Arquitectas portuguesas desempregadas querem ajudar refugiados da Síria
São arquitectas e criaram um abrigo para refugiados da Síria. O projecto vai estar em Nova Iorque, mas as jovens desempregadas não têm dinheiro para ir lá apresentá-lo. Missão: Crowdfunding
Pretendem que os refugiados personalizem o seu próprio abrigo e sintam que “é o início de uma nova casa, de uma nova vida e tenham um espírito de pertença”. Ângela Pinto, Carla Pereira e Joana Lacerda são três arquitectas portuguesas e criaram um abrigo para refugiados da Síria. O projecto venceu um concurso internacional e em Dezembro vai ser apresentado em Nova Iorque. Mas primeiro falta angariar dinheiro para pagar a viagem. A campanha de “crowdfunding” começou a 30 de Outubro.
Ângela, 24 anos, Carla, 25 (actualmente a viver em Londres), e Joana, 26, terminaram o curso de Arquitectura, na Universidade Lusíada do Porto, em 2013. No desemprego há mais de um ano, decidiram frequentar, durante o Verão deste ano, um curso da Open Online Academy, sobre “Designing Emergency Shelters”. Juntas formaram a equipa “Cross Hands Team”. O curso tinha como trabalho final a projecção de abrigos para vítimas de guerras ou desastres naturais.
E porquê a Síria? Ângela conta que queriam “criar um abrigo que se adaptasse tanto a um clima quente, como a um clima frio”. E a Síria é um desses casos, pois combina os dois tipos de clima: “Invernos rigorosos e Verões secos e quentes”. O desafio passava também por fazer algo que “não existe ainda”, isto porque, como explica Joana, há “poucos abrigos desenvolvidos para este tipo de clima” e muitos para climas quentes. “Pareceu-nos que a Síria era mais pertinente pelo que se está a passar no momento no país e pela quantidade de refugiados que têm conseguido albergar em muito pouco tempo”, acrescenta Ângela.
Depois de desenharem o abrigo, foi-lhes proposto que desenvolvessem o campo de refugiados e contemplassem “outros programas que existiram no local, como cantinas comunitárias, casas-de-banho comunitárias, centros psicológicos, armazéns de ONG, mercado de trocas”, refere Ângela.
Cada abrigo é composto por uma zona de estar e uma zona de dormir e para cada dez abrigos existem uma casa-de-banho e uma cozinha comunitárias, uma estufa, uma zona de lavadouro e de recolha de lixo. Depois existem praças criadas ao longo do campo onde são implementados estes programas, como o mercado de troca ou a escola. Com uma dimensão de 3m x 7,5m, o abrigo “foi pensado para poder esticar e encolher, ou seja, inicialmente pode abrigar três pessoas, mas depois vai esticando através de uma sanfona e pode ir abrigando de três em três”, esclarece Joana.
O conceito de “flexibilidade” guiou o trabalho das três arquitectas e está presente tanto no exterior, como no interior do abrigo. “Queríamos que o abrigo fosse flexível às pessoas, ao programa e ao clima e conseguimos fazer isso através da forma das fachadas”, explica Ângela. O exterior do abrigo é constituído por uma espécie de “grelha” e a ideia é que os refugiados preencham as fachadas com garrafas, terra, latas, plantas, ou outros materiais que encontrem no local. Desta forma, cada pessoa pode personalizar o seu abrigo. No interior, a única peça de mobiliário é um baú com rodas que pode funcionar como banco, caixa de arrumação, mesa ou secretária.
O orçamento máximo disponível era de mil dólares (cerca de 780 euros), mas o projecto final da “Cross Hands Team” fica por 848.40 dólares por abrigo, o equivalente a 667.46 euros.
“Crowdfunding” para ir aos EUA
A “Cross Hands Team” ganhou o concurso, mas o prémio não é monetário, uma vez que o curso da Open Online Academy é gratuito. Como recompensa, o projecto de Ângela, Carla e Joana vai estar exposto na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, entre 1 e 12 de Dezembro, seguindo depois para a Asia Society, em São Francisco. Terá também um lugar de destaque numa publicação que vai reunir os melhores projectos realizados durante o curso. E há ainda a possibilidade de o projecto vir a ser concretizado. No entanto, a construção do abrigo para os refugiados depende do financiamento de Organizações Não-Governamentais (ONG).
O dia de abertura da exposição será, então, uma oportunidade para as três jovens apresentarem o projecto e promoverem o seu trabalho junto de importantes órgãos da área, mas também para atrair investimento. “Em Nova Iorque temos a oportunidade de conhecer pessoas que se interessam por estas causas e que possivelmente nos ajudarão a arranjar fundos para os abrigos serem implementados no campo de refugiados da Síria”, explica Ângela.
Mas primeiro falta angariar dinheiro para ir até Nova Iorque. Uma campanha de “crowdfunding” (financiamento colectivo) foi a solução encontrada pelas três jovens, que têm como meta chegar aos 1800 euros. A campanha decorre até 24 de Novembro.
Uma arquitectura ligada a causas sociais é um interesse partilhado pelas três jovens e que sustentou as suas teses de mestrado. “Tínhamos esse vínculo de nos preocuparmos com uma arquitectura mais social, mais pertinente para os que realmente precisam e não têm possibilidades de pagar a um arquitecto”, esclarece Ângela.
É neste tipo de projectos que as três arquitectas se revêm e nos quais pretendem trabalhar futuramente. Ainda assim, admitem ser uma área difícil, como refere Joana: “Aqui em Portugal, o mercado é muito escasso. E acho que acima de tudo não há interesse em investir. Lá fora existem muitos concursos acerca deste tema e aqui é muito complicado. Temos noção disso”.