Mais de metade da população do Algarve tem excesso de peso
Apenas 24,7% da população algarvia respeita os padrões da dieta mediterrânica, conclui estudo da Universidade do Algarve
Como é que se ensina o que são proteínas a quem não distingue um carapau de uma sardinha? A pergunta, formulada pelo director do Programa Nacional para a Promoção Alimentar Saudável, Pedro Graça, serviu de mote para explicar, no Algarve, como se pode comer bem e barato. A receita está na escolha do “prato certo” que se pode confeccionar em cada época do ano, aproveitando a sazonalidade da produção alimentar. Para tentar recuperar os valores da dieta mediterrânica, a associação In Loco vai lançar uma campanha sobre o “prato certo”. O objectivo desta associação de desenvolvimento é ajudar a fazer as escolhas certas à mesa numa região onde há graves problemas de obesidade.
“Estamos a afastar-nos das nossas raizes alimentares”, diz a professora da Universidade do Algarve, Maria Palma Mateus, coordenadora de um estudo sobre os hábitos alimentares na região. “Apenas 24,7% da população algarvia respeita os padrões da dieta mediterrânica”, concluiu. E 57% é obesa ou tem excesso de peso.
O trabalho foi realizado junto de 384 agregados familiares, nos 16 concelhos da região, durante os meses de Agosto e Setembro do ano passado. O Algarve foi integrado, pela Direcção-Geral de Saúde (DGS), num projecto-piloto para avaliar o estado da (in)segurança alimentar com vista a criar um Observatório Regional de Segurança Alimentar.
Pedro Graça defendeu, durante a apresentação do documento, a necessidade de intensificar o ensino da literacia alimentar como ferramenta para uma estratégia de sobrevivência. “Fizeram-nos a cabeça para comer de forma igual ao longo de todo o ano, sem ter em conta a sazonalidade”, observou. A estratégia na arte de bem comer, explicou, consiste em saber aproveitar o que cada estação tem para oferecer: “Poupa-se dinheiro e ganha-se em qualidade”.
O presidente da In Loco, Artur Gregório, lembrou que a dieta mediterrânica (classificada de património imaterial da humanidade, pela UNESCO) foi durante séculos usada como “paradigma para lutar contra a carência”. Na actualidade, diz o estudo, ainda há uma grande preocupação com a eventual falta de alimentos. Dos inquiridos, 25,8% manifestou preocupação com o facto de os alimentos em casa poderem acabar antes que tivesse dinheiro suficiente para comprar mais. Nesta amostra, realizada no rescaldo da crise, reflecte-se também a sazonalidade laboral: 13% dos agregados familiares têm pelo menos um desempregado.
Das várias iniciativas a levar a cabo para alterar os hábitos alimentares em casa ou no restaurante, a In Loco, em parceria com a DGS, produziu um vídeo e um site com centena e meia de receitas baseadas na dieta mediterrânica. Uma das protagonistas do filme é Ana Custódio, de Vila do Bispo, com seis filhos. “A partir dos três anos, vão todos para a cozinha”, disse a entrevistada, comparando o espaço de confecção dos alimentos a um laboratório. O segredo das refeições, disse, está na forma de preparar os alimentos e nos ingredientes. “Mas quem é mais criativo não sou eu: é o meu filho mais velho, de 13 anos, e o pai”, enfatizou.
A investigadora da Ualg, Maria Palma Mateus, salientou a necessidade de dar continuidade ao trabalho de literacia alimentar que se desenvolve na região há cerca de um ano.