As criações de Charles Chaplin, podemos dizê-lo hoje sem hesitação, são geniais. Muitas tiveram o merecido reconhecimento na altura da sua criação (sorte de que outras obras-primas não beneficiaram). Mas o facto de terem conseguido sobrevier à passagem do tempo (muitas delas já têm mais de 80 anos) possibilita-nos reafirmar, sem reservas, que “Charlie” Chaplin era um génio criativo.
Chaplin tinha muitos talentos. Escrevia, realizava, compunha músicas e representava. E era muito bom em todos eles. Os filmes em que ele foi o actor principal, o guionista, o realizador, o produtor e o compositor da banda sonora são o exemplo acabado de um “one man film show” que tão poucos, depois dele, conseguiram fazer.
Mas Chaplin era, acima de tudo, um mestre do humor. E mestre na acepção mais profunda do termo: aquele que tudo sabe e tudo ensina. Primeiro, porque parecia conhecer todos os mecanismos fundamentais do humor, aquilo que faz despertar, no ser humano, a vontade de sorrir ou de rir às gargalhadas. Segundo, porque sabia conjugar o rir com o pensar, a piada simples ou o humor físico, com as mais profundas, sensíveis e acertadas reflexões filosóficas (o filme “O Grande Ditador” de 1940 é paradigmático).
E isso só era possível porque tinha uma sensibilidade artística extrema, que se tornava mais evidente nas cenas em que nos conseguia comover com a ternura dos seus gestos e do seu olhar.
Charlot, a sua criação mais carismática, era, aliás, um espelho disso mesmo. Um pobre cheio de dignidade e de delicadeza (um “gentleman” sem dinheiro) que tudo fazia para sobrevier às agruras e aos imprevistos da vida. Sem grande força física, a inteligência, a agilidade ou o engenho eram as ferramentas de que Charlot se munia para sobreviver perante as dificuldades. Fazendo-nos rir no entretanto e dando-nos singelas lições de vida. São múltiplos os apontamentos imortais nos seus filmes. Quem os viu não consegue esquecer o dia de ação de graças de Charlot, na sua Corrida ao Ouro, numa cabana perdida na neve, em que as botas e os respectivos cordões se tornam numa deliciosa refeição; ou aquele genial sapateado cómico, em que dois garfos espetado em pães são os protagonistas; ou o paradigma do cinismo sublime e cómico, quando o Grande Ditador brinca com o mundo em forma de balão gigante; ou a máquina de comer, que os Tempos Modernos criaram para que o operário perca menos tempo nas refeições; ou a cena em que Charlot se vê forçado a enfrentar um pugilista profissional, com muito mais peso, e serve-se da sua astúcia para usar o árbitro como escudo ou tocar a campainha do round quando lhe convinha. Enfim, nenhuma lista seria exaustiva nem definitiva.
O que é definitivo é Chaplin ficar para a história. Um génio criativo que, no início do séc. XX, enchia salas de cinema e que, hoje, mantém a capacidade de tocar gentes de todas as idades: crianças de sete, jovens de trinta ou adultos de setenta, muitos continuam a sentir o poder das suas criações e a obedecer com um sorriso à sua magia.