De acordo com estatísticas recentes da Organização Mundial de Saúde, Portugal é o quinto país da Europa com mais crianças obesas — 25% das crianças e 32,3% dos adolescentes em Portugal têm excesso de peso. A obesidade frequentemente prolonga-se na idade adulta e estima-se que presentemente cerca de 57% da população tenha excesso de peso. As causas não são nenhum enigma e toda a gente as sabe de ladainha: sedentarismo, pouco exercício físico, excesso de gordura saturada e de açúcar na alimentação. A lista continua. Todos as conhecem, mas não é feito ainda o suficiente para as endereçar.
Vejamos o caso dos snacks de máquinas de venda automática nas escolas. Em 2012, a DGE – Direcção Geral de Educação definiu um conjunto de directivas a seguir pelos estabelecimentos de ensino público, indicando que alimentos são recomendáveis e quais não se devem vender nas escolas (ofício circular nrº 7/DGE/2012). No entanto, estas recomendações não são cumpridas. Numa reportagem do Diário de Notícias de 2016 constatou-se que diversos alimentos prejudiciais à saúde continuam à venda, não só em máquinas, mas também em bares — cachorros, pizzas, bebidas açucaradas, croissants, waffles, bolos — e tantas outras coisas que a petizada adora e que tão bem faz.
Recentemente, o governo português interveio nestas matérias, ao promulgar uma taxa extra sobre as bebidas açucaradas e ao declarar a proibição de doces nas máquinas de venda automática do SNS – Serviço Nacional de Saúde, assim como de outros alimentos prejudiciais nas cafetarias e bares. O que significa, é verdade, que as escolas não estão abrangidas por esta medida, apenas os hospitais ou centros de saúde, por exemplo. Tendo em conta que é ao SNS que vão parar muitas das crianças e adolescentes com diagnóstico de obesidade e diabetes, jovens cuja alimentação diária cai fora das preocupações do Estado, pode-se ao menos argumentar que pior do que chegaram não irão ficar, após a visita ao hospital, graças a esta medida.
A prevenção primária, essa quimera do investimento público, e persona non grata dos agentes económicos, que lucram com a maleita, é habitualmente relegada ao esquecimento. O facto das máquinas de venda automática continuarem a disponibilizar nas escolas junkfood a preços acessíveis, como refrigerantes ou batatas fritas, não parece ser motivo de alarme público, nem tampouco parece mobilizar seriamente o governo português ou as principais entidades de nutrição em Portugal para uma das principais ameaças à saúde das crianças portuguesas, que serão os futuros adultos. Jorge Ascensão, o presidente da Confederação Geral das Associações de Pais, refere numa entrevista que o problema "está mais ou menos controlado". Estará mesmo?
Por outro lado, quando vem à baila que se implementou um dia mensal de refeição vegetariana — uma refeição em 60 refeições que uma criança faz num mês — conforme sucedeu recentemente nos estabelecimentos de ensino pré-escolar e de 1º ciclo de ensino básico do concelho de Palmela, parece que se arma imediatamente um escândalo. A autarquia justificou a medida como pedagógica, referindo os benefícios de moderar o actual consumo excessivo de proteína animal e aumentar o consumo de vegetais entre os mais novos, o que não parece ter apaziguado os ânimos de muitos pais indignados, que apresentaram queixa contra o município, apesar da sua louvável iniciativa.
Estamos habituados à ingerência das instituições em inúmeros aspectos do nosso dia-a-dia, em prol da educação e dos benefícios a longo prazo que colhemos, como é o caso da Segurança Social, mas parece que a alimentação foge à regra. Precisamos por isso de mais autarquias com propostas e medidas ousadas, que tenham em consideração o melhor interesse das crianças e da sociedade.