O tempo suspenso. O mês de Agosto transforma Madrid numa cidade apaziguada, onde tudo sucede a um ritmo mais lento do que o habitual. Muitos são os que partiram rumo a paragens à beira-mar. As multidões reduzem-se. Não há encontrões nem cotoveladas no metro. Os restaurantes da moda têm mesas livres para o fim-de-semana. Os que ficam têm a sensação de ter a cidade à sua inteira disposição. O ruído ambiente parece calar-se, é um quase silêncio. Tudo se arrasta por entre a implacável canícula que nunca dá tréguas. Nem uma gota de chuva. A brisa revela-se tímida. O ar sequíssimo e tórrido faz com que sair de casa seja um verdadeiro desafio. Um martírio.
Faz-se tudo para fugir ao calor e Madrid oferece uma série de alternativas para quem não quer passar os dias estivais metido em casa. Na serra, as piscinas naturais de Rascafría e as praias fluviais de Canto Cochino são um bom cenário para piqueniques, onde muitos vão para estar à fresca. Muito perto do centro, Madrid Río, a área ribeirinha do Manzanares reabilitada nos últimos anos, brinda-nos com uma série de esplanadas e uma praia urbana.
O Matadero de Madrid, um centro de criação artística contemporânea nas instalações do antigo matadouro e mercado de gado da cidade, também combate o calor. Ribera Matadero consiste num ciclo de actividades programadas para os fins-de-semana até Setembro, todas elas muito diversas e abertas à participação do público, entre concertos, intervenções artísticas e "happenings".
"Sábado de Âncoras e Chinelas" foi um desses eventos. O nome evocava o mar, as tatuagens dos marinheiros e os dias de praia. Em suma, a antítese do Verão madrileno. A indumentária recomendada não podia ter sido outra: calções ou fato de banho e chinelas. Mas mais do que um convite era uma chamada à guerra: uma batalha de pistolas e balões de água. Os audazes combatentes do Verão atenderam à convocatória, munidos do armamento regulamentar — nalguns casos, verdadeiros bacamartes — e um moral elevadíssimo.
A frenética e refrescante bisnagada também pedia um cessar-fogo, nem que fosse momentâneo. Vários artistas encarregavam-se de fazer tatuagens com marcadores permanentes. Havia um vasto leque de desenhos à escolha, entre âncoras, polvos e outras criaturas marinhas.
No meio daquele frenesi, daquela aquosa alegria, por momentos, respirava-se a ilusão colectiva de que Madrid era uma cidade fresca e húmida. Fresca e húmida.