O que é que tem (geralmente) quatro pernas e serve para sentar? Fácil. Uma cadeira. Mas é mais do que isto. Há experimentação, arte e empenho na criação de um dos objectos mais icónicos do mobiliário. No MUDE, designers e arquitectos discutiram a importância da cadeira nos dias de hoje.
“A cadeira é um objecto como outro qualquer, a posição sentada é que é relevante”, lançava o designer Gonçalo Prudêncio. No Museu do Design e da Moda (MUDE) era em réplicas da criação de Vernon Panton, de 1967, que o debate tomava forma. Além de Prudêncio, os arquitectos João Mendes Ribeiro e Manuel Mateus e os designers Filipe Alarcão e Pedro America. A moderação foi entregue a Pedro Cortesão Monteiro, ou não fosse a discussão tornar-se demasiado acesa.
Às 18h30, com a sala cheia, arquitectos e designers atiravam-se às cadeiras dos outros segundo a perspectiva das artes que defendem. “É que o ser humano foi feito para estar de pé ou deitado, estar sentado é muito complicado”, continuava Prudêncio.
Uma extensão do nosso corpo
E a pensar nos problemas que estar sentado implica, Filipe Alarcão lembrava que este é o objecto que mais fascina um projectista, possibilitando uma experimentação constante associada aos mais diversos materiais. “Sempre que aparece um novo material, surgem novos tipos de cadeiras”, defendia o designer. “A cadeira é como uma extensão do nosso corpo e temos de nos sentir confortáveis como se estivéssemos ao colo, se não, não funciona”, acrescentava.
Do lado da arquitectura, Manuel Mateus não costuma construir e destruir tantas vezes, mas defende que é na banalidade de um objecto quotidiano que reside o maior desafio. “Para além de resolver o problema de sentar, conseguir tirar qualquer outra coisa dela é que é estimulante”, referia. Além disso, para o arquitecto, no que toca a cadeiras, há sempre um espaço de liberdade de criação. “É como na Língua Portuguesa, só temos 27 letras, mas ainda podemos escrever poesia. Com as cadeiras passa-se o mesmo”, afirmava.
Design vs Arquitectura
Gonçalo Prudêncio, porém, não estava completamente de acordo. “Há tanta cadeira que, quando nos pedem uma nova, temos de inventar um pouco”, defendia. “Algumas nem são úteis, e depois vamos a um museu e vemos um dístico ‘Please, do not seat’”. O público ri-se. 1-0 para o design.
A arquitectura defendia-se, argumentando que não costumam dedicar-se a produções em série. “Repetir em arquitectura, não costuma correr bem”, afirmava Manuel Mateus. 1-1.
Arquitectos e designers podem nem sempre concordar, pois se para a arquitectura uma cadeira faz parte de uma obra de arte, para o design é a obra em si. “Por isso é que nós, arquitectos, também podemos desenhar a cadeira, mas menos bem”, referiu Manuel Mateus.
Necessidade de interacção
Já a tarde ia avançada e arquitectos e designers concordavam que, com ou sem cadeiras, a interacção entre as duas áreas é essencial. “Em Portugal, o que está mal é que as obras não são vistas como algo total”, afirmava o arquitecto. “Então porque é que não me contratas?!”, atirava Gonçalo Prudêncio. A assistência ria-se, mas a intervenção prometia mais seriedade. “Se um arquitecto quiser ter mais-valias na sua equipa, arranja sempre formas de as viabilizar sem pedir autorização ao cliente e depois dá o exemplo”, acrescentava. Mais pontos para o design.
Na assistência ouvia-se: “designers e arquitectos nunca se hão-de entender”. No entanto, no MUDE o ambiente foi de descontracção e a importância da cadeira enquanto objecto de design saltou à vista, quase contagiando a arquitectura. “Eu nunca pensei desenhar uma cadeira, mas agora, depois disto, até nem era má ideia”, conclui Manuel Mateus.