Há uma classe social a ganhar cada vez mais poder em Portugal. Chamam-se os Castigadores do Prazer Alheio (CPA).
A razão de viver desta classe social é intervir sempre que alguém manifesta contentamento porque vai de férias para o estrangeiro, ou porque jantou num restaurante bom, ou porque resolveu perder a cabeça em compras.
O CPA, na forma de frases tais como "Boa vida! Uns em crise e outros a viajar/gastar/comer bem!", intercede com a maior brevidade em nome da conjuntura socio-económica, não vamos nós esquecermo-nos de que estamos em crise na hora de levar o bife à boca - porque é uma sorte haver bife, e é uma sorte haver boca.
A classe dos CPA's faz os possíveis para convencer os outros de que é um descaramento curtir a vida, quando há crise e fome e desemprego e ai-Jesus-tanto-imposto.
Humor de viuvez
Ora, toda a gente sabe que só somos vítimas convincentes desse estado das coisas, e da complacência que merece, se vivermos em humor de viuvez, frugal e cabisbaixo, de quem espera dias melhores mas não demasiado, só se Deus quiser.
Os CPA's são precursores de um novo comunismo, o do egoísmo — se não desfrutam todos, não desfruta ninguém.
Era o que faltava dizer que se vai ao Brasil — "Isso é que é vida, hã?" — quando outros não saem da junta de freguesia. É o equivalente a estar casado com Portugal, a esposa feia e carrancuda, e escapar para os lençóis da rameira terceiro-mundista, mais nova e desenvolta.
Já nem falo de comer na esplanada à vista de todos, que é a deixa imediata para um castigador de serviço: "Estamos em crise mas os restaurantes estão cheios, essa é que é essa!", uma evidência enfurecida, com que direito se atrevem a desfrutar, quando o Governo está como está. Não se vê um pingo de autocomiseração nesse bitoque com ovo a cavalo, que escândalo!
Em Portugal é proibido existir, pelo menos com alegria. Porque os tempos não estão para isso.