“Caso Sócrates vai ser um fantasma que andará sempre a pairar”
Já não são só José Sócrates e Manuel Pinho a ensombrarem o congresso do PS. Os casos sucedem-se. Mário Lino, Paulo Campos e António Mendonça são mais alguns membros de um governo a que o PSD já chama "teia" e que podem vir a ser constituídos arguidos
O caso Sócrates já é mais do que o caso do ex-primeiro-ministro que foi detido em 2014, quase nas vésperas de um congresso do PS. A "teia" como o PSD passou a designar o caso, passou a incluir alguns ex-ministros do seu Governo e está a deixar o PS num grande embaraço. A menos de três semanas do congresso nacional, há socialistas que entendem que a direcção de António Costa já deveria ter arrumado o assunto há três anos, quando ocorreu a detenção de Sócrates, ou então há seis meses, quando foi feita a acusação. Embora também haja apoiantes de Costa com esta opinião, é um dos seus principais opositores que toma a palavra para fazer um aviso que é também uma crítica ao secretário-geral: “O caso Sócrates vai ser um fantasma que andará sempre a pairar”. E está a tornar-se cada vez mais denso.
A frase é de António Galamba, que integrou a direcção de António José Seguro. O socialista é um dos que defendem que o partido já deveria ter arrumado o assunto há muito tempo e não está certo de que o tema seja objecto de discussão na reunião magna dos socialistas, por considerar ”António Costa um especialista em passar por entre os pingos da chuva”. E acrescenta: “Não sei se há ambiente político e ou de liberdade de expressão para se discutir um conjunto de coisas no PS. Tenho as maiores dúvidas”.
Declarando que “há um interesse em que determinadas coisas não sejam discutidas”, Galamba acusa a direcção do partido de ter “um tratamento diferenciado, que permite que uns digam aquilo que entendem, mas que penaliza aqueles que têm opinião diferente”. “De algum tempo para cá, desde 2014, os princípios e os valores do PS são de geometria variável, depende das pessoas, das circunstâncias políticas, mas dependente, sobretudo, do que conta e o que conta é o espírito de sobrevivência e de manutenção do poder”, atira.
Assumindo-se como militante de base, António Galamba considera que os estilhaços do caso Sócrates “têm efeitos eleitorais” para o PS. E diz: “A prova de que há consequências para o partido e para a política é que aqueles que sempre estiveram juntos com Sócrates separaram-se a partir daqui; aqueles que sempre estiveram juntos fizeram parte e foram alavanca da chegada ao poder de António Costa”.
João Cravinho, o antigo ministro das Obras Públicas que, em 2006, como deputado, propôs um plano anticorrupção que o Parlamento rejeitou, diz ao PÚBLICO que o PS tem de fazer uma discussão sobre o antigo primeiro-ministro, mas entende que congresso não é o palco próprio para esse debate. “O PS vai ter de discutir esse assunto, com certeza, mas terá de o fazer em condições adequadas e o congresso não é o local mais indicado”, defende, atirando essa reflexão para depois do conclave da Batalha, marcado para o último fim-semana de Maio. “O congresso não tem condições para fazer justiça à própria apreciação do tema”, observa o antigo ministro, muito atento às questões da corrupção.
Preocupado com que está a acontecer ao PS, o antigo ministro de António Guterres adverte que a questão é política. “Não se trata de julgar o engenheiro José Sócrates; trata-se, sim, de apreciar o seu comportamento do ponto de vista politico. Não podemos agora estar, de certo modo, a concentrarmo-nos como se isso fosse uma série de questões individuais”, defende João Cravinho.
E o que pensam os mais próximos de António Costa, incluindo no Governo? Entre estes também ganha força a ideia de que o líder do PS não pode nem deve fugir a comentar os casos que estão a pairar sobre o partido. Há quem defenda, inclusivamente, que Costa devia matar o assunto logo no seu discurso de abertura do congresso, na noite de sexta-feira, dia 25 de Maio.
O líder da bancada parlamentar do PS, Carlos César, voltou ontem a carregar nas tintas. “O nosso desejo é o de que todos os que prevaricaram sejam descobertos e, a comprovar, que sejam descobertos e, a comprovar-se, que sejam punidos com severidade. É isso que é importante que aconteça”, disse no Parlamento. Carlos César sublinhou depois que, ao longo dos anos, “sempre houve corrupção — e provavelmente sempre haverá". "O nosso esforço deve ser o de barrar o caminho a essas pessoas em tudo aquilo que soubermos fazer e, por outro lado, fazendo com que elas, se houve prevaricação, sejam devidamente punidas", acrescentou.