“Work It”: Há justiça no mundo?

“Work It” era uma série tão má, mas tão má, que fazia “Two Broke Girls” parecer boa televisão. Foi cancelada ao fim de dois episódios. Será que há justiça no mundo?

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Nunca vou perceber no que é que os executivos da ABC estavam a pensar quando deram luz verde a “Work It”. Parecendo que não, não é fácil uma série ir para o ar. Levar um programa ao grande público é um processo moroso, e todos os anos pessoas brilhantes filmam episódios piloto que não chegam a ser exibidos porque nenhum canal quis pegar na série, mas por qualquer razão “Work It” foi parar às televisões americanas. Porquê? Nunca vamos saber.

Mas o que era “Work It”, afinal? Era uma “sitcom” clássica sobre dois amigos que perderam o emprego por causa da crise. Perdão, por causa das mulheres. O problema, explicam-nos mal a série começa, não é a recessão, mas sim a “homemcessão” (“mancession”, dizem eles), o facto de as mulheres terem começado a trabalhar e estarem a tirar empregos aos homens, malvadas.

Vai daí que um dos neandertais que protagoniza este desastre decide vestir-se de mulher para arranjar emprego — porque toda a gente sabe que as grandes empresas adoram contratar travestis. Adoram. E safa-se. O amigo dele faz o mesmo e também consegue trabalho, apesar de não ter qualquer experiência na área.

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“Work It” era uma “sitcom” sobre dois amigos que perderam o emprego por causa da chamada “homemcessão” DR

E como pelos vistos a premissa não era básica e ofensiva o suficiente, os argumentistas tinham um acordo tácito para fazerem apenas piadas sexistas e xenófobas que até o comediante mais medíocre acharia demasiado óbvias. O primeiro episódio até nem foi uma desgraça em termos de audiências, mas foi das coisas mais mal recebidas pela crítica americana em anos. Ninguém disse bem daquilo.

É claro que a ABC não quis saber das críticas dos jornalistas nem dos boicotes das associações LGBT ou do público porto-riquenho (no primeiro episódio um dos protagonistas diz que tem jeito para vender drogas porque é porto-riquenho; seguem-se 15 segundos de gargalhadas engarrafadas) e emitiu o segundo episódio. As audiências desceram tanto que passados uns dias o canal viu-se obrigado a cancelar a série. Por um momento, pareceu que existia justiça no mundo.

Agora que ninguém vai sofrer mais com aquilo, podemos admitir que “Work It” trouxe duas coisas boas ao mundo. A primeira foram os resumos incríveis de Jake Fogelnest no blogue dedicado à cultura pop “The Vulture”. A segunda, e a mais importante, foi mostrar como é essencial haver uma crítica pop empenhada, capaz de pensar sobre entretenimento. Sem ela talvez a série ainda continuasse no ar. E talvez, se em Portugal existisse algo parecido, tivéssemos menos lixo na televisão. Assim, temos “Os Compadres”.

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