Mais ou menos pela altura do Campeonato Europeu, ou melhor, depois do Campeonato Europeu, comprei um daqueles tapetes de entrada com a bandeira nacional em fundo e uma bola de futebol em primeiro plano para que todos os vizinhos vissem, ao chegar a casa e a passar à minha porta, que naquela casa mora um Campeão Europeu. Em jeito de pirraça, estão a ver, só para meter nojo a esta malta que me rodeia, ingleses de gema em Inglaterra e sequiosos de um título internacional há mais de 50 anos.
Todas as semanas limpo cuidadosamente o tapete. Está sempre impecável, o verde sempre verde com a esperança de um dia voltar, o vermelho sempre vivo pelo sangue derramado todos os dias em prol de uma vida que em Portugal não tenho. E a bola de futebol, pois claro, a três dimensões a querer saltar do tapete para o pé do Éder até ao golo final na memória dos portugueses.
Chego agora à conclusão, através das redes sociais (where else?), que estou em vias de ser preso. Não estou, porque não moro em Portugal, mas pelos vistos de há um ano para cá, e de cada vez que meto a chave à porta, conspurco a bandeira nacional com os meus pés, não, com os meus sapatos imundos. Eu e a minha mulher, e assim não vou preso sozinho. Isto porque um certo hotel no Porto decidiu decorar o hall de entrada com um tapete com as cores da bandeira nacional, facto que de imediato suscitou a indignação geral das redes sociais, esse polícia sempre atento e vigilante em tudo o que respeita à moral e aos bons costumes. Ora, meus caros, o que é a moral? O que são os bons costumes? E porque é que vocês não se calam de uma vez por todas? Por acaso não haverá nada de mais importante para discutir para além do hall de entrada de um hotel do Porto? E, já agora, onde está o tweet de clamor e ardor do nosso Primeiro? E o que é que se segue? Irá o hotel fechar? A Urban fechou. O Panteão já não vai ter a Queima das Fitas. E que tal se fechássemos o país? No fim somos polícias de nós próprios, e tudo por culpa das redes sociais mais os telefones espertos, os quais, através da pressão de grupo, acabam por ditar como nos devemos comportar e agir, de manhã ao deitar, sob pena de ofender o próximo ao mínimo sinal de que se mijou fora do penico. E, no entanto, basta desligar o telefone para, num passe de magia, sermos todos (mais) livres.
Para quem não vive em Inglaterra, um dos elementos de eleição desta gente é o capacho de entrada com as cores da bandeira inglesa. Ter um capacho com as cores da bandeira inglesa não é um insulto para este povo, antes um símbolo e um motivo de orgulho. Para quando a mesma abertura de espírito em Portugal? Ah, e sim, já comprei um igual para mim, ao menos ninguém me chateia.