Temos aí uma chatice moral para resolver

Quando o planeta começou a suportar o peso de sete mil milhões de almas, a maior parte das pessoas pareceu festejar o acontecimento, ao invés de se preocupar com a possibilidade próxima e real da escassez de recursos

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China Daily/Reuters

Pela literatura científica publicada e pelo crescente número de conferências e convenções ocorridas nos últimos anos, podemos afirmar com elevado grau de certeza que já está definido o debate científico sucessor do aquecimento global. Não que este último esteja resolvido, mas sim porque o próximo esteja aí a bater à porta da humanidade.


Há seis anos, Alan Weisman colocou uma questão importante ao mundo: o que aconteceria a tudo o que criámos se um dia todos desaparecêssemos? O resultado está na obra "The World Without Us", de 2007 (traduzida para português pela Estrela Polar). Este ano, em "Countdown", Weisman indaga-se sobre uma ideia muito mais premente e dotada de maior realismo: então e o que poderá suceder se formos demasiados no cimo desta Terra? Para quem quiser introduzir-se no tema, esta última talvez seja a obra mais apropriada. Sobra o problema, para alguns, de a obra não estar traduzida para português.


Em 2011, chegámos ao bebé sete mil milhões a pisar o planeta. Assustadoramente, calcula-se que sejamos dez mil milhões no ano 2050. Ainda mais impressionante é ver que, há cinquenta anos, éramos “apenas” três mil milhões. A regra matemática da exponencialidade explica-se com números ou, de forma simplista, nesta frase: quanto mais somos hoje, ainda mais seremos amanhã.


Quando o planeta começou a suportar o peso de sete mil milhões de almas, a maior parte das pessoas pareceu festejar o acontecimento, ao invés de se preocupar com a possibilidade próxima e real da escassez de recursos. Falta, como sempre acontece antes de iniciar um debate, a consciencialização. A consciencialização para a urgência de começar a pensar em fazer decrescer drasticamente o peso (literal e simbólico) do pé humano no terceiro calhau a contar do Sol.


A questão da sobrepopulação é, antes de mais, moral. Primeiro que definir políticas, há que fazer a reflexão: como manter (ou reduzir) o número de humanos no planeta sem afectar as liberdades e direitos fundamentais previstos na Declaração Universal dos Direitos Humanos? Atente-se na importância do artigo 16º do documento: “a partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família, sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou religião (…)”.


A famílila é e tem sido o fundamento basilar da Humanidade. Não é, portanto, de estranhar que culturas, religiões e tradições coloquem muito de si no valor do núcleo familiar. Como tal, terá de haver o debate responsável, transversal a todas as dimensões da sociedade, sobre a promoção de uma família mais pequena ou da fraternidade entre todos e não apenas enlaçados de sangue. Para sermos menos, há muitas outras alternativas. Precisamos de as descobrir. Precisamos que no-las ensinem.


Colocando de parte as políticas anti-natalidade, as eugenias e matanças de outros tristes tempos, o ideal é promover um mundo povoado por um número sustentável de humanos que nos façam descendência. Caso contrário, a culpa de sofrimentos, guerras e outros cataclismos provocados pela simples ausência de recursos perante milhares de milhões de almas será somente nossa. Falemos mais sobre isto.

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