Nunca antes foi tão urgente repensar o nosso modo de vivência neste planeta e a nossa relação com o ambiente, que é o nosso suporte de vida — o de todos os seres vivos e das gerações vindouras.
Torna-se assim cada vez mais pertinente descortinar quais as principais forças motrizes por detrás das alterações climáticas e adoptar uma abordagem pragmática e despolitizada, que faça efectivamente diferença. Será caso para dizer que, se a casa estiver a arder, não vamos fechar a torneira que deixamos aberta; vamos, sim, procurar apagar o incêndio.
O discurso das alterações climáticas tem sido dominado ao longo de décadas pelo problema do uso de combustíveis fósseis, cada vez mais visível, cada vez mais badalado, desde que Al Gore o popularizou no documentário Verdade Inconveniente. E, de facto, essa é uma problemática que tem de ser abordada. Construímos o nosso modelo civilizacional na base da suposição de que o petróleo duraria indefinidamente e numa altura em que não estávamos plenamente conscientes do impacto sistémico do seu uso, não só ecológico, mas também na saúde humana.
E o que pode uma só pessoa fazer para combater este problema? Comprar um carro eléctrico, ou melhor, andar de bicicleta? Que outras soluções existem para além destas?
Num debate saturado com o tópico dos combustíveis fósseis, tem sido deixado de fora do espectro de discussão ambientalista um outro problema, o que porventura mais contribui para as alterações climáticas que enfrentamos, negligenciado na sua importância. Fala-se da indústria agropecuária, cujo impacto no ecossistema suplanta todas as outras. No entanto, parece que ninguém repara nas vacas a pastar. Estima-se que a produção de animais seja responsável pela emissão global de cerca de 14,5% dos gases poluentes de estufa, ao passo que todos os transportes no mundo são responsáveis por 13% dessa emissão global, comparativamente. Esta é a estimativa mais conservadora.
Em Portugal, a Quercus, reconhecida entidade ambientalista, constatou que a agricultura, inclusive a agropecuária, utiliza 80% dos recursos hídricos de Portugal. Estatísticas semelhantes encontram-se para outros países do mundo, onde a produção de animais em regime intensivo é uma das principais responsáveis pelo desgaste dos recursos hídricos e, no entanto, o nosso foco tem recaído essencialmente sobre os restantes 20%, uma percentagem marginal, em boa parte correspondendo ao uso doméstico.
Todavia, as campanhas de poupança de água e preservação dos recursos hídricos focam-se quase exclusivamente no uso doméstico, sem fazer qualquer referência ao impacto das nossas escolhas como consumidores. Se tivermos que esvaziar uma banheira cheia de água, não fará mais sentido tirarmos a tampa em vez de usarmos uma colher de chá?
Tal como sucede com o uso dos combustíveis fósseis, podemos, na nossa esfera individual, agir de forma relevante, com impacto político, introduzindo mudanças no nosso paradigma alimentar, começando pela redução do nosso consumo de carne e de outra proteína animal, privilegiando o consumo de legumes ou leguminosas. Sabemos que a produção de um único quilograma de carne de vaca, por exemplo, requer um dispêndio de cerca de 16.700 litros de água, ao passo que a produção de um quilograma de leguminosas como o feijão de soja requer apenas cerca de 2500 litros. Em geral, a produção de qualquer alimento de origem vegetal tem uma pegada ecológica significativamente inferior à da produção de alimentos de origem animal.
Munidos com esta informação, podemos tomar decisões simples enquanto consumidores, com consequências imediatas, que qualquer um de nós pode pôr em prática. Podemos ser agentes de mudança, através dos nossos pratos.