“Sim é sim”: consentimento é peça chave na nova lei espanhola sobre violação

As opiniões no Parlamento dividiram-se, com a porta-voz do Partido Popular (PP), Carmen Dueñas, a expressar “dúvidas do ponto de vista jurídico”.

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Manifestação contra a violação sexual em Huelva, Espanha LUSA/Julian Perez

O primeiro-ministro espanhol Pedro Sánchez defendeu no Parlamento, nesta terça-feira, uma nova lei sobre consentimento sexual, de forma a eliminar quaisquer ambiguidades nos casos de violação.

O líder dos socialistas explicou que, de acordo com a nova lei, será considerada violação sempre que existe relação sexual sem consentimento explícito. Durante o debate parlamentar desta terça-feira, no qual Sánchez apresentou um conjunto de medidas económicas e políticas para o país, foi também abordada a questão da violência de género. O chefe do Executivo espanhol mostrou-se a favor de uma reforma do código penal, de forma a clarificar quais as condicionantes nos crimes de agressão sexual. O objectivo passa ainda por garantir que um crime de violação sexual não seja julgado de acordo com a interpretação pessoal dos juízes. "Que fique claro: se [a vítima] disse não é não, e se não disse sim então é não", esclareceu Sánchez citado pelo diário espanhol El País

A proposta é apresentada meses depois de dezenas de cidades espanholas terem sido palco de protestos contra uma decisão judicial que condenou cinco homens (conhecidos como "La Manada") a nove anos de prisão - sentença da qual os acusados recorreram em tribunal - por abuso sexual, ilibando-os da acusação mais grave de violação de uma rapariga de 18 anos durante as festas de San Fermín, em Pamplona, em 2016. Durante o acto sexual (filmado por dois dos homens), a jovem permaneceu "passiva e em silêncio", segundo o relatório da polícia, o que levou os juízes a considerarem que o acto poderia ter sido consentido. Ainda no fim de Junho, o tribunal de Navarra concedeu liberdade condicional aos cinco membros do grupo.

A actual legislação espanhola considera que o crime de violação sexual (punível até 15 anos de prisão) envolve violência e intimidação, diferenciando a agressão do abuso sexual. Mas Sánchez considera que Espanha “deve ter as ruas livres de manadas” e mostrou-se empenhado em reforçar as normas jurídicas “até encurralar aqueles que encurralam”, escreve o diário espanhol El Confidencial

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O primeiro-ministro espanhol Pedro Sánchez e a vice-presidente do Governo Carmen Calvo antes do debate parlamentar em Madrid EPA/KIKO HUESCA

Foi Carmen Calvo, vice-presidente do Governo espanhol e à frente da pasta da Igualdade, quem apresentou a proposta pela primeira vez na semana passada. A lei sugere que “se uma mulher não disser expressamente sim, tudo o resto é não” - até mesmo o silêncio - e vem assegurar, de acordo com a vice-presidente, “a autonomia, liberdade e respeito das pessoas em conjunto com a sua sexualidade”. Caso entre em vigor, deixará de ser necessário provar em tribunal que houve violência ou que a vítima se encontrava numa situação vulnerável (inconsciente, incapacitada ou sob ameaça ou efeito de álcool ou drogas) para que o caso seja julgado como violação. Patricia Faraldo Cabana, professora de Direito na Universidade da Corunha que ajudou a esboçar a legislação, explicou ao diário britânico Guardian que a proposta passa a ter em conta não apenas o consentimento verbal mas também tácito, expresso através da linguagem corporal. “Pode ser considerada violação ainda que a vítima não resista”, acrescentou a especialista.

As opiniões no Parlamento dividiram-se, com a porta-voz do Partido Popular (PP), Carmen Dueñas, a expressar “dúvidas do ponto de vista jurídico”. O Podemos, pelo contrário, viu com bons olhos a iniciativa do Governo que vai ao encontro de algumas das próprias propostas deste partido, anunciadas pelo diário El Mundo, sobre a protecção da liberdade sexual e a erradicação deste tipo de violência, à qual acrescentam uma cláusula sobre intimidação sexual.

Alguns países europeus, como o Reino Unido e a Alemanha, apresentam legislação semelhante, aos quais se juntou a Suécia, onde a lei entrou em vigor no início do mês de Julho. O código penal sueco passou a contemplar o claro consentimento, verbal ou físico, durante o acto sexual, determinando que “na hora de avaliar a voluntariedade, ter-se-á em conta se esta foi expressa com palavras, feitos ou de alguma outra forma”, apesar de impor penas menores (a pena máxima por violação agravada é de dez anos de prisão). 

Quanto à igualdade de género, Pedro Sánchez mostrou-se orgulhoso pelo facto de o Executivo espanhol ser dominado por mulheres e garantiu que vai implementar medidas de combate à discriminação sexual (também ao nível profissional e familiar) e à violência contra mulheres, com especial atenção no que diz respeito à segurança e protecção das vítimas. 

Texto editado por Nicolau Ferreira

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