EUA fecham as fronteiras a vítimas de violência doméstica e de gangs
Departamento de Justiça muda a sua interpretação das leis de asilo: “Queixas de estrangeiros sobre violência doméstica ou violência de gangs por actores não governamentais não serão avaliadas.”
A partir desta semana, os EUA vão fechar as portas da sua fronteira a mulheres em fuga de violência doméstica e a adolescentes que temem ser mortos por gangs nos seus países de origem. A medida foi anunciada pelo chefe do Departamento de Justiça, Jeff Sessions, que diz estar a reverter “poderosos incentivos” à imigração aprovados pela Administração Obama.
Sessions reverteu uma decisão de 2016 do tribunal de recurso para os processos de imigração e asilo, um órgão que funciona fora do sistema judicial federal e que depende directamente do Departamento de Justiça.
Nessa decisão, o tribunal declarou que uma mulher salvadorenha que foi perseguida pelo marido durante dez anos, violada, atacada com ácido e pontapeada na barriga quando estava grávida tinha direito à concessão de asilo nos EUA.
De acordo com a interpretação da lei feita pela Administração Obama, o facto de a mulher se ter casado num país onde os costumes e a tradição tornam praticamente impossível o fim de uma relação abusiva dava-lhe o direito de ser incluída num grupo social particular – uma das cinco características previstas na lei internacional para a concessão de asilo para além da raça, religião, nacionalidade e opinião política.
Mas o attorney general nomeado pelo presidente Donald Trump veio agora impor aos juízes de imigração uma leitura diferente, numa decisão que abrange também as pessoas que fogem da violência dos gangs e que temem ser mortas se regressarem aos seus países de origem: “Em termos gerais, as queixas de estrangeiros sobre violência doméstica ou violência de gangs perpetradas por actores não governamentais não serão avaliadas para concessão de asilo.”
As vítimas de violência doméstica e de gangs eram tratadas como grupos sociais particulares, porque os EUA reconheciam que os governos de países como a Guatemala, El Salvador ou Honduras não têm capacidade nem vontade para as proteger – o que, por sua vez, era entendido como uma forma de violência governamental.
Nos últimos oito meses, a Casa Branca tomou várias decisões para limitar a entrada de estrangeiros no seu território, incluindo pessoas em fuga de violência e perseguições nos seus países.
A mais abrangente é a que impõe às agências de imigração uma política de tolerância zero nas fronteiras. Em vez de manter uma postura mais branda, através da abertura de processos administrativos (que também podem levar à deportação), a Administração Trump decidiu responder a todos os casos com processos criminais. Essa decisão, na prática, tem separado várias famílias, porque a lei norte-americana não permite que as crianças fiquem a aguardar o desfecho de processos de imigração numa cadeia, ao contrário do que acontece com os pais.
Para limitar ainda mais as entradas nos EUA e facilitar as deportações, o responsável pelo Departamento de Justiça tem vindo a usar um poder raramente usado pelos seus antecessores. Como responsável máximo pelos tribunais de imigração, Sessions pode impor a sua interpretação sobre leis pouco claras, como é o caso da definição de grupo social particular.
Desde Abril, Sessions tomou outras três decisões que vão limitar ainda mais a concessão de pedidos de asilo nos EUA: os juízes podem agora negar um pedido de asilo com base numa única audiência; não podem congelar nenhum processo, o que permitia que as pessoas consideradas inofensivas ficassem a viver nos EUA sem uma decisão final; e são obrigados a despachar pelo menos 700 pedidos de asilo por ano, o que pode fazer com que o tratamento desses processos seja mais apressado do que seria necessário.