O método do engenheiro Morandi criou pontes que dão problemas
Outras obras do mesmo autor, em Itália e noutros países, revelaram problemas associados à forma como foram construídas.
Riccardo Morandi, o engenheiro que projectou o viaduto que se desmoronou em Génova, tem uma vasta obra em Itália e espalhada pelo mundo, em que aplicou técnicas que, na primeira parte do século XX, eram inovadoras, no uso do betão armado. Mas algumas das suas obras mais icónicas, como a Ponte General Rafael Urdaneta, na Venezuela, ou a Ponte Wadi el Kuf, na Líbia, por exemplo, já tiveram problemas sérios, e há muitas mais espalhadas por Itália.
O engenheiro civil desenvolveu e patenteou um método próprio para construir grandes estruturas de betão armado, como pontes e viadutos. Concebeu pontes estaiadas em várias partes do mundo, ou seja pontes suspensas por cabos de um ou vários mastros, dos quais partem esteios de sustentação para o tabuleiro. Mas as pontes de Morandi caracterizam-se por terem poucos desses cabos, e frequentemente estes são feitos de betão armado em vez de serem de aço, como é mais comum.
“A tecnologia inventada por Riccardo Morandi, que ele usou, revelou falhas. Tinha um sistema de cabos de aço tensos no interior de uma bainha e depois um sistema para preencher essa bainha e impedir a corrosão. Mas o sistema não funcionou como ele pensava, e acelerou o processo de degradação”, explicou ao jornal La Repubblica Antonio Brencich, professor de Engenharia na Universidade de Génova.
Já há em 2016 Brencich se alarmava com os problemas do viaduto de Génova, num artigo publicado no site Ingegneri.info. Qualificava a obra de Morandi como “um erro de engenharia”, dizendo que os custos de manutenção ultrapassariam em breve os da construção da ponte.
Este tipo de construção é mais caro e dá mais problemas. Há já vários anos que o viaduto que agora caiu parcialmente – e o resto deverá ter de ser demolido – era considerado uma ponte doente, constantemente submetida a trabalhos de manutenção, dizem vários media italianos.
Muitas das obras assinadas por Morandi começaram a apresentar alguns problemas pouco tempo depois de serem construídas, necessitando de manutenção e reparações frequentes – algo sublinhado por Brenchich.
Aliás, a Ponte General Rafael Urdaneta, na Venezuela, no lago Maracaíbo, que se estende por cerca de 8,5 km, é muito parecida com a de Génova, e foi terminada seis anos antes, em 1962, disse ao jornal The Guardian Ian Firth, ex-presidente do Instituto de Engenheiros Estruturais. “Os torreões em 'A' que suportam o tabuleiro criam um conjunto que não é comum nas pontes estaiadas, que cria um potencial de desequilíbrio”, afirmou.
Neste momento, ouvem-se muitas críticas a Morandi, que, no entanto, é um nome respeitado da engenharia. “É uma figura muito importante, um engenheiro de referência. Seria uma pena reduzir o seu trabalho à catástrofe de Génova”, disse ao Le Monde Marc Mimram, engenheiro e arquitecto especialista na construção de pontes e passagens desniveladas.
Mas as críticas ao método de Morandi não são de agora, acompanham-no já do tempo em que espalhava as suas obras pelo mundo. E algumas das obras internacionais tiveram também problemas, como a ponte venezuelana no lago Maracaíbo: partes da estrutura ruíram em 1964, quando o petroleiro Esso Maracaibo colidiu com ela, provocando sete mortes.
Outra obra de Morandi, a ponte sobre o rio Wadi al-Kuf, a 20 quilómetros de Baida, no Leste da Líbia, foi encerrada em 2017, devido a preocupações com a sua segurança. Embora tenha apenas 282 metros de comprimento, é a segunda ponte mais alta de África, com 160 metros de altura. Foi construída entre 1965 e 1972.
Mas é verdade que o tipo de utilização destas estruturas se modificou muito ao longo das décadas – um factor sublinhado por vários especialistas. O tráfego automóvel, em alguns casos, tornou-se muito mais intenso, e passou a incluir um enorme fluxo de camiões, tal como aconteceu em Génova.