Pessoa ficaria chocado se visse o que andamos a fazer ao amor. Esgotou-se o tempo para escrever cartas à Ofélia. Perdeu-se a paciência para romances longos. Em vez disso, multiplicam-se sites e chats com promessas de amor – não eterno, mas rápido. Não surpreende na sociedade que fomos construindo: queremos tudo para ontem e pedimos tudo para amanhã.
Profissões esgotantes, horários loucos, cursos intermináveis e créditos em catadupa. Vivemos mais tempo, mas somos pressionados a atingir mais coisas e cada vez mais cedo. Parece que o prazo de validade dos sonhos encurtou. Mais ambiciosos e sonhadores, somos também menos tolerantes às contrariedades, dissabores e infelicidades. Escravos dos prazos que nos impõem, fomos perdendo tempo para nós próprios e passámos a querer o amor tal como o almoço do trabalho: rápido, fácil e, de preferência, já embalado.
Sinto um salto gigantesco entre a minha geração e a dos meus pais: desde o tempo dos beijos roubados às escondidas de uma sogra distraída, para os dias do amor apregoado por anúncio. Nesta época de inquietação em que queremos viver tudo apressadamente, várias páginas prometem facilitar-nos a vida derramando slogans aliciantes como “rápido e eficaz”, “eles são felizes” ou “começa já uma relação”, tudo acompanhado de fotos que parecem saídas de promoções para um branqueamento dentário.
Ao ouvido chegam-me relatos constantes de encontros múltiplos e falhados — daqueles que dão um arrependimento danado de sequer ter saído de casa. E não foi só porque o par era entediante, chato ou inconveniente, mas sobretudo porque as expectativas e a pressão nos tramaram o encontro.
?Criamos grandes expectativas com base em imagens que a sociedade nos pedincha: lindos, sorridentes e felizes em tudo o que é rede social. Espreitamos o Facebook e avaliamos fotos, séries ou músicas comuns para ver se faremos faísca. Mas a pressão social e a impaciência tiram-nos a capacidade de esperar por quem valha mesmo a pena, e roubam-nos o tempo e a vontade para realmente conhecer o outro. Expectativas elevadas podem trazer desilusões desastrosas. E desilusões repetidas tiram credibilidade ao futuro, como se ele não reservasse nada mais a não ser mais do mesmo.
Alimentamo-nos mal quando não temos tempo: gordura e hidratos dão uma sensação rápida de saciedade. Andamos a fazer o mesmo com o amor: para nos satisfazermos, confundimo-lo com atenção e aceitação, mas nenhuma delas é companheirismo ou entrega. A atenção é fugaz, impaciente e alimenta-se de imagens; o amor é lento, pachorrento e cria-se com o tempo.
?E assim seguimos: juntos, mas cada vez mais isolados e desconectados. Comunicamos, mas não empatizamos. O desejo de nos sentirmos acompanhados e acarinhados está na nossa natureza e ainda bem que assim é. Mas não há como fazer do amor uma entrega ao domicílio. É preciso ir lá para fora de coração aberto, mas não desesperado. Por isso, ponham o calendário social na gaveta e, a saborear, que seja um amor “gourmet”: especial, doseado e memorável.