Siza e Souto de Moura juntam-se a nova tentativa para classificar o Foco
Cerca de 70 pessoas formalizaram um pedido de classificação, para evitar que a instalação de um hospital privado altere um dos edifícios deste projecto do arquitecto Agostinho Ricca.
Cerca de 70 pessoas formalizaram um pedido de classificação do Parque Residencial da Boavista/Foco como Conjunto de Interesse Público (CIP) para evitar "o risco" de "obras profundas" na instalação de um hospital na obra do arquitecto Agostinho Ricca. Entre os subscritores estão os dois nomes maiores da arquitectura portuguesa, Souto de Moura e Álvaro Siza. A autarquia, em resposta ao PÚBLICO, disse concordar "com este pedido de classificação e está nesta matéria articulada com a Direcção Regional de Cultura do Norte (DRCN)."
"A aprovação do Pedido de Informação Prévia (PIP) para obras profundas naquele que é o equipamento de maior dimensão, destinando-o a unidade hospitalar privada, coloca em risco manifesto o equilíbrio programático e a unidade do conjunto", escreve-se no "Requerimento Inicial de Classificação", a que a Lusa teve esta segunda-feira acesso e que foi no início do mês apresentado na Direcção Regional de Cultura do Norte (DRCN).
No texto, o proponente, o arquitecto João Luís Marques, e mais 67 subscritores (entre os quais Álvaro Siza e Eduardo Souto de Moura, os dois arquitectos portugueses galardoados com o Prémio Pritzker) justificam o pedido com "a tomada de consciência do valor em causa e da vulnerabilidade a que está sujeita" a obra "idealizada por Agostinho Ricca no início da década de 1960", com João Serôdio e Magalhães Carneiro.
Alertando estar "em curso um processo de licenciamento" para um hospital, o requerimento explica que a intenção dos proponentes passa por "garantir a justa articulação dos espaços públicos e das cargas geradas pelos equipamentos existentes e pelas suas mudanças", a par da "valorização do legado arquitectónico e artístico".
O conjunto do Foco - que para além de igreja inclui cinema e hotel (ambos encerrados), galerias comerciais, escritórios e 450 fogos - é descrito como "testemunho ímpar de arquitectura e urbanismo modernos em Portugal". O projecto está "enriquecido por obras de artistas plásticos como Júlio Resende [um mural com mais de 90 metros de extensão], Zulmiro de Carvalho, José Rodrigues e João Charters de Almeida", acrescentam os subscritores.
Num processo de 141 páginas, os subscritores (entre eles os presidentes do Icomos/Portugal, da Ordem dos Arquitetos/Região Norte e da Fundação José Rodrigues) apelam "à salvaguarda e à divulgação" do património. "Apesar dos anteriores esforços pelo reconhecimento, este conjunto não foi oportunamente classificado e protegido pela Direção Geral do Património Cultural [DGPC]", observam.
Recorde-se que "ao pedido de classificação indeferido em 2006" somou-se outro, de 2010, no qual é referido que "os instrumentos municipais são os mais adequados à gestão do Parque Residencial". Contudo, os subscritores identificam "fragilidades" nos "instrumentos municipais" de salvaguarda do conjunto.
"Em Janeiro, a notícia de uma obra aprovada de intervenção profunda e descaracterizadora de um dos edifícios que integra o Parque Residencial [a inserção, numa fachada, de uma obra do artista plástico Vhils, que entretanto não avançou] denunciou a fragilidade dos instrumentos municipais indicados para a salvaguarda deste conjunto urbano, apesar de identificado na Carta de Património do Plano Diretor Municipal [PDM]", descrevem.
Contactada pelo PÚBLICO, a DRCN confirmou que, recebida a documentação, não foi ainda tomada decisão sobre a abertura, ou recusa, de novo processo de classificação. A página da Internet da DGPC, indica, de facto, "procedimento encerrado/arquivado -- sem protecção legal" como a "situação actual" do Parque Residencial. De acordo com a página, a "Câmara do Porto informou em 2012 não desenvolver procedimento de classificação como de Interesse muncipal, por considerar que a protecção do conjunto está salvaguardada através do regulamento do PDM".
O requerimento de classificação observa que "é o todo" do Foco "que faz dele uma obra singular", na qual o plano de um novo "centro cívico e comercial multifunções" foi "executado e permanece vivo, mostrando que as boas propostas modernas não foram meras utopias de sonhadores da cidade".
O processo inclui uma petição com 1905 assinaturas com vista à classificação do conjunto como Património de Interesse Municipal, mas o proponente esclarece ter concluído que a distinção como CIP "parece a categoria mais ajustada à natureza da obra".
Sendo classificado, o Foco "somar-se-á aos cinco CIP já classificados na cidade", nomeadamente a "avenida da Boavista, entre Pinheiro Manso e Marechal", "Passeio Marítimo e Avenida Montevideu" e os conjuntos da "Praça da Liberdade/Aliados/Praça General Humberto Delgado", da "rua de Álvares Cabral" e da "Foz Velha", assinalam.