Poliamor: por que é que ainda não conseguimos sair do armário?

As relações poliamorosas na comunidade LGBT estão remetidas ao desconhecimento e ao preconceito em Portugal

Fotogaleria
sandid/Pixabay
Fotogaleria
sandid/Pixabay

As relações poliamorosas na comunidade LGBT estão remetidas ao desconhecimento e ao preconceito em Portugal e a sua aceitação pela sociedade é "uma luta que está por fazer", concluiu o projecto Intimate, da Universidade de Coimbra. Pessoas da comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgéneros) que se assumem como poliamorosas (relacionamento com mais do que uma pessoa consentido por todos os envolvidos) "têm mais um factor de vulnerabilidade" face ao desconhecimento e preconceito em torno desta "orientação relacional", disse à agência Lusa Ana Cristina Santos, coordenadora do projecto Intimate, que organiza em Coimbra a 1.ª Conferência Internacional "Queering Partnering", esta quarta e quinta-feira.

De acordo com a investigadora do Centro de Estudos Sociais, em 2016 "as questões de orientação sexual já estão mais estabilizadas, mais aceites e mais normalizadas, até em termos jurídicos". No entanto, o mesmo não se passa quando se fala de não monogamia, como é o caso do poliamor, em que há "um caminho muito longo por fazer". "É um assunto que é tabu e quando se fala nunca é com um sentido positivo", referiu Ana Cristina Santos, considerando que "sair do armário do poliamor" para alguém da comunidade LGBT "constitui uma dificuldade adicional".

A coordenadora do Intimate, projecto que recebeu uma bolsa de 1,4 milhões de euros do Conselho Europeu de Investigação, recordou que uma entrevistada contou que foi mais difícil quando disse à família "que não tinha relações exclusivas", do que quando disse que era lésbica. "Isto diz muito sobre a moral vigente", constata Ana Cristina Santos.

No poliamor, todas as pessoas sabem e consentem, "a verdade é a palavra-chave" da relação, "há uma grande preocupação com o bem-estar da outra pessoa" e ocorre sempre "uma negociação" entre as pessoas envolvidas, explanou. A investigadora salienta que não se pode esperar que "todas as pessoas sejam monogâmicas", lembrando que é rara a pessoa que "só tenha tido um companheiro na vida". "O que é aceite socialmente é a monogamia serial: termina-se um relacionamento e passa-se para outro. Mas se olharmos para isto com um olhar macro, ao longo da vida, a pessoa foi acumulando uma série de companheiros e companheiras".

O projecto Intimate — A Micropolítica da Intimidade na Europa do Sul arrancou em 2014 e termina em 2019, abordando a cidadania íntima LGBT em Portugal, Espanha e Itália, em torno de temas como a conjugalidade lésbica, poliamor, procriação medicamente assistida e redes de amizade, entre outros, através de cinco entrevistas em profundidade em cada país para cada temática.

Em 2015, foram abordados os temas do poliamor e da conjugalidade lésbica, sendo que sobre esta segunda questão o estudo centrado em Portugal aponta para uma tendência em se "sair do armário" apenas quando a pessoa já está numa relação.

"Muitas vezes estão à espera de uma relação para darem esse passo, como se a sexualidade só fosse legitimada quando se tem uma pessoa ao lado para a legitimar. Não devia ser assim. A sexualidade basta-se a si própria". Os resultados do 1.º ano do estudo são apresentados na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, na Conferência Internacional "Queering Partnering", que conta com cerca de 150 pessoas inscritas de países como a Áustria, México, Argentina, Polónia ou Inglaterra. Durante os dois dias, especialistas portugueses e estrangeiros debatem temas em torno da cidadania, família, conjugalidade, não-monogamias e activismo na comunidade LGBT, entre outras questões.