As pessoas que mudaram Carnide estão agora num livro
"Cem Participações" conta as histórias de uma centena de pessoas que mudaram a freguesia de Carnide, em Lisboa. Projecto terá também uma exposição itinerante
As histórias de cerca de uma centena de pessoas que contribuíram para mudar positivamente a freguesia de Carnide, em Lisboa, resultaram num livro que vai ser apresentado em Setembro e que será acompanhado por uma exposição fotográfica itinerante.
Amélia Franco, agora com 88 anos, é a marchante com mais idade de Carnide e foi morar há mais de 40 anos para o Bairro da Horta Nova, então clandestino, sem arruamentos e sem acesso a transportes para o centro de Lisboa. Inconformada, foi ao Quartel da Pontinha pedir emprestadas pás, picaretas e baldes e, com a ajuda dos vizinhos, desbravou um caminho para os carros poderem passar. De seguida, juntou um grupo de pessoas e desviou um autocarro da Carris no Largo da Luz, obrigando o motorista a seguir até à frente da sua casa. O autocarro só saiu da Horta Nova no dia seguinte, com o compromisso da empresa de que o bairro passaria a ser servido por uma carreira.
A história de Amélia e de como a Horta Nova ficou ligada por autocarro ao resto da cidade é apenas uma das que são contadas no livro "Cem Participações - Quando as pessoas transformam uma comunidade", uma iniciativa da Boutique da Cultura, uma associação que trabalha na área cultural, envolvendo os habitantes de Carnide. "Tivemos o cuidado de ter gente de todos os bairros, gente portadora de deficiência, ter jovens, menos jovens, pessoas que até são reconhecidas porque estiveram envolvidas no movimento associativo, como presidentes de clubes ou como autarcas, mas também com pessoas que nunca estiveram nestes cargos e que tiveram sempre uma prestação mais discreta na vida da comunidade", explicou o coordenador do projecto, Paulo Quaresma.
Os testemunhos, acompanhados por um trabalho fotográfico, são escritos na primeira pessoa ou por "facilitadoras" que registaram as declarações dos protagonistas. Há histórias de migrantes que vieram das Beiras, do Alentejo, de Trás-os-Montes e de outros sítios à procura de melhor vida na capital e também de quem já nasceu em Carnide: costureiras, cozinheiras, catequistas, desportistas, fotógrafos, professores, atores, dinamizadores culturais e de actividades para crianças, pais e cidadãos portadores de deficiências e muitos voluntários de várias idades em outros tantos projectos.
"Não queremos que seja um manual de instruções para dizer como se faz a participação. A ideia é mostrar pela positiva que uma comunidade é feita por pessoas e que estas pessoas de alguma forma mudaram a comunidade. Se Carnide é o que é hoje deve-se a estas pessoas e à forma como elas se envolveram", disse Paulo Quaresma, destacando, contudo, que "não é um trabalho científico".
O livro será apresentado oficialmente a 16 de Setembro, durante as festas da freguesia, e em vários outros locais, com a participação de alguns dos protagonistas. Será também lançada uma colecção de postais e inaugurada uma exposição das fotografias do livro no Espaço Bento Martins, na Junta de Freguesia, mas que será itinerante durante um ano por vários espaços da cidade, nomeadamente no Edifício Central do Campo Grande da Câmara Municipal de Lisboa. O projecto também chamou a atenção do papa e 150 dos envolvidos irão ao Vaticano conhecer Francisco durante uma audiência geral que se realizará a 28 de Outubro.