. Responsável reconhece que “não podem ser intervenções pontuais”, mas sim “duradouras”.

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Crianças em Bissau Paulo Pimenta

Duas secretárias de Estado partem nesta terça-feira em missão para a Guiné-Bissau com o objectivo de avaliar o impacto dos projectos no combate à Mutilação Genital Feminina (MGF), alguns dos quais apoiados por Portugal.

“Vamos, no fundo, conhecer in loco o que está a ser feito e (...) o trabalho que está a ser desenvolvido por organizações na Guiné-Bissau, no sentido de prevenir, combater e promover a erradicação” da MGF, disse, em declarações à Lusa, via telefone, a secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro, que integra a missão de quatro dias, juntamente com a secretária de Estado da Saúde, Rosa Valente de Matos.

A MGF — prática que consiste na retirada total ou parcial de partes genitais, com consequências físicas, psicológicas e sexuais graves, podendo até causar a morte — afecta 200 milhões de mulheres e meninas em mais de 50 países, de origem (sobretudo africanos) e de acolhimento.

Estima-se que em Portugal vivam 6.500 mulheres excisadas, mas, de acordo com os últimos dados, coligidos pelo PÚBLICO há dias, apenas 265 foram sinalizadas nos últimos quatro anos, desde que a Plataforma de Dados da Saúde passou a integrar um campo específico de recolha de informação sobre estas situações.

Com a missão à Guiné-Bissau, Rosa Monteiro espera compreender melhor “as dificuldades e que estratégias serão as mais adequadas na manutenção desta intervenção” no terreno.

Sendo certo que, defendeu a responsável, “não podem ser intervenções pontuais, têm de ser intervenções duradouras”.

Durante quatro dias, as duas governantes vão ter reuniões oficiais com as congéneres guineenses e com outras entidades oficiais, mas é nos encontros com a sociedade civil e as organizações que trabalham no terreno que Rosa Monteiro espera ter uma retrato abrangente “da complexidade” que envolve a MGF, que afecta metade das mulheres na Guiné-Bissau, único país de língua portuguesa que é listado nos documentos internacionais sobre a prática.

Trabalho conjunto

Um dos projectos que vão visitar é financiado pelo Governo português: trata-se do “Meninas e Mulheres — Educação, Saúde, Direitos e Igualdade”, uma parceria entre a associação portuguesa P&D Factor e o guineense Comité Nacional para o Abandono de Práticas Tradicionais Nefastas à Saúde da Mulher e da Criança.

“Conto estar com algumas líderes políticas [guineenses] para discutir problemas mais amplos das questões da igualdade entre mulheres e homens”, adiantou Rosa Monteiro, recordando que está em discussão pública uma eventual “lei da quota” na Guiné-Bissau.

Sobre a MGF, Rosa Monteiro salientou a necessidade do “trabalho conjunto” e da transversalização do combate à prática, que é crime público tanto em Portugal, como na Guiné-Bissau.

Em Portugal, a MGF deixou de ser objecto de um plano específico, pois considerou-se que era mais adequado, seguindo a linha da Convenção de Istambul, “criar uma peça única que desse visibilidade e robustez a todas as áreas e a todas as formas de violência [contra mulheres], considerando que não havia umas menores do que outras”.

O anterior “plano micro, que era visto até com algum exotismo”, deu lugar a “uma estratégia conjunta e integrada” e, em breve, adiantou, será anunciado um protocolo relacionado com as Administrações Regionais de Saúde (ARS).

As práticas tradicionais nefastas — nas quais se inclui a MGF — foram integradas no Plano de Acção para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e à Violência Doméstica, um dos três que fazem parte da Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não-Discriminação (2018-2030).

“Temos é de fazer um trabalho mais intenso e mais estruturado nas comunidades e nos bairros”, admitiu a secretária de Estado, justificando uma parceria com o Programa Escolhas, do Alto Comissariado para as Migrações.

“É um caminho que tem de se fazer multidimensional, multi-sectorial, mas essencialmente de grande proximidade”, concretizou, considerando que não bastam “acções de sensibilização e campanhas”, sendo necessário “trabalho de terreno”, que “tem de estar mais ligado, mais articulado, mais integrado”.