Já não estamos no séc. XIX, nem sequer nos anos 50 do séc. XX. As instituições mudam e o casamento tem-se vindo a transformar. Primeiro, deixando que os cônjuges se escolham mutuamente, em liberdade e em função do amor (e já não por imposição familiar). Depois, transformando-se num espaço que visa conjugar a felicidade individual com a felicidade conjugal (e, por isso, a liberdade individual com o compromisso do casal, com os cônjuges a não terem que abdicar das suas ambições individuais). Hoje aceita-se que o amor só é eterno enquanto dura e, por isso, o divórcio não só é permitido legalmente como é encarado como um evento normal: se casamento já não estiver a somar à felicidade dos dois, é tempo de o acabar.
Porém, como em muitas outras situações, as mudanças sociais não são instantâneas nem necessariamente consistentes. No caso do casamento, aquilo que eu tenho achado mais incongruente é a sua prática (de acordo com os novos valores da felicidade e da aceitação da finitude) e a perpetuação que muitos ainda fazem das ritualizações do passado.
Acredito que não sou o único que tem conhecimento de casamentos de pompa e circunstância, com véu e grinalda, vestido branco, fraques e afins, igreja, missa cantada e votos solenes de amor eterno perante o padre e Deus, copos de água faustosos (muitas vezes pagos a crédito e feitos para impressionar a sociedade), com os noivos a irem de lua-de-mel para uma paraíso qualquer e, pouco tempo depois, sabemos da notícia do divórcio daquele casal. Alguns vêm já incompatibilizados do paraíso que escolheram para celebrarem (agora só a dois) o casamento. Outros, passados alguns meses de tão grandioso evento e de convivência no seu ninho do amor (a casa que partilham).
Os casamentos religiosos e faustosos são uma tradição da realeza. Nessa tradição, os divórcios não são admitidos e o casamento não é para a felicidade dos noivos senão para o interesse das coroas. Por isso a pompa e circunstância se justificam (até porque são eventos com forte componente social e mediática). Fazer-se a cópia desses rituais e, depois, não se guiar o casamento pelos respectivos princípios, parece-me desajustado.
Entendamo-nos: cada um tem direito a fazer a festa de casamento que quiser. Pode gastar milhões, convidar milhares e fazer a maior festa de casamento do mundo. E pode divorciar-se ainda na lua-de-mel. Mas é legítimo que as famílias (que pagaram a festa) fiquem frustradas, os amigos e convidados desapontados e Deus desiludido (afinal foram a casa d’Ele fazer votos de amor, na saúde e na doença, até que a morte os separasse).
Enfim, parece-me muito mais adequado as pessoas juntarem-se sem grande alarido e, se quiserem festejar, talvez celebrarem faustosamente o dia em que completarem vinte e cinco anos de vivência a dois.