Portugal ratificou no passado dia 5 de Fevereiro a Convenção de Istambul sobre a prevenção e combate à violência contra as mulheres. Na sequência dessa ratificação – que se aplaude, por todos os motivos e, também, por Portugal ter sido o primeiro país da Europa a fazê-lo – a secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade prestou declarações à "Rádio Renascença".
E disse: “Sobretudo, o que eu gostaria de ver era uma mudança de atitude relativamente ao poder judicial, que eu julgo que se está a fazer mas está a fazer-se com muita lentidão, no sentido de não deixar estes crimes impunes, não lhes aplicar penas tão leves como nalguns casos têm sido aplicadas e ponderar-se seriamente a não utilização do mecanismo de suspensão da pena, como tantas vezes acontece.” Teresa Morais já tinha proferido declarações semelhantes em finais de Setembro, aquando de um Encontro de Mulheres em Chaves. Mas nem o tempo decorrido, nem as responsabilidades que assume a fizeram ter mais cuidado com as palavras que utiliza.
Estamos todos de acordo que a violência doméstica, sendo uma realidade crescente no nosso país, é dramática, quando não mesmo trágica. Deve ser denunciada. E o apoio efectivo às vítimas deve ser uma prioridade. Deve haver cada vez maior informação e meios de protecção eficazes para que haja verdadeira prevenção e um acompanhamento e um auxílio efectivo às mulheres (e aos homens, ainda que possam ser muito menos) que sofrem com a prática deste crime abominável. Mas, em nenhum momento podemos perder de vista o desiderato final – a não ocorrência de casos de violência doméstica ou, na impossibilidade deste objectivo, a verdadeira protecção das vítimas.
Julgamento rápido
Tudo certo até aqui. Só que a protecção, senhores, do ponto de vista dos tribunais, não passa necessariamente por fechar na cadeia os criminosos para o resto da vida. Passa, sim, pela realização de um julgamento rápido, com o menor incómodo possível para a vítima, e por uma sentença justa e adequada. O resto não deve, porque não pode, ser exigido ao poder judicial.
A efectiva protecção da vítima incumbe ao Estado, enquanto garante do direito à integridade pessoal que assiste a cada um de nós. É importante a ratificação da Convenção de Istambul, já o disse. Mas, mais importante – para as vítimas – será a efectiva execução das disposições que aí se estabelecem, nomeadamente quanto à obrigação de existência de serviços de apoio especializado e imediato para as vítimas de violência. Se não for assim, não passamos de boas intenções; e dessas, como sabemos, está um determinado sítio mais que cheio…
Se o Estado entende que a moldura penal actualmente existente para este tipo de crimes é inadequada deve promover a sua alteração. Se considera que a este tipo de crimes não deve ser aplicado o instituto da suspensão da pena, pois diligencie no sentido de tal ser consagrado legalmente. Tem condições de o fazer; que o faça. Até lá, seria preferível que se abstivesse de comentar o que não deve.
O poder judicial está sujeito à lei, não à vontade dos soberanos. Por isso, e sobretudo, o que eu gostaria de ver era uma mudança de atitude relativamente a alguns membros do poder executivo, no sentido de conhecerem bem o princípio da separação de poderes consagrado na Constituição. Pronto, também (eu) disse.