De dia trabalha na Fnac, à noite dá largas à paixão pela astrofotografia
Miguel Claro tem três imagens entre as 100 melhores do ano seleccionadas pela revista norte-americana “Astronomy”
A pé e de noite, Miguel Claro teve de contornar a lagoa de Albufeira, no concelho de Sesimbra, até encontrar o ângulo certo para fotografar as constelações Orionte e Cão Maior. Lembra-se bem que estava frio, à volta cinco graus. O esforço valeu a pena e a imagem que obteve na noite de 12 de Março do ano passado é uma das 100 melhores do ano segundo a revista norte-americana “Astronomy”, na edição de Novembro de 2011.
Miguel Claro tem 34 anos, ganha a vida como editor de fotografia e som do “site” da livraria Fnac, mas é nos tempos livres, e durante a noite, que dá largas à sua paixão pela astrofotografia. Pode ver-se o que tem andado a fazer na sua página na Internet e na fotogaleria do PÚBLICO.
Especializou-se na fotografia de paisagens astronómicas, que une os elementos do céu e da Terra, valorizando o património arquitectónico, cultural e paisagístico. “Só isso não dá dinheiro, é como se fosse um ‘part-time’ nocturno”, diz ele, que vê publicadas muitas das fotografias que envia para revistas da especialidade de todo o mundo – e nessa altura pagam-lhas.
Traço azul no espelho da lagoa de Albufeira
Numa dessas noites captou um traço azul grosso a sobressair no espelho de água da lagoa de Albufeira (vê foto à esquerda). O que é esse traço, que tornou essa imagem uma das 100 melhores?
É o reflexo da estrela Sírio, a mais brilhante no céu nocturno e uma das mais próximas da Terra, a 8,6 anos-luz de distância. Mas este risco azul tem muita ciência escondida, ou não se soubesse que a cor de uma estrela depende da temperatura da sua superfície. “Quanto mais quentes, mais as estrelas fogem para o azul”, explica o astrofotógrafo e astrónomo amador português.
Portanto, o risco azul na lagoa revela-nos que Sírio é uma estrela quente (à volta de dez mil graus Celsius à superfície). “Na imagem da parte de cima do céu, parece uma estrela branca. Mas a água, com a longa exposição, torna a imagem mais esborratada e intensifica a saturação da cor. É como se intensificasse a temperatura real da estrela. Conseguimos perceber que é muito quente”, explica Miguel Claro, que também já teve esta imagem escolhida pela agência espacial NASA como Earth Science Picture of the Day, em 2010.
Entre as 100 melhores imagens de 2011, Miguel Claro tem outras duas fotografias (é o único português na lista). Uma mostra a chuva de estrelas da noite de 13 de Agosto do ano passado num pinhal de Fonte da Telha, na Costa da Caparica; a outra tirou-a numa praia da Costa da Caparica, a 12 de Agosto, também em 2010, e tem igualmente uma história.
Já estava na praia quando apareceram, por volta das nove da noite, duas pessoas no pontão. “Não as conhecia. Estavam a passear naquele momento.” Inicialmente, a ideia dele era fotografar o alinhamento dos planetas Vénus, Marte e Saturno, mas os planos mudaram com a chegada dos desconhecidos: “Quando me apercebi de que havia duas pessoas, fiquei a aguardar o momento para poder registar esta fotografia.”
À primeira vista, a luz ao longe, no final do pontão, parece um farol. Mas se olharmos com atenção, é a Lua, em Quarto Crescente, que surge entre os dois amigos.