Em Barcelona, morreram 16 pessoas. Em Nova Iorque, morreram oito. Em todas as cidades que não interessam – porque pouco ou nada se falou delas, morreram 1353 pessoas. Mil trezentas e cinquenta e três.
Entre Barcelona e Nova Iorque, houve ataques terroristas (com mortos que não interessam – porque pouco ou nada se falou deles) em Arauca, Riosucio, Bujumbura, Semdinli, Mindanao, Djibo, Bagdade, Latakia, Península do Sinai, Gashua, Damasco, Samarra, Maluso, Turku, Acayucan, Maiduguri, Waddan, Lashkar Gah, Al Anbar, Kousséri, Cabul, Timbuktu, Kirkuk, Tall'Afar, Helmand, Mogadíscio, Khasavyurt, Kaspiysk, Dar'a, Sirnak, Ekeremor, Lice, Mandera, Jalalabad, Hamah, Dikwa, Lamu, Sirte, Tiaret, Karachi, Cukurca, Kismayo, Najaf, Kidal, Hakkari, Tegucigalpa, Srinagar, Ngala, Baidoa, Bingol, Siirt, Anantnag, Jos, Ramadi, Beledweyne, Arish, Mazar-e Sharif, Miraflores, Nasiriyah, Yala, Candaar, Deir ez-Zur, Ghormach, Mossul, Qamishli, Chamam, Trai, Tambopata, Yenagoa, Kanker, Agri, As Salamiyah, Chihuahua, Kano, Ar Raqqah, Al Haqlaniyah, Legaspi, Misratah, Yuksekova, Diyarbakir, Jeddah, Beni, Quetta, Mombaça, Ghazni, Gardez, Kiev, Manama e Banki. Também houve em Las Vegas. 58 mortos. Mas o terrorista foi um homem branco e norte-americano. Por essa óbvia razão, “não foi terrorismo, foi demência”, disse Trump.
Os corpos dos mortos que não interessam encontram-se em velório algures nas caixas de spam de grande parte da Comunicação Social e das nossas redes – também (pouco) sociais –, sendo que alguns dos mortos – e aqui há que dar o honroso louvor – se encontram nas notas de rodapé de telejornais e no separador “outros” dos respectivos sites. Apenas 1353 pessoas entre um atentado que matou 16 e outro que matou oito. Nem aberturas de noticiários, nem primeiras páginas, nem debates, nem hashtags, nem manifestações, nem homenagens, nem nada. Apenas mil trezentas e cinquenta e três.
O cortejo fúnebre vai decorrendo, assim, por aquela parte do mundo que não interessa – porque não é a Europa nem os Estados Unidos da América –, num ruído que mal nos chega, porque deste lado achamos que aqueles mortos nunca sequer foram vivos. E hoje, dia 2 de Novembro de 2017, é o dia deles. Ou será o nosso?