O artigo 16 do Código do Trabalho fala-nos de como os direitos de personalidade, tanto do empregador como do trabalhador, devem sempre ficar salvaguardados. Este foi o artigo invocado pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) para justificar a falta de respeito levada a cabo pelo Grupo Calzedonia.
Qual seria mesmo o objectivo de fazer sessões de recrutamento na montra da loja, como se de um circo se tratasse? Testar o desespero de quem se candidatou, como prova de esforço para entrar no mundo frenético das vendas de produtos feitos à custa da exploração laboral? E o que dizer sobre os currículos espalhados na Rua Augusta, pela Loja Intimissimi, também do Grupo Calzedonia? Mais uma demonstração de desconsideração para com os trabalhadores e trabalhadoras que a este grupo se dirigem na esperança de encontrar solução para a falta de emprego.
No fundo, foram apenas mais duas formas, e uma delas bastante bizarra, de humilhar e ignorar a existência do Código do Trabalho. A Associação de Combate à Precariedade - Precários Inflexíveis reagiu, fez denúncia, a ACT interveio e a empresa encontra-se a ser inspeccionada. Consequências, até ver, não existem e o Grupo apenas se comprometeu a não repetir a proeza.
Não se percebe é como é que empresas como esta, com este tipo de prática e tão amigas da precariedade, entram na lista das melhores empresas. Ou até se percebe, se os critérios de eleição se basearem, apenas, na faturação e no lucro. O Grupo Calzedonia Portugal entrou na lista das 500 melhores empresas de 2014, graças à sua faturação rondar a módica quantia de 80 milhões de euros. Já ao nível mundial, a venda dos famosos collants rendeu 1.8 biliões de euros ao bilionário Sandro Veronesi, fundador do dito grupo. Mas como e à custa do quê?
Esta multinacional de origem italiana está espalhada por mais de 20 países, contando com mais de 3500 lojas por todo o mundo. Dizem-nos eles que o seu sucesso e crescimento se deve à diversidade de produtos através de produção própria, aliado a uma forte atenção ao factor Moda, a que se junta a relação qualidade-preço e o atendimento assistido e personalizado. Então, mas produção onde? No continente asiático ou nos países pobres da Europa, à custa da exploração de trabalhadores e trabalhadoras? E o atendimento assistido e personalizado, por quanto lhes fica mesmo? Que salários e que condições de trabalho praticam eles a quem dá a cara para vender a marca? Pelo menos, no que a Portugal diz respeito, o trabalho temporário é o campeão na contratação.
São estas formas de exploração a chave para se conseguir uma boa relação qualidade-preço, é isso? Dá a ideia que é a explorar e a precarizar que se lucra, mas talvez seja só impressão.