Um dos finalistas do concurso de arquitectura “Vision42” é português
Tiago Torres Campos, que sempre quis ser arquitecto paisagista, desenhou uma nova versão da icónica 42nd street em Manhattan, nos Estados Unidos. O prémio final é de 10 mil dólares
Um dos finalistas do concurso Vision42, iniciativa que visa apresentar ao público americano propostas de redesenhar a conhecida 42nd Street, em Manhattan, nos Estados Unidos, é português. Chama-se Tiago Torres Campos, natural de Lisboa, é actualmente professor em Edimburgo e o seu desejo de ser arquitecto paisagista esteve presente desde a infância.
O concurso Vision 42 foi lançado no início do Verão passado pela revista Architect’s Newspaper em conjunto com algumas universidades em Nova Iorque, a autoridade dos transportes e várias associações de moradores. A competição pretende repensar e redesenhar uma das mais icónicas ruas de Nova Iorque, a 42nd Street, em Manhattan, de modo a pedonalizar este espaço numa cidade na qual o uso de carro passou a ser uma realidade crescente.
O objectivo da iniciativa passa não só por fazer com que a população americana ganhe um interesse por esta ideia, mas também por encorajar arquitectos e designers urbanos de todo o mundo a criarem propostas criativas para repensar este espaço. O prémio final será de 10 mil dólares e neste momento o concurso está na sua segunda fase, que inclui uma exposição na Times Square, na galeria do edifício da Condé Nast que visa divulgar as quatro propostas finalistas de modo a que o público possa participar através de voto online no site do concurso.
Uma rua "mais rica"
“A minha proposta refuta a ideia de rua para o carro (modelo norte-americano), mas refuta também a rua como simples canal pedonal com solução de tram (o que nos pediam), e propõe uma ideia um pouco mais complexa, mas certamente mais rica, de rua como lugar de congregação social, palco urbano e cultural e activador ecológico”.
Até agora foram selecionados três finalistas além do Tiago. Há duas equipas e uma outra proposta individual: uma resulta de uma parceria entre arquitectos, arquitectos paisagistas e urbanistas franceses e norte-americanos; outra equipa é constituída por jovens arquitectos paisagistas e engenheiros franceses; por fim existe uma proposta não-profissional de um aluno (Paul Boyle) que estuda na University of Western Australia, em Perth.
Quando o P3 perguntou o que distingue a sua proposta das restantes, Tiago preferiu dar maior ênfase ao que os une. “Todas as propostas finalistas falam de paisagem. Umas com mais propriedade do que outras, é certo, mas todas elas parecem reconhecer a importância que a paisagem tem hoje dia em contexto urbano e penso que isso, por si só, é já uma vitória”.
“A fase final", refere, servirá sobretudo para c"onfirmar qual a proposta que teve mais receptividade junto do público e não necessariamente a melhor ou mais consistente em termos de ideia". "Não escondo que ser anunciado como vencedor me traria uma enorme felicidade, mas a maior vitória foi ter sido um dos quatro finalistas, a possibilidade de ver o meu trabalho exposto em Nova Iorque e publicado numa das revistas de arquitectura mais influentes do mundo”.
O arquitecto que "não gostava de desenhar casas"
Tiago nasceu em Santo Amaro de Oeiras. Cresceu perto da praia no seio de uma família grande e unida. Os seus pais eram ambos arquitectos paisagistas o que acabou por lhe incutir esse sonho, apesar de em criança lhe desagradar a ideia de desenhar casas. “Quando tinha dez ou onze anos, lembro-me de dizer ao meu pai que gostava de ser arquitecto mas não gostava de desenhar casas. O meu pai disse-me que uma coisa não implicava a outra, porque havia arquitectos que desenhavam parques e jardins. Foi quase que uma revelação para mim, que na altura não fazia ideia do que era arquitectura paisagista. Desde então, sempre que na escola nos pediam para dizer o que queríamos ser quando fôssemos grandes, além dos habituais sonhos de ser médico, bombeiro ou jogador de futebol, havia sempre aquele estranho no canto da sala que dizia que queria ser arquitecto paisagista.”
Apesar da sua fixação por esta profissão, admite que também já se imaginou com outras ocupações. “Quis ser escritor, explorador da vida animal como aqueles da National Geographic e até cientista. Ainda quero por vezes. Mas aprendi a confiar nos meus instintos enquanto arquitecto paisagista e é algo que adoro”.
Quando chegou a hora de entrar na universidade a sua primeira opção foi Arquitectura Paisagista no Instituto Superior de Lisboa. Após ter terminado no ano de 2007, as oportunidades não tardaram a surgir ainda que nem sempre na sua área. Pouco depois da sua licenciatura, uma amiga sua desafiou-o para participar no projecto “Um Jardim em Cada Escola”. “O que me fascinou mais neste caso não foi tanto o resultado mas sim o processo. Ver o brilho nos olhos de uma criança que ainda não sabia ler a mostrar aos pais o “seu” canteiro, ou a “sua” planta. Ver crianças, professores e pais todos envolvidos na mudança de algo para melhor.”
Contudo, a oportunidade que daria um empurrão considerável à sua vida profissional surgiu quando o arquitecto paisagista e seu antigo professor universitário João Nunes, o convidou para estagiar no seu atelier, a PROAP, o que lhe permitiu participar em cerca de três concursos internacionais. “Esta súbita passagem de estudante a quase-profissional foi das experiências mais marcantes que já tive: o ritmo frenético, a energia de vinte ou trinta pessoas todas a remar para o mesmo lado, e com muita força”.
Pouco depois, Tiago juntou-se com dois amigos (também estagiários no mesmo local) e criaram o seu próprio atelier: a Terramorfose. “Foi um tempo que adorei, pelo espírito de companheirismo, de entreajuda e de luta. Tivemos projectos interessantes nas mãos, alguns dos quais viriam, infelizmente, a cair devido à crise”. Uma das iniciativas na qual teve oportunidade de participar com o seu pequeno atelier foi num estudo da rede de Percursos Cicláveis do Parque das Nações. A oportunidade deixou-os entusiasmados, infelizmente não teve o desfecho que desejariam. “De repente, três amigos que tinham acabado de começar tinham esta enorme oportunidade de participar em algo significativo na cidade de Lisboa. Infelizmente, na fase em que começámos a implementar as ciclovias, o dinheiro que a Parque Expo tinha inicialmente deixou de existir, e o projecto nunca foi para a frente”.
Apesar de ter criado o seu próprio atelier, Tiago continuou, ainda assim, ligado à PROAP ficando responsável, por um curto período de tempo, pela equipa de comunicação e pelos trabalhos de investigação do atelier.
A sua vida iria mudar devido à sua ambição por um futuro melhor do que aquele que tinha em 2012. “Embora estivesse a trabalhar na altura em Lisboa, a vida para os arquitectos em 2012 estava a tornar-se mais difícil de dia para dia. É uma situação que está longe de estar resolvida no final de 2014. O querer mais profissionalmente aliado à vontade de procurar outras experiências levaram-me a candidatar a uma vaga na Universidade de Edimburgo.” Apesar das suas baixas expectativas, Tiago recebeu luz verde e partiu para Edimburgo, onde actualmente é professor.
Foi difícil deixar Portugal, admite hoje. “Ainda é hoje em dia. Não sou pessoa de olhar muito para trás e sei que família e amigos verdadeiros estão lá quando precisamos, mas a verdade é que viver noutro sítio que não o nosso custa sempre. Com o tempo, acabamos por ganhar raízes, e até a tratar por tu o sítio onde vivemos, mas não é a mesma coisa”.