Estudo revela que maioria dos círculos eleitorais está contra o "Brexit"
Mais de cem círculos eleitorais que deram maiorias ao "Brexit" no referendo apresentam agora preferência em permanecer na UE, aumentando a pressão sobre os deputados que os representam.
Os britânicos que apoiaram a saída do Reino Unido da União Europeia no referendo de 2016 parecem estar a mudar de ideias à medida que as negociações com Bruxelas se vão arrastando. Pelo menos é o que mostram dados de um estudo que conclui que vários círculos eleitorais que registaram uma maioria de votos a favor do “Brexit” cairiam hoje para o outro lado.
Uma análise publicada este domingo pelo Observer mostra que dos 632 círculos eleitorais britânicos, 112 que tinham maiorias a favor da saída estão hoje contra o “Brexit”, o que, somando aos 229 que já tinham rejeitado a separação, faz com que na Câmara dos Comuns exista uma maioria virtual contra a saída do Reino Unido da UE.
O estudo baseou-se em sondagens da empresa YouGov, que envolveram mais de 15 mil inquiridos, antes e depois de a primeira-ministra Theresa May ter apresentado o plano sobre a relação futura entre o Reino Unido e a UE, a 6 de Julho. As respostas foram depois cruzadas com informações dos censos para mostrar as variações das respostas em cada círculo eleitoral.
Para além de sugerir uma mudança generalizada na opinião dos britânicos, a análise indica que essa variação é mais pronunciada no Norte de Inglaterra e no País de Gales, áreas que são bastiões eleitorais do Labour, mas que apoiaram o “Brexit” em 2016.
A divulgação do estudo acontece numa altura em que o plano de May – conhecido como “plano Chequers” por ter sido delineado na residência de campo oficial da primeira-ministra – se prepara para ser apreciado pelo Parlamento. O sinal de que eleitores em círculos que outrora viam o “Brexit” de forma favorável e entretanto parecem mudar de ideias terá um peso para os representantes de cada um desses círculos (o Reino Unido tem um sistema eleitoral uninominal, ou seja, cada deputado é eleito por um círculo determinado).
Em solo britânico, os planos de May enfrentam críticas de vários lados. A ala radical do Partido Conservador, defensora de uma ruptura profunda com Bruxelas após a saída (o chamado “hard Brexit”), está descontente por considerar que o "plano Chequers" prevê a manutenção de demasiadas regras comunitárias no futuro – foi o desacordo sobre este aspecto que levou às demissões de dois dos ministros mais relevantes do Executivo, Boris Johnson e David Davis.
Do lado oposto estão aqueles que não se conformam com a saída britânica e alimentam cada vez mais esperanças de que possa ser viável a marcação de um novo referendo para reverter todo o processo. Um dos rostos desta campanha é o líder dos Liberais, Vincent Cable, que ainda este fim-de-semana deixou um apelo para que haja uma cooperação que “atravesse linhas partidárias”, num claro desafio aos trabalhistas.
O estudo publicado pelo Observer, publicação que pertence ao grupo editorial do diário The Guardian, também indica que uma das mudanças mais pronunciadas se regista nos círculos do País de Gales, o que significa que existem agora maiorias contra o “Brexit” tanto em Gales como na Escócia, aumentando a pressão sobre a integridade do Reino Unido.
Os eleitores de Boris Johnson
Entre as regiões eleitorais que passaram a ter maiorias a favor da permanência estão várias onde foram eleitos alguns dos deputados mais proeminentes a favor do “Brexit”. Um dos exemplos é o círculo de Uxbridge e South Ruislip, em Londres, onde foi eleito Boris Johnson, que tem agora 51,4% de apoiantes da continuação na UE.
Os defensores do “Remain” acreditam que os novos dados podem levar os deputados mais reticentes a forçar um novo referendo, tendo em consideração a mudança de opinião dos seus eleitores. “Esta investigação inédita mostra que o ‘Brexit’ não é inevitável”, disse ao Observer Eloise Todd, a directora-executiva do Best for Britain, um grupo de apoiantes da permanência na UE, uma das organizações que encomendou o estudo. “As pessoas em todo o Reino Unido testemunharam com incredulidade dois anos de incerteza e pensam hoje de maneira diferente”, acrescentou.
O director da Hope not Hate, Nick Lowles, outra associação que pediu o estudo, acredita que os dados põem pressão sobre o Partido Trabalhista. “A velocidade de mudança parece estar a acelerar à medida que a realidade do significado do ‘Brexit’ se torna mais visível e que os receios perante o falhanço de um acordo crescem, especialmente para os eleitores do Labour que inicialmente acreditavam que sair da UE iria melhorar as suas perspectivas económicas.”