Luís Simões está em Hong Kong a desenhar os protestos ao som de música romântica
Português está há nove meses em Hong Kong, para onde viajou a propósito da volta ao mundo que começou em 2012, e tem estado a desenhar as ruas ocupadas. Os protestos são pacíficos, garante, apesar de sentir “um bocadinho de tensão”
Desde segunda-feira, 29 de Setembro, que o português Luís Simões tem estado a fazer uma cobertura ilustrada dos protestos em Hong Kong, iniciados durante a última semana contra a acção do governo chinês. Os manifestantes ocuparam ruas e estradas do território e exigem que Pequim lhes confira o estatuto de “região administrativa especial”, deixando de lado a ideia de escolher os candidatos ao governo local nas eleições supostamente livres marcadas para 2017.
Apesar de, na noite de domingo para segunda-feira (28 para 29 de Setembro, respectivamente), a polícia ter recorrido a gás lacrimogénio para dispersar os manifestantes, causando assim dezenas de feridos, o português de 35 anos garante que o ambiente é “pacífico”. Em conversa telefónica com o P3 a partir de Hong Kong, onde está há nove meses, Luís destaca os milhares de pessoas que se movimentam pelo território, ocupando e fechando vias de acesso, linhas de eléctrico e até saídas de metro — ainda que a maior parte das estações esteja operacional, bem como a circulação das carruagens.
Devido à organização dos protestos, “é possível andar pelas ruas à vontade”, refere, porque é tudo “muito formal”. Há pessoas a aconselharem outras a não ocuparem zonas já muito preenchidas e igrejas a dar apoio, bem como “pequenas instituições que têm aberto salas para acolher quem lá quer passar a noite”, descreve. Os "hong kongers" que não podem participar nas manifestações fazem questão de apoiar, com oferta de comida e água para combater o calor que se faz sentir.
“Hoje [1 de Outubro, quarta-feira], já se vêem tendas”, refere Luís. Por ser feriado (celebra-se o 65.º aniversário da fundação da República Popular da China) juntaram-se “famílias, crianças, senhoras de idade” aos estudantes universitários que iniciaram o movimento “Occupy Central”. “Ninguém está a gerar violência, não há palavras de desordem nem apelo à força. Nem sequer tenho medo de passear pelas ruas”, assegura. Existe “um bocadinho de tensão” na antiga colónia britânica, admite, mas as pessoas “têm um controlo emocional enorme” [vê a fotogaleria].
Protestar ao som de "música romântica"
Luís está desde Março de 2012 a viajar pelo mundo, com o projecto World Sketching Tour; desde essa altura que não visita Portugal e entretanto já passou por muitos países. Em Junho de 2013, o ilustrador de 35 anos esteve em Istambul, na Turquia, onde também aproveitou para desenhar os protestos populares, centrados na praça Taksim. As duas situações são “naturalmente distintas” e Luís destaca o “estado de espírito” de cada povo, bem como a facilidade de comunicação. “Aqui [em Hong Kong]é muito mais fácil obter informações porque todos falam inglês — e na Turquia ninguém falava. Lá também nunca se sabia como é que a polícia ia reagir, houve muita violência”, compara.
No caso do território asiático, ouve-se “uma música extremamente romântica”, conta. Já na Turquia, ouvia “a voz da violência”, com grupos organizados “a tentarem fazer as coisas de forma dura”. Os "hong kongers" tentam que os protestos “não sejam uma coisa espalhafatosa, tipo feira popular” e mostrar o desagrado com a situação actual, querem “a independência e a liberdade de expressão de volta”.
A estadia em Hong Kong acabou por se prolongar porque perdeu o passaporte e teve uma proposta para colaborar com uma agência de design. Durante quatro meses fez ilustrações para a agência e, no final, teve a oportunidade de ter uma exposição numa galeria. O Nepal e a Índia são as próximas paragens do ilustrador, cujos desenhos e esquissos podem ser acompanhados no Facebook e no Instagram da World Sketching Tour.